Carta de Coimbra e vídeos do Colóquio “Território, Interculturalidade e Bem-Viver: as lutas dos povos indígenas no Brasil”

Lideranças indígenas e Professor Boaventura de Sousa Santos (ALICE/CES) se unem com o "feixe de vara" ao centro (Foto: @ Miguel Mesquita)
Lideranças indígenas e Professor Boaventura de Sousa Santos (ALICE/CES) se unem com o “feixe de vara” ao centro (Foto: @ Miguel Mesquita)

Nós, delegação de lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, de organizações regionais e de base do movimento indígena Brasileiro, dos povos guajajara, terena, tukano, macuxi, yanomami e taurepang, e pesquisadores de vários países vinculados ao Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra – Portugal, reunidos nesta cidade com o objetivo de intercambiarmos conhecimentos, saberes e experiências no contexto do Projeto Alice: Espelhos Estranhos, Lições Imprevistas e do “Colóquio Internacional Território, interculturalidade e bem viver: as lutas dos povos indígenas no Brasil”, após relatos sobre a situação dos direitos indígenas e de comunidades quilombolas, camponesas e das mulheres em países como Bolívia, Equador, Colômbia, Guatemala, México, Africa do Sul, Moçambique, Índia e o próprio Brasil, tomamos a decisão de tornarmos pública a nossa posição sobre essas realidades.

A lógica da dominação capitalista depois de séculos de colonialismo, sob a égide das empresas e corporações transnacionais e de governos subservientes, em nome do progresso e de um modelo de desenvolvimento por vezes considerado sustentável, mas que na prática é depredador, continua subjugando os povos, usurpando e violentando direitos coletivos e da mãe natureza.

É comum a todos os povos o voraz assalto e a irracional destruição cometida contra as terras, territórios indígenas e bens naturais por meio do galopante avanço das fronteiras agrícolas, do agronegócio, dos monocultivos (soja, eucalipto, cana de açúcar e palma africana); da implantação de grandes empreendimentos de infraestrutura como as usinas hidrelétricas e rodovias e as industrias extrativas da madeira e da mineração.

As lutas de resistência e defesa que os povos e movimentos indígenas, quilombolas e camponeses protagonizam em defesa dos territórios e os bens naturais e de seu direito de viverem conforme uma outra lógica marcada pela reciprocidade, solidariedade, complementariedade e harmonia entre seres humanos e a natureza, dentre outros princípios que fundamentam o bem viver, são criminalizadas pelos estados e as elites que acaparam o poder econômico e político. Dirigentes e comunidades são criminalizadas, vítimas de prisões arbitrárias e ilegais, assassinatos e perseguições e de campanhas midiáticas de descaracterização, racismo, preconceito e discriminação.

Para atingir os seus propósitos de desterritorializar os povos e movimentos, as elites nacionais e as corporações, articulados com governos e outros poderes dos Estados, trabalham na supressão e regressão dos direitos constitucionais e na adequação e flexibilização das legislações indigenistas e ambientais em função de seus interesses de lucro e acumulação.

Face a essa situação, entendemos que não podemos ficar indiferentes. Enquanto dirigentes sociais ou pesquisadores, precisamos reafirmar o compromisso de fortalecer a nossa unidade, de somarmos forças, de sermos solidários uns com os outros, em torno de ações concretas voltadas a transformar essa realidade e a construir um novo mundo, justo, equânime, respeitoso dos direitos dos povos e da mãe terra.

Nesse sentido nos propomos:

1. Aprofundar no conhecimento das realidades e lutas dos distintos povos e movimentos, considerando a sua diversidade, suas diferenças e especificidades.

2. Intensificar o intercâmbio e a articulação entre essas realidades e lutas, por meio da multiplicação de iniciativas e eventos como o Coloquio de Coimbra, a Universidade Popular de Movimentos Sociais (UPMS) e Encontros de Tradução Intercultural.

3. Impulsionar a criação da Universidade Intercultural Indígena, livre da interferência de governos e outros poderes, considerando as reais necessidades, aspirações e os direitos de autonomia e à identidade dos povos indígenas.

Coimbra nunca mais será a mesma.

Coimbra, 24 de junho de 2014.

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra – CES

***

Primeira Parte

Segunda Parte

Terceira Parte

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.