Tania Pacheco – Combate Racismo Ambiental
No cenário de violência, racismo e mortes que vem marcando a História dos povos indígenas em Mato Grosso do Sul, imagino quantos juízes já visitaram uma Terra Indígena, mesmo que homologada; quantos já estiveram numa retomada antes de decidir sobre uma reintegração de posse; quantos, enfim, encaram os Guarani, Kaiowá, Terena e Kadiwéu (para ficarmos nos mais populosos), sem preconceitos? Pois o juiz Pedro Pereira dos Santos, da 4ª Vara da 1ª Seção Subsidiária de Mato Grosso do Sul, tem condições de responder sim a boa parte dessas questões.
A história pode ser facilmente sintetizada: em 2010, a justiça federal em Campo Grande suspendeu o processo administrativo de demarcação da Terra Indígena Taunay Ipegue, acatando o velho e imoral argumento da necessidade de verificar se os Terena lá viviam quando a Constituição foi promulgada, em 1988. Digo ‘imoral’ porque sabemos bem como eles foram expulsos, ou, na escrita mais formal do Desembargador Federal Paulo Fontes: “a reocupação não ocorreu por atos de expropriação territorial praticados por não índios”.
Durante quatro anos tudo ficou parado, até que o processo caiu nas mãos o juiz Pedro Pereira dos Santos, que aliás já foi criticado e elogiado por este blog mais de uma vez. Pois o que ele fez foi praticar a Justiça, começando de uma forma que para muitos não deveria, mas pode parecer insólita: foi visitar as três fazendas situadas dentro do território indígena, cuja ‘posse’ é reivindicada na Ação contra os Terena, a Funai e a União.
A partir do que viu e pesquisou, revogou a suspensão de 2010 e determinou que o processo de demarcação deve continuar, numa decisão (ler abaixo) que é um exemplo de respeito aos direitos indígenas. Após calcular o provável número total de habitantes na comunidade Taunay Ipegue, ele é objetivo:
“Salta aos olhos a insuficiência dessas terras Terena, máxime se considerada a qualidade do solo da região, já localizada no Pantanal. (…) Feitas as contas os índios precisariam de 84.510 hectares, ou seja, mais de treze vezes a área atualmente ocupada”.
Refuta a tentativa dos autores da Ação de utilizar as condicionantes de Raposa Serra do Sol, reafirmando que “as referidas condicionantes fixadas não têm efeito vinculante, como depois deixou claro o próprio Supremo”. E, ante a argumentação de que eles teriam adquirido legalmente as terras, responde que se assim for, caberá ao Executivo, relembrando que em 13 de março deste ano mesmo foi publicado “decreto presidencial declarando de interesse social, para fins de desapropriação, de imóvel destinado à Comunidade Indígena Tuxá de Rodelas, no município de Rodelas, Estado da Bahia, o que demonstra o propósito do governo federal em proceder à regularização das terras indígenas de um modo geral”. Exceto por esta parte, que gostaríamos muito se comprovasse verdadeira, estaria assim solucionada a questão, caso de fato tenha havido uma compra de boa fé.
Ante essa belíssima decisão, os autores da Ação (Nilton Lippi e outros) buscaram revertê-la ingressando com um recurso de Agravo de Instrumento junto ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Mas o Tribunal, através do Relator, desembargador federal Paulo Fontes, manteve a decisão agravada, citando inclusive trechos de diversos outros processos envolvendo comunidades indígenas, inclusive o de Pilad Rebuá e Lilima. Ao final o desembargador Paulo Fontes relembra que “quando o processo administrativo foi suspenso havia despacho do Presidente da FUNAI decidindo pela sua remessa ao Ministro da Justiça” (ver abaixo). E deixa claro que a palavra está agora com ele.
Cabe então a José Eduardo Cardozo emitir a Portaria Declaratória para que sejam iniciados os trabalhos de demarcação e georreferenciamento da Terra Indígena. E, se constatada a compra de terras de boa fé, indenizar de forma adequada os atuais ocupantes da área.
Sem dúvida, uma bela vitória para os Terena e para a Justiça.
***
A seguir, a decisão do juiz Pedro Pereira dos Santos (que me permiti quebrar em parágrafos para facilitar a leitura), seguida da íntegra do AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0014619-22.2014.4.03.0000/MS, relatado pelo Desembargador Paulo Fontes.
