Inspirada em Machado e Brecht, “A lata de lixo da História”, de Roberto Schwarz enxerga país sempre atormentado pela força do conservadorismo
Por Alexandre Pilati, editor de Horizonte Cerrado, em Outra Palavras
No meio da cena mais reveladora do país em A lata de lixo da história (Cia das Letras, 2014), peça de Roberto Schwarz recém publicada em segunda edição, lemos uma fala que, como tantas outras da obra, faz pensar. Diz um dos personagens envolvido no pretenso “levante popular”: “Nós vamos derrubar a Casa Verde, não tem dúvida. Mas acho que não vai ser suficiente. O que estou sentindo é uma azia complexa, geral, exigente – uma azia da alma”. O personagem refere-se à possível ofensiva contra o hospício do personagem machadiano Simão Bacamarte e, ao mesmo tempo, demonstra uma espécie muito grave de perspectiva negativista com relação ao que pode fazer o povo contra a opressão. É uma fala que expõe agressivamente um sentimento geral do Brasil à época da ditadura e que tem a ver com o tino conservador da nação, cujos movimentos transformadores, mesmo os mais retumbantes, conservam sempre algo de irresoluto. Um irresoluto que mora no estômago do país e que, na melhor das hipóteses, se converte numa “azia da alma” brasileira. Àquele tempo, essa azia era uma premonição de que o atraso venceria e que a história avançaria não apesar dele, mas por causa dele. (mais…)