Encontro dos Desencontros ou Desencontro dos Encontros? XV Encontro Nacional da RENAP: uma breve divagação

Eduardo Fernandes

Modernizar o passado
É uma evolução musical
Cadê as notas que estavam aqui
Não preciso delas!
Basta deixar tudo soando bem aos ouvidos
O medo dá origem ao mal
O homem coletivo sente a necessidade de lutar
o orgulho, a arrogância, a glória
Enche a imaginação de domínio
São demônios, os que destroem o poder bravio da humanidade
Viva Zapata!
Viva Sandino!
Viva Zumbi!
Antônio Conselheiro!
Todos os panteras negras
Lampião, sua imagem e semelhança
Eu tenho certeza, eles também cantaram um dia…
(Monólogo Ao Pé Do Ouvido ( Chico Science e Nação Zumbi) )

A RENAP – Rede Nacional de Advogados/as Populares – realizou na última semana, 04 dias de encontro – sobretudo – de desencontros que proporcionaram outros encontros, e ao final das atividades, ficou constatado que será através dos outros (em sintonia com nós mesmos) as possibilidades de realização e concretização do destino revolucionário, transformador, emancipatório das classes subalternas, que se colocam enquanto protagonistas de diversas vias e veias abertas dentro da América Latina.

A construção de uma análise particularizada do XV Encontro sob qualquer ângulo é extremamente difícil de empreender. Obviamente, o exercício sobre as possibilidades abertas por atividades dessa natureza no campo das lutas sociais demonstra a necessidade de trabalhar e melhorar a cada novo instante, com maior critério, crítica, sagacidade, metodologia, discernimento e alegria, fomentando novas chances de encontros/desencontros.

Para atingir um patamar de constante superação é preciso em primeiro lugar possuir humildade pedagógica para superar a arrogância da crítica absoluta a tudo e todos, pois não há crítica nesse formato e sim pré-compreensão estagnada ou incoerência absoluta com os processos de ressignificação das lutas, o que leva as posturas autoritárias a produzir um mero distanciamento afetivo e efetivo, mergulhado em distorções, silêncios, conclaves e a emergência das situações meramente localizadas sem a observância do todo, que conduz quando muito a uma conferência de advogados/as – modelo dos encontros da OAB que não coadunamos – enquanto forma de demarcar espaço/território que não é constitutivo de algo convidativo, horizontal e multidimensional, quando muito revela um caráter individual e competitivo.

Esse ponto de vista, não pretende distencionar ou evitar o debate/conflito,  esses são elementos centrais dos processos de crescimento coletivo, que revelam a vigilância sobre nossas próprias limitações e ao mesmo tempo estabelecem novas alteridades, enquanto pendular ou circular; tais momentos possibilitam que novas tradições dentro da tradição sejam constituídas e deste ponto para outras formas de críticas e disputas.

O diálogo empreendido nessa reflexão passa pela oportunidade do encontro que conjugou (re)conhecer e renovar a RENAP. O conhecimento imaterial e material, enquanto símbolo gênero da espécie reconhecimento(s), que permitem a alteridade, identidade, dialogicidade, clivagem, companheirismo e desejo da vida humana em sua potência máxima de incompletude são dados que convivem nas distâncias e nos (des)encontros, norteando as relações sociais, políticas e construções jurídicas, estas baseadas no uso estratégico e tático – efetivamente técnico e suado – das forças e bases conceituais da hegemonia que proporcionam um novo paradigma de disputa entre o status quo.

Essa mesma agonia de vencer com as armas do opressor, sabendo que nada está completamente findo, que essas vitórias compartilhadas são apenas pequenas marcas dos movimentos sociais em relação com o judiciário nas suas próprias transformações, contradições, refluxos e especificamente na necessidade da extrema e eterna desconfiança vigilante.

Após o (re)conhecimento é necessário considerar que todas as mesas, grupos de estudos, cervejas, oficinas e os buxixos são importantes para alimento das nossas percepções e até o enraizamento das nossas convicções políticas, acadêmicas e jurídicas. Porém, é perceptível que existem novas dinâmicas que podem ser exploradas enquanto catalizadoras das diversas redes, fóruns, linhas de pesquisa, extensão, ações políticas e jurídicas no campo local – nacional – internacional. Ficou evidente que além dos re-alinhamentos interpessoais e das costuras entre parceiros/as institucionais temos uma dívida com A RENAP (esse “A” artigo e gênero feminino, não decidido/obrigado a ser masculino, e por suas próprias contingências, incongruências, insurgências e  pertinências começa a estabelecer seu local vocativo e não mais passivo de ser).

A maturidade de alguns temas como Desapropriação, Criminalização dos Movimentos Sociais, Direitos Humanos no campo nacional e internacional, não devem ser esquecidos, cada vez mais exigem um compromisso militante e técnico que apenas a experiência e o tempo podem apresentar. Ao mesmo tempo que formamos aos/as novos/as que chegam, também devemos estar abertos para o novo (re)conhecimento, não podemos deixar de compartilhar ideais, no campo de Gênero, Orientação Sexual, Cultura, Arte, Mobilizações Estudantis, Manifestações virtuais/reais e Participação Social no Judiciário, pois várias ações nacionais e internacionais estão sendo assessoradas e/ou constituídas por advogados/as populares, estudantes, militantes que precisam com urgência de um maior fluxo de diálogo, sob o risco de que não possamos mais dar continuidade as aproximação, assim como, divulgação das novas/velhas bandeiras de lutas.

Sabemos que a potencialidade caleidoscópica da RENAP é sem dúvida inesgotável, visto que, e apesar de que, é a maior rede mundial de advogados/as populares, de organizações não-governamentais com atuação histórica no campo das lutas populares e dos direitos humanos; essa tal de RENATA(?) que contempla outras formas de atuação: escritórios de advocacia, universidades, comitês, redes, fóruns, comissões, movimentos, partidos, políticos, pessoas na estrutura do Estado e afins, assim como, com a presença de estudantes.

Enfim, tantos pontos de partida, inclusões, precipitações, histórias, acúmulos e/ou iniciações poderiam ter gerado para quem não quis se implicar realmente no evento em um grande Encontro dos Desencontros ou o Desencontro dos Encontros, e tal percepção ser difundida enquanto algo pejorativo, contudo, até essa incompatibilidade de expressões foi o elo que concretizou a validade e vitalidade das relações que não procura encerrar em si mesma ou apenas partir/chegar de/em um único local, este local, que ao final do XV Encontro ( o melhor que já participei) já não será mais local, pois, a partir das despedidas, todas as direções pulsantes dos encontros/desencontros são irradiadoras de novos instantes, o que era previsto torna-se profundamente dialético na própria radicalidade da expressão.

Até Salvador em 2012.

 

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