Decisão do juiz Pedro Pereira dos Santos:
“Passo a decidir sobre o andamento do processo administrativo.
É fato incontroverso a demarcação da área dos Terena da Aldeia Taunay-Ipegue nos idos de 1905, procedida por Rondon. A controvérsia reside na pretensão da FUNAI em atender a reivindicação da Comunidade, visando a ampliação daquela gleba, sob o fundamento de que os indígenas nunca concordaram com os limites ali definidos. Defende, dentre outros argumentos, que Rondon teve que se contentar em salvar o que encontrou na posse dos índios, pois os fazendeiros apossaram-se do restante outrora por eles ocupados. Já os autores dizem que suas glebas nada têm a ver com a área indígena, cuja posse resume-se naquele exercida sobre a área da reserva.
Na decisão de fls. 1726-34, proferida em 13 de agosto de 2010, o processo administrativo FUNAI/BSB N 08620-000289/1985-DV foi suspenso, visando a uma inspeção tendo como objetivo a verificação do denominado fato indígena. Buscou a magistrada que deferiu aquela medida verificar se os Terena tinham a posse do imóvel reivindicado à época da CF de 1988.
Em janeiro deste ano também visitei as três fazendas declinadas na inicial, como se vê do termo de fls inserido nos autos, acompanhado das fotos extraídas na ocasião. Pois bem.
Em 2004, quando foi elaborado o relatório de fls. 371-87 que delimitou a área reivindicada pelos Terena, o antropólogo informava que comunidade contava com 3880 índios. Em junho de 2010 (relatório de f. 3928) esse número elevou-se para 4941 índios. De sorte que, se mantida a média de aumento populacional, hoje a Aldeia conta com mais de 5500 pessoas.
A área demarcada por Rondon é de 6461 hectares, aí incluídas as áreas destinadas às residências, plantações, equipamentos públicos (ruas, escolas, posto de saúde, igrejas, etc) e áreas ambientais. Se dividida toda a área pela quantidade de famílias ali residentes – mais de 950 – chega-se a 6,8 hectares por família ainda assim com todas as reservas antes declinadas. Salta aos olhos a insuficiência dessas terras Terena, máxime se considerada a qualidade do solo da região, já localizada no Pantanal.
Como bem observou o subscritor do laudo de f. 3933 o módulo fiscal do município onde está localizada a área é de 90 hectares. Feitas as contas os índios precisariam de 84.510 hectares, ou seja, mais de treze vezes a área atualmente ocupada.
A carência da comunidade sob o aspecto de falta de terras para o trabalho, com os problemas daí decorrentes – constatada in loco quando da inspeção que realizei – é tão grave que do Relatório dos Trabalhos da Comissão sobre a Questão Indígena em Mato Grosso do Sul, de que tratam as Portarias CNJ nº 53/2013 e 71/2013, enquadrou-a no grau 1 nas prioridades elencadas, culminando por sugerir indenização da terra nua em razão da responsabilidade objetiva por violação da segurança jurídica, em relação aos fazendeiros e o reassentamento dos pequenos proprietários.
Assim, diante da gravidade do quadro, o processo administrativo não deve ficar parado no Ministério da Justiça no aguardo da solução deste processo.
Se deveras as glebas dos autores não se enquadram nas condicionantes fixados pelo Supremo Tribunal Federal no caso Raposa Serra do Sol, como alegam os autores, cabe-lhes alinhar suas razões no referido processo demarcatório. Ressalte-se, no passo, que as referidas condicionantes fixadas não têm efeito vinculante, como depois deixou claro o próprio Supremo. Mas, isso não quer dizer que S.Exª. o Ministro da Justiça não observará esses parâmetros. É preciso ver quais serão os fundamentos daquela autoridade, tornando-se necessário o prosseguimento do processo.
Recorde-se que em data recente – 13 de março de 2014 – o Executivo fez publicar decreto presidencial declarando de interesse social, para fins de desapropriação, de imóvel destinado à Comunidade Indígena Tuxá de Rodelas, no município de Rodelas, Estado da Bahia, o que demonstra o propósito do governo federal em proceder à regularização das terras indígenas de um modo geral. Com isso quero dizer que a tramitação do processo aqui discutido em nada prejudicará o direito dos autores. Se ao final vier a ser demonstrado que a área não é de ocupação tradicional indígena, certamente que o Executivo adotará outras medidas tendentes a resolver os interesses em conflito.
