Silêncio de maior parte da imprensa maranhense sobre Seminário Internacional que discute impactos da mineração na Amazônia e no Maranhão revela posição de subserviência e falta do cumprimento do papel social dos meios de comunicação

seminario carajás 30 anos

Por Claudio Castro, jornalista

Lançado na última terça-feira, dia 8 de outubro, em Belém e em São Luís, o Seminário Internacional Carajás 30 Anos: resistências e mobilizações frente a projetos de desenvolvimento na Amazônia Oriental, contou, na capital maranhense, com a presença de professores, estudantes, pesquisadores, representantes de movimentos sociais e de comunidades atingidas pela atividade da mineração e demais projetos de desenvolvimento na região e setores da imprensa maranhense.

Em São Luís, o lançamento foi feito no Campus da Universidade Federal do Maranhão. No Pará, na sede do Conselho Episcopal, em Belém, órgão ligado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). A CNBB Nacional é uma das parceiras do seminário e, lá no Pará, este tem entre os apoiadores a Sociedade Paraense de Diretos Humanos, comunidades atingidas pela empresa Vale, quilombolas, indígenas, movimentos sociais, pesquisadores da UFPA, entre outras entidades.

O seminário Internacional conta com a coordenação, apoio e parceira de grupos de pesquisa da Universidade Federal do Maranhão, Movimento dos Sem Terra (MST), Cáritas Brasileira, Jornal Vias de Fato, programas de pós-graduação das Universidades Federal e Estadual do Maranhão (UFMA e UEMA) e da Universidade Federal do Pará, ONG Justiça Global, Movimento das Serras e Águas de Minas (MG), Fórum Carajás, Justiça nos Trilhos, e segue aberto a entidades que se identifiquem com os objetivos do evento e queiram dele tomar parte, segundo falaram seus organizadores durante a apresentação feita na manhã desta terça-feira, 8 de outubro, no auditório do Centro de Ciências Sociais da UFMA, quando do lançamento do Seminário em São Luís.

O SEMINÁRIO

Durante a apresentação, Marluze Pastor, uma das coordenadoras do Seminário, falou sobre algumas das razões que levaram a tantas entidades, organizações, comunidades e movimentos sociais a pensarem num evento que reflita sobre os projetos de desenvolvimento originados a partir da implantação, há quase trinta anos, do Programa Grande Carajás (PGC). Entre esses elementos, o fato de a extração de minério na região Amazônica, nesse tempo, ter quadruplicado desde sua capacidade inicialmente prevista. Isso, conforme ficou claro durante as falas, traz impactos que precisam ser dimensionados, pensados, e que influenciam tanto no equilíbrio ambiental de uma das regiões de maior biodiversidade do planeta quanto nas comunidades impactadas por esse tipo de atividade e as demais a ela agregadas. Ela ressalta que uma das discussões que vêm sendo feitas em São Luís – acerca da criação de uma reserva extrativista que contribua para a preservação ambiental e proteja comunidades tradicionais na Ilha do Maranhão – não é uma discussão nova, mas que se dá no âmbito do Programa Grande Carajás: essa estratégia de defesa começa a ser pensada em relação ao PGC: “Essa discussão não é de hoje. Ela começa com a denúncia dos impactos sociais do Programa Grande Carajás”, afirmou.

“Coalizão de Saberes” – Horácio Antunes, professor da UFMA e coordenador do Seminário, falou sobre a “perspectiva não exclusivamente acadêmica” do evento. Ele classificou o Seminário como uma “profunda coalizão de conhecimentos”, e que este se pauta numa profunda “relação não somente de respeito, mas de consideração de outros conhecimentos, tão válidos quanto os produzidos na Academia”. Segundo ele, o Seminário visa a produzir uma relação “proveitosa e fraterna desses conhecimentos”, e chamou atenção para o fato de que desde a formulação da proposta do Seminário estão presentes a Academia, os movimentos sociais e as comunidades e grupos sociais atingidos pelos projetos de desenvolvimento na região.

Foi ressaltada ainda a importância que tomou o Seminário Internacional, o que é representado pelo lançamento simultâneo em São Luís e em Belém, atentando-se para a “pluralidade do processo de organização”, com várias entidades na organização, na promoção, no apoio e parceria com o evento: grupos de estudos da UFMA em São Luís e em Imperatriz, a presença da UEMA e programas de pós-graduação das duas universidades maranhenses, CNBB, Justiça Global, entre outros. Foi anunciado ainda que essa lista de realizadores está aberta a adesões, e que os participantes reúnem-se em encontros mensais da sede do MST em São Luís. “A gente conta sempre com novas adesões e participantes. Já estão confirmadas as presenças de representantes de atingidos pela atividade da mineração, por parte da mesma empresa que atua na Amazônia Oriental, em pelo menos oito países, das Américas do Norte e do Sul, e também da África”, anunciou Antunes.

