Por Maurício Thuswohl
Rio de Janeiro – A polêmica que cerca a presença da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA) às margens da Baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro, voltou a ganhar força nos últimos dias. Com menos de um ano de operação – sua primeira chapa de aço foi produzida no dia 7 de setembro de 2010 – o empreendimento liderado pela empresa alemã ThyssenKrupp já acumula duas multas (R$ 1,8 milhão e R$ 2,8 milhões) impostas pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea). Por duas vezes, as falhas de operação da CSA ao descartar o ferro-gusa em poços de emergência provocaram o vazamento de uma fuligem branca que cobriu casas e carros em diversas localidades da Zona Oeste do Rio e provocou alergias e doenças respiratórias em dezenas de moradores.
O problema de saúde pública, aliado ao impacto que a siderúrgica vem causando na atividade pesqueira da baía desde o início de sua construção, em 2007, faz com que a presença da CSA na região seja motivo de constante tensão social. Ciente dessa realidade, o governo estadual, além das multas, impôs à direção da CSA a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) sem o qual a licença de operação definitiva da siderúrgica não será concedida pelo Inea. Preocupações quanto ao conteúdo desse TAC e sua aplicação prática, no entanto, têm provocado novas movimentações políticas em torno do tema.
Nesta segunda-feira (5), a Comissão Especial da Assembléia Legislativa do RJ (Alerj) criada para investigar possíveis irregularidades no processo de instalação da CSA no estado ouviu o advogado e ambientalista Rogério Rocco, que era superintendente do Ibama no Rio na época da chegada da usina, e o médico Luiz Tenório, coordenador de Saúde Ambiental da Secretaria Estadual do Ambiente (SEA): “Queremos saber mais sobre as multas, suas motivações e conseqüências, além de outros detalhes sobre o processo de licenciamento da CSA”, disse a presidente da comissão, deputada estadual Lucinha (PSDB), antes da reunião.
A ação política mais contundente, entretanto, partiu de integrantes da Articulação das Populações Atingidas pela CSA que permaneceram acampados por uma semana em frente a sede da SEA, até serem recebidos pelo secretário estadual do Ambiente, o ex-ministro Carlos Minc. A ação dos manifestantes, em sua maioria moradores do bairro de Santa Cruz, foi motivada pelo não comparecimento de Minc a duas audiências públicas consecutivas, realizadas pela Comissão Especial da Alerj.
Quando foram recebidos pelo secretário, em uma reunião na quarta-feira (31), os representantes dos moradores cobraram do governo a realização de um estudo dos impactos da CSA sobre o meio ambiente e a saúde humana na região: “Antes da conclusão do TAC, deveria ser feita uma mensuração dos impactos da siderúrgica não somente sobre a pesca na Baía de Sepetiba, mas em todo o entorno da CSA. Esses impactos nunca foram mensurados”, argumenta Rodolfo Lobato, dirigente da Articulação das Populações Atingidas pela CSA e último a deixar o acampamento improvisado.
Lobato afirma que existe um grupo de trabalho criado pelo governo para tratar da questão da saúde no entorno da usina: “Esse GT seria formado por Fundacentro, Uerj, UFRJ e Fundação Oswaldo Cruz, e poderia ser um importante instrumento para medir o impacto sobre a saúde da população. Mas, não temos ainda nenhuma informação concreta sobre seu funcionamento”, reclama. Sobre os impactos na atividade pesqueira, Lobato é taxativo: “Para verificar o problema, basta ir para a baía e jogar a rede. Não tem peixe, e os poucos que você pega, quando são abertos apresentam uma lama viscosa em suas vísceras que nós nunca tínhamos visto nos peixes. É bem simples de ver o impacto da CSA”, diz.
Compra assistida
Na reunião, segundo o ativista, Minc falou sobre a possibilidade, ainda em estudo, de os moradores que desejarem sair das proximidades da usina terem à disposição um mecanismo chamado compra assistida, já utilizado pela secretaria em outras localidades. Nesse caso, a CSA ficaria obrigada a comprar o imóvel das pessoas que quisessem sair. Lobato, no entanto, tem diversos questionamentos à idéia: “Como ficarão as pessoas que não quiserem sair na compra assistida? Será que o TAC vai considerar essas pessoas? Quais as garantias de que não irão sofrer daqui a dez, quinze anos, como já alertou a Fiocruz? É correto deixar essa escolha e essa responsabilidade nas mãos de uma população que não tem acesso às informações corretamente?”.
Diversas associações de pescadores de Pedra de Guaratiba, região onde a atividade vem sofrendo o maior declínio desde a chegada da CSA, também manifestaram ao governo estadual o seu repúdio a um acordo firmado pela empresa e a União das Entidades de Pesca e Aquicultura do Estado do Rio de Janeiro (Uepa). A maior queixa é que a entidade não representaria boa parte dos pescadores diretamente afetados pela siderúrgica: “Outras representações não participaram do acordo e não o reconhecem como um mecanismo legítimo para resolver o problema da atividade de pesca na Baía de Sepetiba. Seria apenas um paliativo. Algumas entidades dizem até mesmo que não adianta um acordo porque a pesca já está comprometida”, explica Lobato.
Enquanto o governo não se manifesta sobre a concessão da licença de operação definitiva para a CSA, os trabalhos da Comissão Especial da Alerj devem continuar a pleno vapor, segundo os deputados que a compõem. Os moradores e pescadores que estão à frente do movimento de resistência à siderúrgica também prometem permanecer de prontidão: “Ficou acertado com o secretário e o Inea que haverá uma nova audiência pública no dia 15 de setembro. Antes disso, vamos organizar uma reunião estratégica para pensar o que pode ser melhor para a população”, avisa Rodolfo Lobato.
http://minutonoticias.com.br/moradores-pescadores-e-parlamentares-se-mobilizam-contra-licenca-definitiva-a-csa