Nas últimas semanas diversos assassinatos ligados a conflitos fundiários ocorreram pelo país, principalmente na Amazônia e no Nordeste
por Felipe Milanez, Carta Capital
As últimas semanas tem sido marcadas pelo sistemático assassinato de lideranças rurais pelo Brasil e mortes em razão de conflitos fundiários. Houve também tentativas de assassinatos que por pouco não se concretizaram. Lavradores, quilombolas, indígenas: todos os condenados da terra, esquecidos pelas políticas públicas de demarcações e reforma agrária, estão pagando com suas vidas a política do atual governo de não demarcar terras indígenas, não regularizar territórios quilombolas e não assentar famílias camponesas. Os efeitos perversos da política de omissão do governo no caso das demarcações de terras indígenas –coordenadas pelo Ministério da Justiça – foram demonstrados pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), em relatório sobre a violência contra povos indígenas em 2013, lançado dia 17 de julho. De acordo com nota do CIMI: “no lugar de demarcar as terras, assentar os pequenos agricultores e pagar as benfeitorias, a decisão do governo é a de não contrariar os aliados ruralistas”. O resultado tem sido sangrento.
As informações da violência no campo tem sido divulgadas na página da Comissão Pastoral da Terra. Abaixo, um breve resumo de um mês sangrento. As mortes ocorreram na Amazônia e no Nordeste.
Maranhão. Zé Enedina era uma liderança importante na luta pela terra em Araioses. Ele vivia no imóvel Santa Rosa, uma área com 1.100 hectares e palco de conflitos há duas décadas. A área, que pertence à União Federal e deveria ser destinada ao assentamento de 30 famílias que vivem no local, segue com titulação indefinida pelo Incra, Secretaria de Patrimônio da União e a antiga pretensa proprietária, a fazendeira Ester Furtado. Zé Enedina foi encontrado morto na noite da segunda-feira, 21 de julho. Seu corpo, em estado de decomposição, apresentava lesões de pancadas e facadas. De acordo o advogado da CPT, Diogo Cabral, esse é o quarto assassinato nesse ano no estado.
Rondônia. Em área impactada pelas usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, ocorreu um duplo assassinado e uma terceira pessoa ficou baleada. Agricultores e lideranças do Acampamento São Cristóvão, situado na Gleba Garça, nas proximidades de Porto Velho (RO), denunciaram na Comissão Nacional de Conflitos Agrários, as mortes suspeitas em poucas semanas, de dois membros do acampamento e um terceiro deles atingido por arma de fogo, que se encontra internado no Hospital João Paulo II, em Porto Velho. Segundo os posseiros, 150 famílias ocupam a área da Fazenda Alexandria, sendo diversas delas de desempregados das obras das usinas do Madeira, Santo Antonio e Jirau. A ocupação iniciou em janeiro de 2013.
Pará. Um liderança foi assassinada em São Felix do Xingu, um dos municípios mais violentos do Brasil, que já virou sinônimo de bangue bangue, disputa por terras e pistolagem. Félix Leite dos Santos, vice-presidente da associação dos ocupantes de uma área de terra pública, conhecida como Divino Pai Eterno, localizada no Município de São Félix do Xingu (PA), foi assassinado a tiros na sexta feira18, quando saía de sua roça e retornava para sua casa. Seu corpo só foi encontrado no sábado por familiares que passaram a procurá-lo devido ele não ter retornado para casa no final do dia de trabalho. Félix era casado e pai de cinco filhos. Segundo informação do presidente da Associação, ele já vinha recebendo ameaças de morte e registrou o fato na Delegacia de Polícia de São Félix do Xingu. O corpo de Félix foi sepultado em Marabá.
Pará 2. O lider quilombola Artêmio Gusmão, conhecido pelo apelido de Alaor, foi assassinado na sexta-feira 4 de julho, por volta de 19h. O crime foi praticado quando Alaor voltava para a comunidade, após assistir à partida entre Brasil x Colômbia, na Vila Camarial, no Pará. Alaor era coordenador da comunidade Mancaraduba. Dois irmãos do líder quilombola já haviam sido assassinados no ano retrasado devido, também, a conflitos fundiários.
Bahia. O líder quilombola Paulo Sérgio Santos, 42 anos, foi assassinado no final da tarde do domingo, 6 de julho, no acampamento quilombola Nelson Mandela, nas proximidades de uma comunidade Quilombola localizada em Helvécia, interior de Nova Viçosa, na Bahia. Foi surpreendido por homens armados que chegaram em um Gol cor prata e desceram atirando em sua direção. Paulo participaria no dia seguinte de uma reunião com uma empresa de celulose. Segundo um dos membros do movimento quilombola da região, União de Negros pela Igualdade (Unegro), muitas destas comunidades sofrem a opressão da violência armada comandadas por empresas de segurança contratada pelas empresas de celulose que ocupam mais de 70% das terras quilombolas da região de Nova Viçosa, além, também, da violência empreendida por empresários do agronegócio.
Além das mortes
A justiça tem sido cúmplice dessa violência. Em Marabá, foram presas quatro lideranças do MST, entre elas Moisés Jorge. Em Alagoas, policiais militares prenderam agente de saúde indígena e liderança do povo Xukuru-Kariri, José Carlos Araújo Ferreira, mais conhecido na comunidade como Carlinhos, na sexta-feira, 11. Ele integra a Comissão de Luta pela Terra do povo Xukuru-Kariri.
Ao mesmo tempo em que é ágil para prender lideranças dos movimentos sociais – como o caso dos ativistas presos no Rio de Janeiro – a mesma justiça é lenta quando convém aos patrões da Casa Grande. A demora do judiciário tem acirrado os conflitos em Corumbiara, Rondônia, palco do massacre que matou ao menos 11 pessoas em 1995. A demora ocorre no andamento de processos relacionados aos Contratos de Alienação de Terra Pública (CATPs) emitidos na década de 1970, cujos responsáveis não cumpriram cláusulas dos contratos assinados com o Incra.
No Maranhão, a juíza Jaqueline Rodrigues da Cunha, da comarca de São João Batista, soltou o o pistoleiro Josuel Sabóia, que participou da morte do líder quilombola Flaviano Pinto, em 30 de outubro de 2010, no município de São Vicente Ferrer (MA).
No Pará, a justiça vai decidir, na próxima terça-feira dia 29 de julho, se anula o julgamento que soltou o acusado de ser o mandante do assassinado dos ambientalistas José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo, ocorrido em maio de 2011 em Nova Ipixuna.
A CPT aguarda informações para confirmar se o assassinato de seis pessoas no agreste de Pernambuco também está relacionado com conflitos fundiários.