ONG pedirá isolamento de cemitério clandestino

Medida será tomada por receio de que seja violada a área localizada a 50 quilômetros de BH onde teria sido enterrado o militante político Nestor Vera, desaparecido no período da ditadura

Leonardo Augusto

O Fórum Mineiro de Direitos Humanos vai pedir ao governo federal que seja isolada a área apontada como local do cemitério clandestino onde teria sido enterrado o militante político Nestor Vera, dirigente do PCB, desaparecido em Belo Horizonte em 1º de abril de 1975. No livro Memórias de uma guerra suja, o ex-delegado do extinto Departamento de Ordem Política e Social (Dops) Cláudio Guerra relata crimes que cometeu no cargo. O pedido será enviado à Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, ao Ministério da Justiça e à Comissão da Verdade, que apura crimes ocorridos na ditadura.

A decisão de tentar resguardar o local em que estariam os restos mortais de Vera partiu do receio de que a área seja violada. Guiada por Guerra, a Polícia Federal esteve há cerca de um mês na região, que ficaria a 50 quilômetros de Belo Horizonte, em direção a Itabira, na Região Central do estado. No entanto, segundo o presidente do Fórum Mineiro de Direitos Humanos e ex-secretário nacional da pasta no governo federal, Nilmário Miranda, as investigações não foram conclusivas e os policiais teriam deixado a área sem qualquer proteção. “Não é algo que se faça em um dia. Em outros países averiguações dessa natureza levaram anos”, diz.

Conforme o ex-secretário nacional, a estratégia usada pela repressão em caso de ocultação de cadáveres de militantes políticos torturados previa até mesmo a utilização de duas equipes nas execuções e transporte dos corpos. “Quem matava nem sempre era quem enterrava. Justamente para que um número restrito de pessoas tivesse conhecimento dos locais onde os cadáveres eram deixados.”

Se confirmada, a morte de Vera será a primeira de um militante de esquerda em Minas durante a ditadura em que há fortes evidências de quem cometeu o crime. No livro, Guerra afirma que o então dirigente do PCB foi torturado pelos detetives conhecidos como Joãozinho Metropol e Saraiva, cujo nome completo era Haydn Prates Saraiva. O delegado conta ainda que foi o autor de dois tiros contra Vera, um na cabeça, outro no peito, quando o militante já estava “moribundo”.

O dirigente do PCB foi torturado, ainda conforme relato de Guerra, na delegacia da Polícia Civil na Rua Uberaba 175, Bairro Santo Agostinho. Conforme Nilmário, a revelação deixa claro que outras dependências da corporação em Belo Horizonte, e não somente a delegacia de Furtos e Roubos, como se pensava antes, foram usadas para tortura durante a ditadura.

Vera foi visto pela última vez no Centro de Belo Horizonte pelos companheiros de partido Paulo Elisiário e Sebastião Neres. Os três vinham de carro do Bairro Santa Mônica, Região Norte de Belo Horizonte, onde participaram de um encontro. O militante do PCB foi deixado pelos dois colegas na Avenida Olegário Maciel, já à noite, de onde se dirigiria para a rodoviária. Vera tomaria um ônibus para São Paulo às 22h, conforme relato de Neres.

A suspeita é de que o dirigente tenha sido sequestrado pelos agentes da repressão antes de iniciar a viagem. O casal Lúcia Helena Gomes e Alípio Gomes suspeita que Vera tenha sido levado depois de ter sido visto, dias antes, entregando uma sacola aos dois no parque municipal. “Tinha um mendigo perto que, acreditamos, estava nos vigiando”, diz Lúcia. Na sacola havia jornais do PCB que serviam como meio de comunicação entre os militantes e nomes de integrantes do partido. O casal teve a casa arrombada dias depois e suspeita que a invasão seria uma busca ao material. “Mas nós já havíamos queimado tudo”, diz Lúcia.

Vigiado

Além do pedido de isolamento da área em que estariam os restos mortais de Vera, o Fórum Mineiro de Direitos Humanos vai pedir ainda ao governo federal a inclusão do ex-delegado do Dops em um programa de proteção à testemunha. “Não importa o que ele fez. É preciso evitar que algo aconteça com alguém que pode fornecer informações importantes para as investigações sobre crimes cometidos na ditadura”, diz Nilmário. À época do lançamento do livro em que faz as revelações, Guerra teria sofrido um atentado.

http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2012/05/31/interna_politica,297440/ong-pedira-isolamento-de-cemiterio-clandestino.shtml

Enviada por José Carlos.

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