O presidente da Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro, Wadih Damous, afirmou ontem (31) que os crimes de tortura praticados pelos militares ligados ao regime que bancou a ditadura são “uma espinha atravessada na garganta da democracia brasileira”. Lembrou, no entanto, que aqueles militares perseguidos durante a ditadura e tratados como desertores e traidores vão ter na Comissão uma caixa de ressonância dentro do programa ‘Testemunhos da Verdade’.
“É um paradoxo: falamos em ditadura militar, mas a categoria profissional mais atingida pelo golpe foi justamente a militar. Muitos foram perseguidos e tratados como desertores e traidores. Vamos contar a história desses brasileiros”, garantiu o presidente da Comissão da Verdade que esta semana deu início aos depoimentos de pessoas que foram barbaramente torturadas.
Damous lembrou que o Brasil teve, lamentavelmente, militares que não honraram a farda, como o brigadeiro João Paulo Burnier, que queria explodir o gasômetro do Rio e poderia ter causado uma catástrofe de dimensões apocalíticas na cidade. Há o exemplo do capitão Wilson Machado, que tentou explodir a bomba que talvez matasse milhares de pessoas em um show de 1º de Maio no Riocentro em 1981. Mas, temos também exemplos de heróis como o brigadeiro Moreira Lima ou o capitão Sérgio Macaco, que descumpriu a ordem de seu comandante para não cometer uma chacina”.
“A Comissão Estadual do Rio de Janeiro não atuará por revanchismo: ninguém está propondo que se torturem os torturadores. Estamos bradando por justiça. A eles o Estado democrático de direito! A eles o direito de se sentar no banco dos réus”, disse.
Ele qualificou de ‘inaceitável’ que no Rio de Janeiro, de vez em quando, esbarremos com um torturador da ditadura. “Vivem nos restaurantes e nas ruas como se nada tivesse acontecido, com a tranquilidade de quem não tem peso na consciência”.
A Comissão Estadual da Verdade vai aprofundar a investigação para obter o máximo de informações sobre o plano montado para um atentado ao gasômetro, a explosão de bomba no Riocentro, a montagem da ‘Casa da Morte’ em Petrópolis para o extermínio de presos políticos, envio de carta-bomba à sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que matou a secretária da entidade Lyda Monteiro da Silva. Sobre a Casa da Morte, Damous garantiu que haverá investigações no local de onde Inês Etienne Romeu foi a única a sair viva. “Queremos saber quem passou por lá, quem lá foi supliciado e quem foram os supliciadores. Vamos descobrir e dizer à sociedade nomes, cadeias de comando e tudo o mais que se fizer necessário para restabelecer a verdade”.
As investigações abrangerão também parlamentares e empresários que financiavam a repressão, além do Poder Judiciário, afirmou Damous. “Temos de investigar o papel vergonhoso do Poder Judiciário durante a ditadura militar. Ao jogar luz sobre o processo de falência da Panair, empresa com robustez patrimonial e que teve a falência decretada de forma arbitrária, nós jogaremos luz sobre alguns aspectos que não honram o Poder Judiciário brasileiro”.
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Enviada por José Carlos para Combate Racismo Ambiental.