Poderia ter feito estas observações no post anterior – Raimundo Matias Dantas Neto: da UFPE ao IML. Também queremos Justiça!, mas optei por dedicá-lo exclusivamente ao relato indignado de Bruna Machado Simões, com o qual me solidarizo e para o qual aguardamos tod@s respostas.
A questão é que o que mais me chocou em todo o relato não foi o fato de (mais) um jovem negro ter sido assassinado. Também não foi o de seu corpo ter isso encontrado no Instituto Médico Legal, com documento (exatamente a respeitável carteira de reservista!) e sem que a família tivesse sido notificada. Ou de negarem a ela o direito a ver o corpo, já que a violência não deve ser exposta e comprovada. Afinal, vítimas da tortura entregues em caixões lacrados só não se tornou prática comum na ditadura militar porque a maioria dos corpos jamais apareceu!
Raimundo era estudante da Universidade Federal de Pernambuco, mas isso igualmente não me causa espanto… Afinal, um negro, à noite, supostamente com dinheiro (ou com um laptop já comprado), só pode ser ladrão! Esses dois fatos anteriores levam a crer, igualmente, que ele não estivesse mal vestido… E daí? Se os assassinos eram ladrões profissionais, estar bem vestido seria um atrativo a mais. Por outro lado, se ele foi executado por policiais profissionais, nesse caso os dreds irreverentes podem ter sido encarados como um convite à violência. Ninguém pode achar que eles tenham sido parcialmente arrancados por mero acaso! Nesse “castigo” há um claro sinal de preconceito. E o pior é que nada impede que ele tenha sido infringido por outros negros! Outros negros de “alma branca”, como já foram classificadas (e se orgulharam disso!) personalidades famosas deste País.
O fato de ele ter saído de casa por volta das 19 horas de quarta-feira, dia 2, e seu corpo só ter sido encontrado (ou deveríamos escrever “desovado”?) na praia na madrugada de quinta para sexta-feira, depois de o desaparecimento ter virado notícia em programa da televisão e nas redes sociais, também não deixa de ser curioso… Afinal, o que terá acontecido com Raimundo ou com seu corpo durante essas mais de 24 horas? Já a exasperação da perita ante o que classificou de “agonia” para verem o corpo está “dentro dos conformes”, a meu ver. Como explicar, afinal, a discrepância entre o laudo de um inocente afogamento e os visíveis sinais de espancamento e de assassinato visíveis no corpo? Ah, que saudade do tempo dos caixões lacrados…
Mas o que de fato me causou mais revolta foi um detalhe que Bruna escreveu quase de passagem: “Estão tratando o caso como mais um preto e pobre assassinado. Lá, eles chamam ‘ZÉMICIDIO’; apenas mais um na estatística”.
A gente sabe sobre as estatísticas. Na verdade, tudo que escrevi acima não foi nada mais que tergiversar sobre os componentes desse tema. Imagino que Zémicídio seja o equivalente ao “john doe” dos seriados policiais estadunidenses, mas para mim a expressão era nova. E aí na minha cabeça bateram, ao mesmo tempo, o longínquo “Escuta, Zé Ninguém”, de Reich, e o “Los Nadies”, de Galeano, que acabamos de postar em nova versão, exatamente na sexta-feira, quando o corpo de Raimundo foi localizado por sua família.
Raimundo Matias Dantas Neto não era um “Zé Ninguém” (aliás, ninguém o é!). Ele não era um “Nada”. Era um jovem universitário, sonhando com um laptop e com a pelada do dia seguinte. Mas ele era negro, usava dreds e morava no Brasil!
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Um explicação: este post não está classificado como Blog Especial por ter sido escrito por mim ou algo parecido. Esta classificação é por nós usada quando queremos chamar a atenção para alguma informação. E, neste caso específico, essa classificação expressa acima de tudo a minha vontade de literalmente gritar a minha indignação e a minha revolta. TP.
Me parece una barbaridad que a esta altura de la humnanidad todavia se asesine gente por su RAZA, COLOR y/o RELIGION. Tiene que haber Justicia para este ser HUMANO QUE HA SIDO ASESINADO!!!