CE – Entidades denunciam “higienização social”

Thatiany Nascimento – O Estado

Cerca de 30 moradores de rua foram recolhidos, compulsoriamente, na Beira Mar e em logradouros públicos, no Centro de Fortaleza, desde o dia 14 deste mês, e levados para locais desconhecidos.

A denúncia, feita pela representação local do Movimento Nacional da População de Rua do Ceará, segue sendo apurada pelo Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC) da Defensoria Pública do Ceará. Segundo as acusações, na ação irregular de higienização social, que ocorre durante a madrugada, os supostos responsáveis utilizam fardas do Exército. A instituição, integrante das Forças Armadas, diz desconhecer o fato e nega qualquer participação nos atos.

As ações, conforme o coordenador do Movimento da População de Rua, Marcelo Conde, ocorreram na Av. Tristão Gonçalves, nas proximidades da Estação de Metrô; onde 20 moradores foram recolhidos; na Praça da Sé; com cinco recolhimentos; e na Beira Mar, onde houve quatro ocorrências. Na Praça José de Alencar, segundo Marcelo, também foram registradas irregularidades, porém, os demais moradores, que alegaram ter fugido durante o procedimento, não conseguiram mensurar quantas pessoas foram levadas.

AÇÃO NA MADRUGADA

De acordo com Marcelo, os moradores são atraídos por pessoas vestidas com roupas de estampas camufladas, que remetem ao Exército, trazidas por kombis e caminhões. Os supostos recolhedores informam que irão garantir a expedição de documentos de identificação desta população, e logo, recolhem compulsoriamente as vítimas.

O destino dos moradores, que são transportados nestes veículos, é desconhecido. “Temos depoimentos de pessoas que conseguiram escapar das ações em diferentes locais e horários. E apesar destas pessoas não se conhecerem, elas descrevem, basicamente, o mesmo procedimento. Estranhamos muito que isso ocorra justamente no período da Copa”, completou.

INVESTIGAÇÃO

O Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas da Defensoria Pública do Ceará foi acionado, oficialmente, sobre os episódios, no dia 18 de junho, conforme o defensor público Régis Pinheiro. Segundo ele, até agora a Defensoria não conseguiu identificar pessoas que, supostamente, tenham sido vítimas dessas ações irregulares, nem quem são os autores de tal procedimento. Porém, o defensor ressaltou que o Núcleo, detectou uma significativa diminuição da população de rua, em dois locais denunciados pelo Movimento.

Na Av. Tristão Gonçalves, onde segundo o defensor, aproximadamente, 130 moradores de rua costumavam pernoitar, hoje, há somente cerca de 20. Na Beira Mar, de acordo com Régis, também foi verificada esta diminuição. Conforme o defensor, o Núcleo investiga ainda o deslocamento forçado desta população para duas cidades da Região Metropolitana, Guaiúba e Pacatuba. Entretanto, as vistorias realizadas pelo Núcleo, nesses municípios, ainda não comprovaram a suspeita. As investigações deverão ter continuidade, segundo o defensor.

“ÓRGÃOS NÃO NOTIFICADOS”

De acordo com o defensor, a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) e o Ministério Público Militar foram oficiados, no dia 18 deste mês, sobre as denúncias. Porém, nenhuma resposta foi encaminhada pelos órgãos até o momento. Em contato com o jornal O Estado, a Assessoria de Comunicação da SSPDS garantiu que a Pasta não foi comunicada oficialmente sobre os procedimentos irregulares, que não tem relação com as ocorrências e por isso não se pronunciará sobre o caso. O jornal também tentou contato com o MPM, mas até o fechamento desta edição não obteve êxito.

O chefe da seção de Comunicação Social da 10ª Região Militar de Fortaleza, coronel Montefusco, garantiu que o Exército desconhece qualquer ação desta natureza e disse ainda que não foi notificado sobre as ações irregulares que, supostamente, envolvem agentes da instituição. O coronel pediu ainda que a equipe do Jornal oficializasse o contato e as informações apuradas na reportagem, através de um email, para que o Exército possa tomar nota sobre o assunto e assim encaminhar as devidas providências.

REPÚDIO ÀS AÇÕES

Conforme a Assessoria de Comunicação da Secretaria Municipal de Trabalho e Desenvolvimento Social e Combate à Fome (Setra), o titular da Pasta, Cláudio Ricardo, informou ter tido conhecimento das ocorrências, mas garantiu que não foi acionado pela Defensoria. De acordo com a Assessoria, ele ressaltou que a Pasta é completamente contra tal prática, tida como uma “medida de higienização social” e garantiu que a Assistência Social do Município continua atuando, normalmente, com o serviço especializado de abordagem de rua, sem intensificação, por conta da Copa das Confederações.

Serviço

• Denúncias relacionadas à violação de direitos da população de rua podem ser feitas, ao Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas da Defensoria Pública do Estado, através do telefone: 3278-7390.

Compartilhada por Janete Melo.

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