Seminários Preparatórios: o primeiro acontece este mês em Imperatriz – Os organizadores divulgaram que “O Seminário Internacional ‘Carajás 30 anos: resistências e mobilizações frente a projetos de desenvolvimento na Amazônia oriental’ é um processo amplo, que contará com seminários preparatórios em Imperatriz, de 16 a 18 de outubro de 2013; Marabá (8 e 9 de março de 2014), Santa Inês (21 e 22 de março de 2014) e Belém (5 a 8 de abril de 2014). As etapas preparatórias culminarão com a realização do Seminário Final em São Luís, a ser realizado na Universidade Federal do Maranhão de 06 a 09 de maio de 2014”.

Para Imperatriz, está prevista a ida de caravanas de São Luís e Belém, além da participação de várias cidades da região.

Ao Seminário Final, em São Luís no ano que vem, devem comparecer acadêmicos, comunitários e movimentos sociais. Estão previstos dezessete grupos de trabalho, vinte mesas redondas, e a realização de reuniões plenárias, com encaminhamentos que garantam novos estudos e processos de mobilização. Estão previstas ainda atividades como feiras e exposições de experiências dos grupos sociais envolvidos, vídeos, exposições fotográficas e de artes plásticas e atividades artístico-culturais. Para o padre Dario (Justiça nos Trilhos), essa composição plural garante que o “seminário pertence a todos nós”.

A IMPRENSA – OU A FALTA DELA

Apesar de toda essa mobilização de atores dos mais variados em torno de um evento cuja importância pode ser, como já dito, representada pelo fato de ter seu lançamento feito, de modo simultâneo, em duas capitais, a “grande imprensa” do Maranhão não compareceu, apesar de convidada e aguardada durante o lançamento. Antes, o seminário foi alvo de entrevistas na Rádio Universidade FM, na Rádio Educadora e TV Cidade/Record. Além de blogues e do Jornal Vias de Fato, que apoia e participa da iniciativa, o lançamento em São Luís contou com a cobertura da TV Assembleia. A própria Assessoria da Universidade Federal (que tem vários eventos apoiados pela Vale, empresa cujas atividades serão objeto de reflexão do Seminário) não esteve no lançamento. Ficaram de fora ainda Mirante/Globo (pertencente ao grupo Sarney), Difusora/SBT (grupo Lobão), entre outras mídias atreladas a correligionários ou mantidas por publicidade oficial e/ou de grandes empresas que atuam na região.

A ausência foi sentida por Ricarte Almeida Santos (Cáritas, entidade que agora compõe a coordenação do evento): “Lamentável que um seminário internacional, pensado para debater um dos mais importantes projetos de desenvolvimento do país, não seja suficiente para mobilizar a imprensa do Maranhão, ainda que apenas para ouvir, ou para fazer o contraponto. Como essa ausência grita!”, exclamou.

A ausência da imprensa pode ser encarada como uma primeira tentativa de inviabilização de um evento que questione uma das bases em que está assentada a ideia de desenvolvimento do Maranhão, um discurso com o qual poucos lucram (entre estes a própria imprensa e seus donos), e uma prática que afeta a muitos. E mais: ela joga sérios questionamentos sobre o papel social que os órgãos de comunicação têm a obrigação de exercer – o de levar informação à sociedade. Além disso, joga por terra a ideia, cada vez menos comungada, felizmente, de neutralidade do discurso midiático, mostrando que esta tem sim, lado (o que já pode ser deduzido também apenas em ver quem são os barões da mídia, no Maranhão e pelo Brasil a fora), além de não ser difícil de vislumbrar, nessa ausência, receio de cumprir com seu papel, e uma auto e prévia censura por parte dos meios de comunicação, num acanhamento em levar aquilo que deveria levar, que é a informação, num temor de dar visibilidade a quem seus senhores não querem que sejam vistos. Esse tipo de atitude covarde joga sérios questionamentos sobre o papel desses meios de comunicação, sobre a atuação deles, e sobre sua legitimidade, além de revelar a fraude com a qual esses veículos operam: prometem entregar um produto, que é a notícia, ao tempo em que a sonegam, de acordo com os interesses que defendem ou com os quais estão comprometidos.

MOMENTO HISTÓRICO

Jonas, coordenador do MST, entidade partícipe do Seminário, lembrou que o lançamento “coincide com muitas coisas acontecendo no país”: ocupação quilombola em São Luís, sem-teto em Imperatriz, além de as grandes mobilizações, na véspera, puxadas por professores, no Rio de Janeiro, em São Paulo, e em outras cidades. “O lançamento em outubro tem um caráter simbólico muito grande de resistência e de luta”, disse, destacando ainda que não se surpreende com o papel da grande imprensa. “Mesmo assim, registramos nossa cobrança e nossa indignação”, pontuou.

Para ele, o Seminário tem a importância de mostrar qual o projeto e qual a proposta desses outros atores, a quem os poderosos tentam sempre inviabilizar, para a Amazônia Oriental.

Está, então, lançado o grande desafio para as populações atingidas, para os pesquisadores, movimentos sociais e demais entidades que aceitarem refletir sobre o assunto de maneira crítica.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Horácio Antunes.

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