Lutas do povo Terena por moradia em Campo Grande revelam a omissão dos governos em todas as esferas

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Priscila Anzoategui e Rogério Batalha Rocha – Coletivo Terra Vermelha (CTV)

Campo Grande, MS – Um grupo de 64 famílias indígenas, da etnia Terena, vem ocupando desde o dia 27 de junho deste ano um terreno localizado entre as ruas Marin com a Lúcia Helena Coelho, no bairro Santa Mônica, na periferia de Campo Grande, MS.

Os indígenas reivindicam a criação da “5ª Aldeia Urbana” de Campo Grande que faz parte de um projeto defendido e prometido há tempos por políticos de MS, principalmente pela Prefeitura Municipal de Campo Grande.

Segundo documentos expedidos pelo Departamento de Cadastro Imobiliário e de Cartografia da Prefeitura de Campo Grande, o terreno onde se localizam as famílias indígenas é de propriedade do Município, destinada à “equipamento comunitário” e registrada no Cartório do 1. Ofício de Campo Grande sob a Matrícula de n. 160.185.

Documentos apresentados pelos Terenas a nossa equipe de reportagem comprovam que há 07 anos a comunidade do bairro Indubrasil e região solicita ao Governo Estadual e Prefeitura Municipal de Campo Grande a criação dessa nova aldeia a partir de “promessas” que já haviam sido feitas ao Conselho Municipal dos Direitos e Defesa dos Povos Indígenas de Campo Grande/MS – CMDDI.

Foi enviado no dia 15 de abril de 2008, pela Sra. Oide Felipe, indígena Terena que presidia a Organização Indígena do Núcleo Industrial e Sander Barbosa Pereira então Presidente Interino do CMDDI, uma solicitação formal ao então Prefeito Nelson Trad Filho para a criação da Aldeia Urbana e que seja também construída “uma escola de 1. série do ensino fundamental à 3. série do ensino médio e área de lazer”.

Em 17 de abril de 2008, o mesmo pedido também foi encaminhado ao Governador de Mato Grosso do Sul, André Puccinelli.

Além disso, em 28 de março de 2012 foi feita indicação à mesa diretora da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, pelo Deputado Estadual George Takimoto, para a construção da referida Aldeia por parte do Governo do Estado de MS. Além disso, o Deputado Federal Antonio Carlos Biffi também solicitou à Prefeitura, em 15 de maio de 2008, a criação da “Aldeia Urbana”. Até a presente data nem município e nem estado atenderam os pedidos da comunidade.

Em entrevista ao site de notícias midiamax, em abril de 2012, os líderes indígenas Arildo Soares e Antônio Jorge Pereira informaram que o Governo Municipal de Campo Grande declarou que havia um projeto para construção dessa aldeia.

Contudo, nunca conseguiram saber ao certo em que secretaria isso está. “Falamos com o Paulo Mattos, da Emha (Agência Municipal de Habitação) e ele nos disse que lá não tinha projeto nenhum e que como esse ano é de eleição, não iríamos conseguir mesmo”, explicou Arildo (Disponível aqui).

Naquele tempo, as lideranças indígenas conseguiram marcar uma reunião com o Secretário Estadual de Habitação e Cidades, Carlos Marun, e que foi realizada no dia 16 de abril de 2012, onde ficou garantido por parte do Governo Estadual, que o projeto de criação da “5ª Aldeia Urbana” seria consolidado.

Porém, passados dois anos da reunião e “das promessas” dos Governos, nada foi feito.

Diante desse descaso, cansados de esperar, é que partiu a decisão da comunidade Terena em ocupar por conta própria a área localizada no bairro Santa Mônica como forma, inclusive, para pressionar a Prefeitura a solucionar a questão.

Estamos aqui reivindicando o nosso direito de moradia, garantido pela Constituição Federal. Não temos renda suficiente para pagar aluguel e a decisão de nos manifestar dessa forma foi uma decisão coletiva. Estamos cansados de esperar a boa vontade dos governantes”, declara Val Eloy, uma das lideranças indígenas da ocupação.

