ES – Ônibus é incendiado após polícia matar jovem negro de 19 anos na Serra

José Gonçalves de Souza, pai de Hearles, mostra a bicicleta do rapaz destruída pela PM. Foto: Nestor Müller
José Gonçalves de Souza, pai de Hearles, mostra a bicicleta do rapaz destruída pela PM. Foto: Nestor Müller

A polícia alega que o rapaz estava armado, mas familiares e vizinhos dizem que ele foi executado pelos PMs: “Ele se assustou quando viu a viatura e os militares atiraram. Ele caiu da bicicleta, e ainda no chão, os PMs atiraram. Só pararam porque o pessoal que estava no culto da igreja saiu e viu a cena”

Por Glacieri Carraretto, nA Gazeta

Um ônibus Transcol foi incendiado por populares após a morte do jovem Hearles Nunes Araújo, 19 anos, na noite de segunda-feira (30), em Jardim Carapina, na Serra. Segundo os moradores e familiares, o rapaz foi assassinado por policiais militares em frente a uma igreja evangélica. Porém, a PM alega que apenas revidou os disparos feitos pela vítima.

Para a Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), os policiais militares informaram que viram Hearles de bicicleta, junto de um outro rapaz, na Rua Lima Dutra, por volta das 21h50. Os militares teriam solicitado para que os amigos parassem, ordem que não foi obedecida pelos dois jovens. A PM afirmou que Hearlei e o amigo sacaram armas e atiraram contra os policiais, que revidaram os tiros.

Mas a versão contada pelos moradores e parentes é bem diferentes. Segundo eles, Hearles foi executado pelos militares. “Ele se assustou quando viu a viatura e os militares atiraram. Ele caiu da bicicleta, e ainda no chão, os PMs atiraram. Só pararam porque o pessoal que estava no culto da igreja saiu e viu a cena”, disse um primo de Hearles, que não quer ser identificado.

Hearles acabou sendo atingido por nove tiros. Os próprios militares socorreram o baleado para um hospital particular próximo ao bairro, mas o garoto não resistiu e morreu. Os militares entregaram uma pistola calibre 45, municiada, que estaria em poder do jovem.

Lucinéia, mãe de Hearles. Foto: Nestor Muller
Lucinéia, mãe de Hearles. Foto: Nestor Muller

A morte de Hearles provocou a revolta de moradores. “Foi safadeza da PM. Se fosse um tiroteio, todos os muros da rua estavam com marcas de tiros. O menino não fazia nada com ninguém”, disse um morador.

A mãe do rapaz, Lucinéia Nunes, 43,  estava desesperada. “Antes do meu filho sair de casa, falei para ir com Deus; depois ouvi tiros e soube que a polícia o matou”, contou a mulher.

Em protesto, ônibus é incendiado

Em protesto pela morte de Hearles, um grupo de moradores ateou fogo em um ônibus Transcol da linha 826 (Jardim Carapina–Terminal de Carapina), na rua Tiradentes. Cobrador e motorista foram expulsos, o coletivo depredado e depois incendiado.

  As chamas que consumiram o ônibus provocaram estragos em mais três casas da rua, entre elas a da moradia da aposentada Ormi da Hora Couta, 61 anos. Dona Ormi e um neto de 16 anos dormiam na sala da casa, pois o quartos estão mofados devido às chuvas. O fogo começou bem em frente à casa da aposentada, que teve que sair às pressas do lar.

“Acordei com o barulho das pessoas gritando e quebrando o ônibus. Depois o fogo começou e atingiu a minha casa. Eu e meu neto saímos desesperados e pulamos o muro com a ajuda de vizinhos”, contou Dona Ormi, que tem dificuldades para andar.

Com as mãos sujas de fuligem e ainda contabilizando o prejuízo provocado pelo fogo, ela lamentou a situação. “Disse para o meu neto: ‘vamos nos salvar, o resto vai ficar para trás, a nossa vida’. Agora, tenho que dar um jeito de reconstruir o que foi estragado pelo fogo. Só não foi pior porque meu filho e os vizinhos ajudam a apagar”, lamentou a aposentada, que passou a noite em claro.

Família nega que Hearles estivesse armado
Família nega que Hearles estivesse armado

Vítima tem passagem pela polícia  

As dúvidas sobre as circunstâncias da morte do jovem Hearles são grandes. “Eu fui lá quando ouvi os tiros. Pegaram meu primo e o jogaram igual um animal morto dentro da gaiola (camburão). Quem dá nove tiros não quer prender, quer matar”, disse um primo da vítima.

Hearles já esteve preso pelos crime de posse de drogas e porte ilegal de arma de fogo. O padrasto dele, José Gonçalves de Souza, disse que o enteado nada fez para merecer os tiros.

“Os policiais até passaram em cima da bicicleta dele, que ficou toda torta. Ele nasceu aqui no bairro, por isso as pessoas ficaram revoltadas”, contou.

Para moradores da região, a situação da violência no bairro é preocupante. “Quando vim da Bahia pra cá, há um ano, não sabia que era assim. Vou me mudar, estou assustado”, observou um pedreiro.

“De noite quem manda são “os caras” (traficantes). Polícia não entra aqui, eles andam com metralhadora na mão. A PM só vem de dia”, descreve um morador que preferiu não dar o nome.

Polícia contesta versão e diz que houve confronto

O coronel Nylton Rodrigues, comandante do 6º Batalhão da Polícia Militar – que atende à Serra – informou que os três militares que participaram o confronto faziam patrulhamento de rotina.

“Eles não atenderam à voz de parar e atiraram contra os policiais. A viatura foi atingida e os três militares revidaram os tiros”, pontuou. Como é padrão, foi realizado um relatório sobre o fato que, juntamente com as armas dos PMs, será encaminhado para a Corregedoria da Polícia Militar.

O coronel disse que vai avaliar a transferência de setor de atuação dos policiais envolvidos, pro precaução. Rodrigues afirma que a área é complicada. “Jardim Carapina é uma área onde quatro quadrilhas de traficantes atuam, por isso é prioridade no patrulhamento”, disse.

O comandante rebate as acusações contra os PMs. “As situações são revertidas contra a polícia. Os traficantes são ousados, estão facilmente armado, com fuzis e pistolas. Mas a Polícia Militar vai continuar abordando suspeitos, pois está no bairro para isso. O objetivo é identificar os traficantes e proteger os cidadãos de bem”, enfatiza o coronel. Devido o incêndio ao ônibus e o tiroteio, o policiamento será intensificado em Jardim Carapina.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Mirt’s Sants.

Comments (1)

  1. MAIS UMA VEZ NUM CASO COMO ESTE DE VIOLENCIA POLICIAL, OS FATOS NÃO SÃO APURADOS DENTRO DO RIGOR DA LEI E NOSSOS ‘REPRESENTANTES” MNU, MINISTÉRIO DA IGUALDADE RACIAL E OUTRAS TANTAS SECRETÁRIAS CRIADAS PARA TAL NUNCA SE MANIFESTAM, SÓ QUEREM SABER DE MIDIA E DEBATE, AI FICA DIFICIL, ESTA SITUAÇÃO VAI PERDURAR ETERNAMENTE!!

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