MA: Notícias do “fim do mundo”

Editorial do Jornal Vias de Fato

A imprensa noticia que, no Tribunal de Justiça do Maranhão, importantes assessores vendem sentenças, sem cerimônia, a qualquer um que queira e possa pagar o alto preço da tabela. Diante do problema, o desmoralizado governo de Roseana se apressa em dizer, sem convencer muita gente, que “não tem nenhum desembargador envolvido” neste propagado mercado…

Junto ao escândalo, prenderam alguns bois de piranha e o assunto circulou a todo vapor na opinião pública. Mas, na Assembleia Legislativa do Estado – o parlamento maranhense – ninguém teve muito tempo para parlar sobre o caso, afinal, os “nobres” deputados, estavam muito ocupados, em reuniões secretas, decidindo se iriam receber 13, 15, 18 ou 50 salários ao longo de um ano.

Assim tem sido o Maranhão. O estado brasileiro conhecido por muitos como “o fim do mundo”, que vive há quase meio século sob o comando e a influência do atual presidente do Senado brasileiro. Um lugar onde, até hoje, existe todo um ambiente para a encomenda de assassinatos de quilombolas, sem terra, assentados, índios, professores, jornalistas… Em alguns casos, as vítimas são executadas com armas de uso exclusivo da própria polícia.

No mês de abril de 2012, dois desses assassinatos, executados por pistoleiros profissionais, nos chamaram a atenção. O primeiro, no dia 14, em Buriticupu, quando mataram Raimundo Alves Borges, o Cabeça, um trabalhador rural. Já no dia 23, a vítima foi Décio Sá, conhecido jornalista de São Luís, funcionário do Sistema Mirante (ligado à Rede Globo).

E é exatamente neste oprimido e roubado Maranhão – violento e com os piores índices de Desenvolvimento Humano do país – que a Alumar, a maior produtora de Alumínio da América Latina, neste mesmo mês de abril, sentiu-se à vontade para fazer um grande jogo de cena, para justificar o pedido de mais e mais isenção fiscal. Enfim, combinado com as autoridades locais, querem continuar tirando vantagens desta sofrida população, onde muitos morrem de bala e outros tantos sucumbem à fome.

Trata-se do mesmíssimo Maranhão, onde as casas dos índios Awá Guajá são literalmente queimadas por madeireiros, com indícios de que uma criança teria sido queimada viva! E os madeireiros em questão, em alguns casos, ocupam cargos de prefeito, deputado ou secretário de Estado. E quando a imprensa alternativa trata dessa violência, como foi o caso da pessoa carbonizada, as autoridades, ligadas ao banditismo reinante, se apressam em querer desqualificar a denúncia e fazer o jogo dos madeireiros chapa branca.

Neste mês de abril, houve uma boa notícia, comemorada por todos que são solidários a causa dos índios. O Tribunal Regional Federal (TRF) confirmou a sentença do juiz federal José Carlos Madeira, em favor dos Awá-Guajá. De acordo com a decisão judicial, ficam demarcadas as terras indígenas nos municípios maranhenses de Carutapera, Bom Jardim e Zé Doca. Pela lei, a terra é dos índios.

O problema é que, nesta mesma região, existe o interesse da empresa Agropecuária Alto Turiaçu (Grupo Schahin): cerca de 90% da área que ela ocupa encontra-se nas terras dos Awá. Esta empresa, entre outras coisas, tem ligações antigas com o atual secretário estadual de agricultura, Claudio Azevedo Donizete, da Associação dos Criadores de Gado do Maranhão (por “coincidência”, é a mesma associação a qual é ligado um dos envolvidos no escândalo do TJ-MA).

Está determinado, pela Justiça Federal, que a UNIÃO e a FUNAI promovam o registro da área demarcada, num prazo de um ano, com a remoção das pessoas não-índias e desfeitas as construções edificadas. O que preocupa é, exatamente, o fato do Maranhão ser essa terra sem lei e, em torno do direito dos indígenas, existir este consórcio que envolve figuras da FUNAI, do Grupo Schahin, madeireiros, prefeitos da região e representantes do governo do Estado, enfim, vários tentáculos das organizações Sarney. E, com um time desses jogando junto, tem restado aos Awá a violência e a morte.

Nesta nossa edição, gostaríamos de falar de tudo isso separadamente e não apenas num editorial. Cada um desses assuntos precisa de muita visibilidade, debate e participação da opinião pública. Por isso, cada um deles merecia uma matéria especial, publicada em pelo menos duas páginas. Mas, hoje, no atual estágio em que nosso projeto se encontra, não temos ainda pernas para acompanhar toda a barbárie vivenciada pela sociedade maranhense. Este editorial, então, foi a parte que nos coube, o que nos foi possível neste momento encharcado de sangue e notícias ruins.

Gostaríamos muito, por exemplo, de ter acompanhado de perto e poder participar das manifestações de protesto, ocorridas em Buriticupu, durante o enterro de Raimundo Alves Borges, o Cabeça. O assassinato dele é extremante simbólico, pois está ligado a um dos problemas mais sérios do Maranhão: o velho e dramático conflito pela posse da terra.

Trata-se de um trabalhador rural, que morava num assentamento e esteve, há mais de 20 anos, na grande luta pela terra que deu origem ao município de Buriticupu, numa guerra onde morreram 54 pessoas. Duas décadas depois, ele é assassinado por que estava denunciando a grilagem de sempre e um esquema de compra e venda de lotes para reforma agrária. Foi mais uma vítima de pistoleiros. Os executores chegaram numa moto e deram vários tiros na cabeça dele.

Raimundo era um militante social, fundou um sindicato ligado a agricultura familiar, era das Comunidades Eclesiais de Base e do Fórum de Políticas Públicas de Buriticupu. Sobre o seu caixão, foi colocada uma bandeira do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Tinha 53 anos e deixou mais de 15 filhos. O crime se deu bem próximo da sua casa.

No caso do assassinato de Décio Sá, encaramos o assunto como mais um caso trágico, nesta lista de barbaridades que ocorrem no Maranhão. O que causa perplexidade na opinião pública, é que se trata de uma pessoa bastante conhecida, um profissional liberal, que, além de tudo, trabalhava exatamente para a poderosíssima estrutura de José Sarney. Em nossa opinião, o jornalista foi mais uma vítima deste ambiente de impunidade (e de imenso atraso!) que os ex-patrões dele, fazem questão de manter e aprofundar.

Então, caros leitores, neste momento em que o Maranhão vive agitado por tantas notícias ruins (umas mais divulgadas, outras quase omitidas) estamos publicando uma entrevista que consideramos histórica, com o engenheiro e ex-deputado federal Domingos Freitas Diniz. Ele é, sem sombra de dúvidas, uma das figuras mais importantes da política maranhense dos últimos cinquenta anos. Consideramos sua importância, não pelos cargos e funções de poder, mas, tendo como referência, o interesse público.

Os assuntos que nós tratamos com Freitas, nesta nossa 31ª edição, têm relação, direta ou indireta, com todos estes tristes acontecimentos citados por nós e ocorridos neste abril de 2012. É a questão da máfia, da estrutura oligárquica, do latifúndio, dos enclaves, da violência, da intolerância, enfim, do atraso profundo, deste pedaço de chão que alguns insistem em tratar como o lugar onde o diabo perdeu as botas…

Enviada por Edmilson Pinheiro.

http://www.viasdefato.jor.br/

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