Assim, revogo aquela decisão, por entender que a suspensão do processo – que já perdura por quase quatro anos – é deveras prejudicial à comunidade indígena e, por outro lado, pouco acrescenta aos proprietários, mesmo porque eles estão na posse mansa e pacífica dos respectivos imóveis. Oficie-se. Intimem-se.
DESPACHO DE FLS. 4849/4850: Indefiro o pedido de devolução do prazo (f. 4846-7), uma vez os interessados estão representados nos autos por advogados, de modo que sequer a expedição de mandado para intimação, quanto menos o envio de cópias. A publicação para que os advogados tivessem ciência de que estavam intimados para se manifestar já seria suficiente, pelo que eventual ausência de cópia de petição não implica em complementação do prazo. À SEDI para inclusão de IRINEU RODRIGUES e s/m THEREZA MÁXIMO RODRIGUES, SALMA SALOMÃO SAIGALI, MIRIAN ALVES CORREA, ESPÓLIO DE ÊNIO ALVES CORREA E DE ELVIA ALVES CORREA, MÔNICA ALVES CORREA CARVALHO DA SILVA e s/m NILTON CARVALHO DA SILVA FILHO e EDSON BORGES, mencionados na petição de fls. 4322/4396, como assistentes litisconsorciais dos autores”.
***
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0014619-22.2014.4.03.0000/MS
2014.03.00.014619-2/MS |
RELATOR | : | Desembargador Federal PAULO FONTES |
AGRAVANTE | : | NILTON LIPPI e outros |
: | MARIA DAS GRACAS NALON LIPPI | |
: | LINDOMAR HENRIQUES LIPPI | |
: | EDSON HENRIQUES LIPPI | |
: | RONALDO HENRIQUES LIPPI | |
: | ELIS REGINA LISBOA LIPPI | |
: | DIONALDO VENTURELLI | |
ADVOGADO | : | MS001218 GUILHERMO RAMAO SALAZAR e outro |
AGRAVADO(A) | : | Uniao Federal |
ADVOGADO | : | SP000019 TÉRCIO ISSAMI TOKANO |
AGRAVADO(A) | : | COMUNIDADE INDIGENA TAUNAY IPEGUE |
PROCURADOR | : | TIAGO JOSE FIGUEIREDO SILVA |
AGRAVADO(A) | : | Fundacao Nacional do Indio FUNAI |
PROCURADOR | : | ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA |
EXCLUIDO | : | IRINEO RODRIGUES e outros |
: | THEREZA MAXIMINO RODRIGUES | |
: | SALMA SALOMAO SAIGALI | |
: | MIRIAM ALVES CORREA | |
: | ENIO ALVES CORREA espolio | |
: | ELVIRA MARIA ALVES CORREA espolio | |
: | MIRIAM ALVES CORREA | |
: | MONICA ALVES CORREA CARVALHO DA SILVA | |
: | NILTON CARVALHO DA SILVA FILHO | |
: | EDSON BORGES | |
ADVOGADO | : | MS008423 SERGIO MURITIBA e outro |
ORIGEM | : | JUIZO FEDERAL DA 4 VARA DE CAMPO GRANDE > 1ªSSJ > MS |
No. ORIG. | : | 00030094120104036000 4 Vr CAMPO GRANDE/MS |
DECISÃO
Considerando que as decisões de nossas Cortes de Justiça admitem a oposição de embargos de declaração contra decisão interlocutória e que, aceitos, interrompem o prazo recursal, ainda que improcedentes, admito a tempestividade deste agravo.
Trata-se de agravo de instrumento interposto por NILTON LIPPI e outros contra decisão que, nos autos do processo da ação declaratória positiva de domínio ajuizada em face da FUNAI e outro, visando a declaração de legitimidade do seu domínio e posse sobre os imóveis objetos da ação, e a declaração de nulidade do processo administrativo FUNAI/BSB nº 08620-000289/1985, o qual tem por objeto a demarcação desses imóveis como terras de ocupação indígena em favor da Etnia Terena Taunay-Ipegue, revogou decisão anteriormente proferida e determinou o prosseguimento do processo administrativo demarcatório.
