Por Eustáquio José, em Um Brasil de Verdade
Os índios tenharim de Humaitá (região amazônica) ficaram famosos no final do ano passado quando foram acusados pelo desaparecimento de três “brancos” dentro de suas reservas. Na época ninguém falava, por exemplo do assassinato de um de seus caciques ocorrido semanas antes e já se pensava em crucificar e condenar todos os índios como hostis e cobradores do que chamam “pedágios” para que se passe por suas terras. A mídia, em especial a Rede Globo de Televisão, tratou de condenar os índios como mercenários e cobradores abusivos de pedágios que punham em risco a vida de todos em redor, numa tentativa clara de jogar a população contra os índios e fazer o lobby da grande indústria do agronegócio (grileiros de terra, proprietários de grandes fazendas de soja e pecuária) e de sua bancada ferina no Congresso Nacional – a mais organizada e que domina quase todas as comissões parlamentares, inclusive a responsável pela demarcação de terras indígenas, quilombolas que obstruem o interesse pela grande plantação que querem tornar o Brasil.
Mas essa não é a história toda. O que ainda está subjazendo a isso tudo é algo mais perturbador e bem mais nocivo. Em reportagem do portal Publica alguns aspectos passam a ser descortinados e desvelados. Na verdade os chamados “pedágios” não são pedágios e sim a compensação cobrada pelos índios, e decidida em assembléia por eles, pela morte de milhares de tenharim ao longo da construção da famigerada Rodovia Transamazônica em pleno regime militar (inaugurada por E. G. Médici em 1972). Quatro mil e duzentos e vinte e três quilômetros terra indígena adentro – e sem consentimento dos índios – a rodovia acarretou não só o extermínio de mais de nove mil índios como também a tomada de várias índias para os trabalhadores “brancos” da rodovia que tinham que matar os índios para terem as índias e depois que o desejo era satisfeito, eles as devolviam para as tribos.
Essa prática durou anos e não é contada pela reportagem da TV Globo e suas companheiras de mídia dominante no Brasil. Aí os três brancos que teriam desaparecido dentro da reserva indígena são a única arma para justificar uma onda de hostilidade que, na verdade, vem de bem antes da chegada desses mesmos três homens ao mundo. A perseguição começou com os europeus desembarcando aqui em terras da América e impondo as suas armas contra os atônitos índios. Foi assim que nações inteiras se dissiparam, como é o caso dos Tupinambás que ocupavam longas extensões na costa brasileira.
Além das constantes acusações não-verdadeiras e de não se dar o direito à defesa ao índio, há os que ainda os acusam de serem seres bárbaros e aculturados – mesmo que todos nós saibamos que não existe a nossa cultura e sim diversas culturas. São tantas as culturas quanto são as formas de vida nesse planeta. Cada tribo possui a sua cultura e os Tenharim não são diferentes. Acusar alguém de ser aculturado leva até a segunda acusação que é de se ser selvagem. Selvagem como diversos animais não humanos que são dizimados simplesmente porque ameaçam as grandes plantações, as grandes criações de gado e outros animais para abate, como é o caso, por exemplo, das onças pintadas e de lobos-guará. A situação é a seguinte: sem cultura e sem civilização (que são duas coisas distintas) é permitido o abate e é permitida a justificativa seja de que espécie for. Se três homens desaparecem, logo milhares de índios mortos e torturados são esquecidos, já que se considera que todos sejam bárbaros…
A história é sempre a mesma: o índio não tem cultura, não tem direitos, não tem história, não tem razão social, não tem como ter terra. Assim vão se jogando fora os índios e se tornando o seu ambiente fruto de espólios.
Assim fazem e estão dizimando os tenharim que se ninguém fizer nada desaparecerão rapidamente por conta de mentiras, injúrias e mau caratismo da mídia unida ao setor do agronegócio com o aval de grande parte da população que diz abertamente que “odeia índio” porque esses índios brecam o progresso, o avanço e o desenvolvimento.
Assim se fazem as linhas metras dessa história e se mostra a perversidade de tratamento dos índios nesse país e nesse continente. Morrem índios e índias e não se faz nada. Tudo em nome da mentira e do suposto progresso.