Daniele Silveira, Brasil de Fato
Enquanto as pautas relacionadas às ações afirmativas caminham a passos lentos, a violência contra jovens negros continua em alta e com respostas tímidas do Estado. A reivindicação pela desmilitarização da polícia ganhou força nas ações do movimento negro este ano e está entre as principais exigências das organizações que atuam na periferia.
As vítimas de homicídios no Brasil apresentam um perfil em comum. Segundo dados do Ministério da Saúde, 53% são jovens. Desses, mais de 75% são negros. A situação é confirmada pelo Mapa da Violência 2012. O estudo indica que entre 2001 e 2010 o número de vítimas brancas, de 15 a 24 anos, caiu 27,5%, enquanto o índice de negros assassinados aumentou 23,4%. Anualmente morrem 139% mais negros do que brancos na faixa dos 15 a 24 anos.
Débora Maria, coordenadora do movimento Mães de Maio, que organiza familiares de jovens mortos por policiais, denuncia a falta de políticas públicas para a juventude negra e pobre. Em vez de direitos sociais, ela aponta o fortalecimento da violência por parte do Estado.
“A gente vê que entra ano e saí ano e existe uma camufl agem, mas uma política verdadeiramente de enfrentamento [à violência], a perspectiva de vida para juventude está difícil. A política que o nosso governo oferece para a juventude é encarceramento em massa e extermínio por parte das instituições dos policiais. Então, o que a gente vê é um número crescente por parte do extermínio e sem uma punição severa aos algozes dos nossos filhos.”
Estimativas indicam que apenas 3% dos casos em que há morte em confronto com a polícia são investigados no país.
“Autos de resistência”
O fim dos “autos de resistência” é apresentado como reivindicação paralela à desmilitarização. Os movimentos pressionam o Congresso Nacional pela aprovação do Projeto de Lei (PL) 4471/ 12, que acaba com esse tipo de ocorrência e torna obrigatória a investigação dos casos em que há suposto confronto com policiais.
O programa Juventude Viva, lançado pelo governo federal em setembro de 2012, para fazer o enfrentamento da violência contra a juventude negra no país ainda não deu respostas aos movimentos.
Débora, que teve seu filho morto na Baixada Santista por policiais durante os chamados Crimes de Maio de 2006, tem receio de que o projeto seja usado apenas como uma política “oportunista”. Para o enfrentamento, de fato, do genocídio da população negra na periferia, ela destaca a necessidade da implementação de medidas que dêem condições de vida a essa população.
“Nós somos sequestrados na parte da educação e o caminho para um Brasil sem violência começa pela Educação. Os nossos governantes nos aterrorizam não dando educação para os nossos filhos. Não há educação de qualidade para as pessoas poderem discutir e terem conhecimento dos seus direitos; só os deveres. E uma moradia digna, sem a qual vários são jogados para dentro das periferias.
É o caminho de todos nós com falta de uma moradia digna e uma saúde de qualidade. E não deixar para trás a segurança, que, para nós, é insegurança com a qual ele [o Estado] nos oferece.” Nos chamados Crimes de Maio de 2006, forças de segurança executaram mais de 500 pessoas no intervalo de oito dias (12 a 20 de maio). As ações, amplamente questionadas, ocorreram após atentados a viaturas, bancos, delegacias e órgãos públicos promovidos pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).
A maioria dos casos foi registrada como resistência seguida de morte, mas inúmeros relatos denunciam ações de grupos de extermínio formados por policiais. Relatórios produzidos por organizações de defesa dos Direitos Humanos apontam sinais de execução, como tiros na cabeça e vítimas baleadas pelas costas.
Para 2014, Débora adianta que a luta contra o racismo e em defesa da população negra continua. “Queremos avançar, não queremos ser blindadas, não queremos ser perseguidas. Não admitimos mais esse extermínio velado no nosso país produzido por quem deveria nos dar proteção. Acreditamos que em 2014 os nossos políticos não passarão. A gente quer a Reforma Política porque esses que estão aí não oferecem uma perspectiva de vida nem para os nossos filhos, nem para toda a sociedade.”