Neste recurso, ao qual pretendem seja atribuído o efeito suspensivo, pedem a revisão do ato impugnado de modo a suspender o processo administrativo demarcatório, bem com deferir a antecipação da tutela em manter a decisão acautelatória que suspendia o referido processo e, ainda, que não se proceda qualquer registro nas matrículas de propriedades dos agravantes até o trânsito em julgado da ação declaratória.
Sustentam, em síntese, que são titulares do domínio sobre as áreas reivindicadas, em razão dos registros de seus títulos no Cartório de Registro Imobiliário, de forma que o exame da cadeia dominial revela que esses títulos remontam de várias décadas, originando-se de títulos outorgados pelo Estado de Mato Grosso em meados de 1890/1900.
Afirmam que o art. 231, §§ 1º e 2º, da Constituição da República de 1988 não pode retroagir para confiscar, injustamente, suas propriedades, como se os agravantes tivessem usurpado as terras dos índios, que além destes não se encontrarem na posse das áreas na data de 05 de outubro de 1988, aqueles possuem títulos escorreitos.
Aduzem que, desde o início, violado o processo administrativo FUNAI/BSB/08620000289/1985-DB, estabelecido pela FUNAI, de forma direta e frontal, os direitos fundamentais de garantia à inviolabilidade da propriedade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, expressos no artigo 5º, caput, XXII, LIV e LV, da CF/88, em razão da falta de cientificação pessoal e por escrito dos interessados.
Afirmam, ainda, que em razão da não oportunidade dos agravantes presenciarem a produção de provas e produzirem as que entenderem interessantes à defesa de seus direitos que julgam ter, os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa foram desrespeitados.
Asseveram que é vedada a ampliação de terra indígena já demarcada, conforme reconhecido no julgamento da Pet. 3388/STF.
Ressaltam que o perigo da demora está devidamente caracterizado, pois com o prosseguimento do processo administrativo, a portaria será expedida pelo Ministro da Justiça, a qual levará à demarcação da terra, sendo que, uma vez homologada pelo Presidente da República, será registrada no Cartório de Imóveis competente e acarretará na retirada dos agravantes do local.
É o breve relatório.
Inicialmente, observo que compete à União Federal demarcar as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, bem como proteger e fazer respeitar todos os seus bens, conforme norma prevista no art. 231 da Constituição Federal.
Por sua vez, o artigo 273 do Código de Processo Civil estabelece como requisitos para a antecipação dos efeitos da tutela, a existência de elementos probatórios capazes de convencer o juiz acerca do direito do autor, cumulada com a possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação, caracterizada pela necessidade urgente do postulante e possível ineficácia da sentença final (se procedente o pedido), ou que esteja evidenciado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
Na hipótese, analisando o conteúdo deste processo, observo que não se evidenciaram os requisitos para a concessão da antecipação dos efeitos da tutela pretendida.
A demarcação das terras indígenas, conforme disposto no Decreto 1.775/96, deverá ser precedida de trabalho de identificação da área, sob iniciativa e orientação do órgão federal de assistência ao índio (FUNAI).
Assim dispõe o referido decreto:
Art. 1º As terras indígenas, de que tratam o art. 17, I, da Lei n° 6001, de 19 de dezembro de 1973, e o art. 231 da Constituição, serão administrativamente demarcadas por iniciativa e sob a orientação do órgão federal de assistência ao índio, de acordo com o disposto neste Decreto.
Art. 2° A demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios será fundamentada em trabalhos desenvolvidos por antropólogo de qualificação reconhecida, que elaborará, em prazo fixado na portaria de nomeação baixada pelo titular do órgão federal de assistência ao índio, estudo antropológico de identificação.
§ 1° O órgão federal de assistência ao índio designará grupo técnico especializado, composto preferencialmente por servidores do próprio quadro funcional, coordenado por antropólogo, com a finalidade de realizar estudos complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação.
§ 2º O levantamento fundiário de que trata o parágrafo anterior, será realizado, quando necessário, conjuntamente com o órgão federal ou estadual específico, cujos técnicos serão designados no prazo de vinte dias contados da data do recebimento da solicitação do órgão federal de assistência ao índio.
