“A Furnas existe desde que o Dionísio chegou aqui”

Espaço recentemente reconhecido como herança de Furnas (Foto: CPT/MS)

Membros do Tribunal Popular da Terra levam um dia de partilha e militância na comunidade quilombola Furnas do Dionísio, onde se realizará um encontro de formação social e política de lideranças e juventude quilombolas de MS em fevereiro.

Por CPT/MS

Um córrego e várias cachoeiras cortam a gruta; atravessam a comunidade. Morros em formação circular desenham um buraco gigante. Janeiro empresta sua cor nesta época do ano e a paisagem fica coberta de verde. Quando chegar o outono a colina vai virar castanho ou alaranjado, o que deixará descobertas as rochas cinza, a mesma cor dos atalhos de pedregulhos que comunicam as casas dos moradores.

A paisagem, embora, não poderia ficar perfeita sem uma cor que é mais perene e que diz respeito a liberdade e dignidade. A cor dos descendentes de escravos negros da Comunidade Furnas do Dionísio flameja como herança de luta e resistência por território e direito em Mato Grosso do Sul, como outras 20 comunidades quilombolas existentes no Estado.

Com pau-a-pique, sapê, muita argila e até esterco de vaca, em 1890, seu Dionísio Antônio Vieira e família, vindo de Minas Gerais, levantam as primeiras casas. “Ele  chegou de Minas, gostou do lugar, voltou para buscar sua família e retorna para ficar. Então, Furnas existe desde que o Dionísio chegou aqui”, narra Maria Aparecida Martins, a Cida, presidenta da Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Furnas do Dionísio.

Maria Aparecida Martins, liderança de Furnas

São 94 famílias no meio de uma beleza natural exuberante, que perante conquistas recentes de reconhecimento de territórios, e ainda aguardando a titulação de suas terras,  desejam avançar em organização, formação e capacitação, para ter autonomia e poder comunitário de gestão sobre os direitos e heranças garantidos.  “Hoje temos outras necessidades, a luta maior por muito tempo foi pela sobrevivência. Nestes tempos precisamos aprender sobre organização” disse dona Cida.

“Reparações e cotas raciais” 

Luciene Prado, vice-presidente da Associação é uma das poucas jovens que voltou à sua comunidade depois de estudar e se formar na universidade. O objetivo dela é contribuir para o melhoramento das condições de vida de sua gente. Preocupada com a juventude quilombola, sobre tudo pela crise de identidade existente, fala de propostas e reivindicações concretas. Apontou que, de um modo geral, a luta dos quilombolas no Estado é pela titulação imediata de todas as terras quilombolas, sem burocracia. E também que o governo garanta condições para o desenvolvimento sustentável das comunidades quilombolas, indígenas e camponesas, além de emprego com salários dignos para a juventude negra. Indicou que é necessário acabar com a intolerância religiosa e garantir a liberdade de expressão cultural e da cultura afro-brasileira. “Queremos saúde e educação 100% estatal e pública e a aplicação da lei 10.639 e os 10% do PIB para educação”, salientou.

Encontro do TPT em Furnas do Dionísio

O Tribunal Popular da Terra, junto ao movimento das Comunidades Negras Rurais Quilombolas de MS-CONERQ e a Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Furnas do Dionísio realizarão na comunidade, em 23 e 24 de fevereiro, um encontro quilombola, com participação de lideranças indígenas e camponesas, do movimento universitário, entidades e movimentos sociais. Representantes da Coordenadora Ecumênica de Serviço (CESE) também estarão presentes no encontro. A atividade faz parte de uma das propostas do Tribunal Popular da Terra, como coletivo democrático-popular de entidades, organizações e movimentos de luta por terra e território em Mato Grosso do Sul. Mais um momento de encontro entre os Povos da Terra para trocar idéias e experiências no processo de construção de unidade e o avanço para um calendário de lutas unificadas a meio e longo prazo, tendo como eixo a temática terra e territorialidade. A atividade conta inicialmente com o apoio da NMZ (Centro da Missão luterana da Alemanha) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT). Outras parcerias para arcar com os custos do encontro serão procuradas, indicaram os organizadores.

http://cptms.blogspot.com.br/2013/01/a-furnas-existe-desde-que-o-dionisio.html

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