Militante negro denuncia agressão da Brigada Militar em Porto Alegre

Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte

Um militante do movimento negro teria sido agredido por policiais militares em um show da programação do aniversário de Porto Alegre. Na virada do dia 28 para 29 de março, Juarez da Silva, ativista da Campanha Nacional contra o Extermínio de Jovens Negros foi atingido por uma pancada na cabeça e desmaiou no Largo Zumbi dos Palmares. A violação foi registrada nesta segunda-feira (2), na Ouvidoria Estadual de Segurança e, segundo o denunciante, os motivos podem ter motivação política e ideológica.

“Sobre o fato eu não tenho muito o que declarar. Eu tenho consciência de estar dentro do suprimento da Brigada Militar, ter gás no olho e eles pedindo para eu assinar um documento. Não lembro de mais nada. Eu estava no show e só lembro disso. Cinco minutos depois que eu assinei o documento eles me liberaram sem cópia de documento nem nada”, relatou Juarez em conversa com o Sul21.

Segundo ele, por volta da meia-noite de quinta-feira (29), o policial Oscar Luiz Fiorese lhe aplicou um gás que lhe deixou com forte sensação de queimação nos olhos e grande dificuldade de respiração. A identificação do policial ocorreu na sede da Ouvidoria, onde lhe foram mostradas imagens dos policiais que estavam presentes quando assinou a ocorrência. “Eu tenho trajetória de 20 anos no movimento social e na política. Há tempos eu denuncio casos de extermínio de jovens negros nas periferias de Porto Alegre. E o Estado sempre nega que isso aconteça aqui”, cogitou Juarez sobre uma possível razão para a agressão dos policiais.

Visivelmente abalado e com o olho esquerdo ainda muito roxo, o militante falou que não irá desistir de entender as razões da violência usada contra ele e não irá deixar de denunciar as práticas de abuso policial que afirma estarem ocorrendo nos bairros Mário Quintana, Chácara Fumaça e Rubem Berta. “Tem denúncias sobre milícia que estão vindo à tona agora na imprensa. Tudo que eu sempre denunciei e dizem que não tem no RS e que ao denunciar transformam a nossa vida num inferno”, desabafou.

No dia seguinte à agressão, Juarez da Silva foi acompanhado por uma amiga militante do Ocupa Porto Alegre ao Hospital de Pronto Socorro e ao Serviço de Assessoria Jurídica (SAJU) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Representantes do SAJU orientaram os procedimentos para denunciar o caso de abuso policial e o acompanharam em um exame de corpo de delito na Polícia Civil e na abertura de um processo no Ministério Público Estadual.

“Não temos registro do caso até o momento”, diz tenente da BM

Segundo o tenente-coronel do Comando de Policiamento da Capital (CPC), Paulo Stocker, não chegou ao conhecimento do Comando qualquer denúncia de abuso de policiais a militante de movimento social. Ao ser informado do caso de Juarez , o responsável pelo CPC deu uma gargalhada dizendo que seria “impossível uma agressão ser feita pela polícia sem motivação”. “Se isto foi registrado na Ouvidoria de Segurança seguirá para a Corregedoria. Quando chegar ao nosso conhecimento, vamos investigar para apurar se realmente houve abuso”, disse após ser informado sobre o caso pelo Sul21.

Na última sexta-feira (30), Juarez da Silva se juntou a outros dois denunciantes de abuso policial no auditório da UFRGS para debate sobre Práticas de (IN) Segurança Pública: Violência Policial, da IV Semana de Direitos Humanos do SAJU. “Eu avalio isto como um ato de repressão exagerada reflexo de um processo político atual que envolve denúncias e revelações sobre a história do Brasil. Nós, enquanto movimento, estamos atentos e cobrando os direitos que nos são negados. As autoridades agem de forma arbitrária sobre os negros que estão organizados para pautar as conquistas e direitos”, avaliou.

Caso se confirme a agressão por um policial, não será um caso isolado no Rio Grande do Sul. O Sul21 já havia retratado outro caso de racismo em Porto Alegre, envolvendo estudantes africanos. “A história do período ditatorial está se repetindo, só que de forma velada. Acontecer este tipo de coisa é no mínimo antidemocrático”, diz Juarez da Silva.

No Brasil, injustiças com a população negra ocorrem diariamente. Segundo dados do Observatório de Favelas, 150 jovens negros são mortos por dia no país. “Daqui a pouco eu posso passar de denunciante a vítima. Eu tenho medo. Denuncio agora porque tenho confiança nas relações da minha militância. Mas, eu já fui ameaçado de morte. Não uso celular desde 2008. Só que jamais vou me calar. Se a gente se cala, as coisas não mudam”, diz Juarez da Silva.

http://sul21.com.br/jornal/2012/04/militante-negro-e-agredido-por-brigada-militar-em-porto-alegre/

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