Aldeias “urbanas”

Os Terenas que estão acampados no Santa Mônica reproduzem um fenômeno social bastante conhecido em Mato Grosso do Sul. Trata-se de pessoas que vieram de aldeias localizadas nos municípios que ficam perto de Campo Grande, como Taunay, Buriti e Cachoeirinha, que se deslocam de suas comunidades até a capital em busca de melhores condições de vida, por conta de sua realidade de descaso e omissão dos governos em não resolveram, de uma vez por todas, a demarcação de seus territórios tradicionais.

Trata-se de uma história que se repete há anos em várias localidades. Os povos indígenas de Mato Grosso do Sul, não mais aguentando viverem “confinados” em suas aldeias, em pequenos espaços de terra, aguardando a “boa vontade” do Governo Federal para a conclusão das demarcações, deslocam-se até a capital na procura de melhores condições de vida.

Ao chegarem em Campo Grande, buscam emprego e acabam vivenciando outras dificuldades. São trabalhadores indígenas, em sua maioria do povo Terena, que ganham muito pouco, não tem seus direitos trabalhistas e constitucionais assegurados e são discriminados.

Mesmo diante disso ainda pagam suas contas de água, luz, aluguel e IPTU, muito mais altas do que em cidades do interior, sempre fora de suas condições materiais suficientes para cobrir essas despesas.

Neste aspecto, a busca dos Terena é por uma melhor qualidade de vida das famílias, mas que pelas circunstâncias econômicas desta região a situação acaba ficando muito mais difícil sem o apoio dos Governos.

Mesmo que a realidade atual venha a exigir uma resposta imediata do Governo Federal para as demarcações dos territórios indígenas no campo, os deslocamentos de Terenas para a capital devem ser considerados como um movimento legítimo dessas comunidades e que seus direitos e reivindicações fundamentais sejam respeitados e atendidos pelos governos.

Tratam-se de medidas concretas e urgentes a serem cumpridas pelos governos municipal e estadual visando mitigar os problemas fundamentais dos povos indígenas no Mato Grosso do Sul que sofrem há muito tempo com esses descasos.

Vendaval do dia 18 de julho

Devido ao vendaval que ocorreu na madrugada do dia 18 de julho, vários indígenas acampados no bairro Santa Mônica ficaram desabrigados, o vento derrubou diversos barracos no meio de chuva intensa.

A equipe de reportagem do Coletivo Terra Vermelha foi até o local no dia seguinte, as lideranças indígenas nos informaram que há na ocupação muitos idosos e crianças que sofreram muito com o temporal e que temem uma nova tempestade. Relataram que a madrugada foi difícil, pois muita gente teve que dormir ao relento.

Também nos disseram que se encontram numa situação precária, não tendo sequer um banheiro para ser usado pela comunidade, tendo que pedir a solidariedade dos vizinhos para poderem tomar banho.

A primeira-dama esteve aqui, trouxe vários cobertores, mas o que estamos precisando mesmo é de moradia”, afirma Val Eloy.

Tendo em vista que vários barracos foram derrubados com as chuvas e ventos, os indígenas estão precisando urgentemente de alguns materiais como rolos de lona, madeirite, escoras de eucalipto e arames. Para construírem o banheiro precisam de mangueira, fiação elétrica, lâmpadas e torneiras.

Quem quiser ajudar financeiramente a comunidade para comprar os materiais citados nesse texto, e necessários a essa atual situação emergencial e humanitária, podem contactar o Coletivo Terra Vermelha (CTV) através da nossa página no facebook, ou encaminhar email para [email protected]. Repassaremos essas informações aos Terenas da Ocupação Santa Mônica para efetivar as formas diretas de colaboração das pessoas de bem que querem ajudar.

 Fonte: Comunidade Terena Santa Mônica e CTV.

 

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