Por Filipe Thadeu Coutinho Lazário e Johanna Nublat, na Folha
Enquanto o governo Dilma Rousseff é criticado por índios por problemas em demarcações de terra, a Justiça atravessou a Funai (Fundação Nacional do Índio) e cravou uma área indígena em um bairro nobre de Brasília.
O local, agora reconhecido como área tradicional indígena, pode valer mais de R$ 146 milhões. Fica a 15 km do gabinete de Dilma, no Noroeste –bairro novo, supostamente “ecológico” e alvo de especulação imobiliária.
Publicada em novembro, a decisão constrange a Funai, acusada pelo Ministério Público Federal de ter sido negligente. Segundo a sentença, pareceres que a fundação alega serem contrários à demarcação das terras eram, na verdade, a favor dos índios.
“A Funai já se posicionou pela inexistência da tradicionalidade [na área], entendendo que dizia respeito a problemas de moradia. Os documentos comprovam o contrário, evidenciando a natureza da tradicionalidade da ocupação”, escreveu o juiz federal Paulo Cruz.
NOVELA
A decisão atropela a Funai porque o pedido da procuradoria era apenas para que a fundação montasse um grupo de trabalho para examinar o tema. O juiz foi além e já estabeleceu a área indígena, obrigando a Funai a apenas demarcar os limites da área.
Após mais de cinco anos de polêmica, os índios da comunidade fulni-ô tapuya tiveram reconhecida uma área de quatro hectares –ou quatro campos de futebol. O uso dessa área já estava suspenso graças a uma decisão provisória da Justiça que impedia a licitação da terra.
A região corresponde a duas quadras comerciais do Noroeste, uma entrequadra e uma avenida. O local pode valer mais de R$ 146 milhões, se comparado aos preços exigidos pelo governo em licitações de quadras similares.
O local é ocupado pelos índios fulni-ô tapuya desde o fim da década de 1950, quando migraram de Pernambuco para a capital em construção. O jogador Garrincha (1933-1983) é o mais famoso representante dos fulni-ô.
A população indígena no local varia, mas ao menos cinco famílias ocupam a região –uma mata, margeada por prédios em construção. O boom imobiliário veio só em 2008, quando o DF começou a licitar lotes no Noroeste. O governo faturou quase R$ 2 bilhões com os terrenos.
O Ministério Público, a Funai e a Terracap, órgão do DF responsável pelas licitações, não comentaram a decisão.
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.