§ 3° O grupo indígena envolvido, representado segundo suas formas próprias, participará do procedimento em todas as suas fases.
§ 4° O grupo técnico solicitará, quando for o caso, a colaboração de membros da comunidade científica ou de outros órgãos públicos para embasar os estudos de que trata este artigo.
§ 5º No prazo de trinta dias contados da data da publicação do ato que constituir o grupo técnico, os órgãos públicos devem, no âmbito de suas competências, e às entidades civis é facultado, prestar-lhe informações sobre a área objeto da identificação.
§ 6° Concluídos os trabalhos de identificação e delimitação, o grupo técnico apresentará relatório circunstanciado ao órgão federal de assistência ao índio, caracterizando a terra indígena a ser demarcada.
§ 7° Aprovado o relatório pelo titular do órgão federal de assistência ao índio, este fará publicar, no prazo de quinze dias contados da data que o receber, resumo do mesmo no Diário Oficial da União e no Diário Oficial da unidade federada onde se localizar a área sob demarcação , acompanhado de memorial descritivo e mapa da área, devendo a publicação ser afixada na sede da Prefeitura Municipal da situação do imóvel.
§ 8° Desde o início do procedimento demarcatório até noventa dias após a publicação de que trata o parágrafo anterior, poderão os Estados e municípios em que se localize a área sob demarcação e demais interessados manifestar-se, apresentando ao órgão federal de assistência ao índio razões instruídas com todas as provas pertinentes, tais como títulos dominiais, laudos periciais, pareceres, declarações de testemunhas, fotografias e mapas, para o fim de pleitear indenização ou para demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório de que trata o parágrafo anterior.
§ 9° Nos sessenta dias subseqüentes ao encerramento do prazo de que trata o parágrafo anterior, o órgão federal de assistência ao índio encaminhará o respectivo procedimento ao Ministro de Estado da Justiça, juntamente com pareceres relativos às razões e provas apresentadas.
§ 10. Em até trinta dias após o recebimento do procedimento, o Ministro de Estado da Justiça decidirá:
I – declarando, mediante portaria, os limites da terra indígena e determinando a sua demarcação ;
II – prescrevendo todas as diligências que julgue necessárias, as quais deverão ser cumpridas no prazo de noventa dias;
III – desaprovando a identificação e retornando os autos ao órgão federal de assistência ao índio, mediante decisão fundamentada, circunscrita ao não atendimento do disposto no § 1º do art. 231 da Constituição e demais disposições pertinentes.
Art. 3° Os trabalhos de identificação e delimitação de terras indígenas realizados anteriormente poderão ser considerados pelo órgão federal de assistência ao índio para efeito de demarcação, desde que compatíveis com os princípios estabelecidos neste Decreto.
Art. 4° Verificada a presença de ocupantes não índios na área sob demarcação, o órgão fundiário federal dará prioridade ao respectivo reassentamento, segundo o levantamento efetuado pelo grupo técnico, observada a legislação pertinente.
Art. 5° A demarcação das terras indígenas, obedecido o procedimento administrativo deste Decreto, será homologada mediante decreto.
Art. 6° Em até trinta dias após a publicação do decreto de homologação, o órgão federal de assistência ao índio promoverá o respectivo registro em cartório imobiliário da comarca correspondente e na Secretaria do Patrimônio da União do Ministério da Fazenda.
Art. 7° O órgão federal de assistência ao índio poderá, no exercício do poder de polícia previsto no inciso VII do art. 1° da Lei n° 5.371, de 5 de dezembro de 1967, disciplinar o ingresso e trânsito de terceiros em áreas em que se constate a presença de índios isolados, bem como tomar as providências necessárias à proteção aos índios .
Art. 8° O Ministro de Estado da Justiça expedirá as instruções necessárias à execução do disposto neste Decreto.
Art. 9° Nas demarcações em curso, cujo decreto homologatório não tenha sido objeto de registro em cartório imobiliário ou na Secretaria do Patrimônio da União do Ministério da Fazenda, os interessados poderão manifestar-se, nos termos do § 8° do art. 2°, no prazo de noventa dias, contados da data da publicação deste Decreto.
Parágrafo único. Caso a manifestação verse demarcação homologada, o Ministro de Estado da Justiça a examinará e proporá ao Presidente da República as providências cabíveis.
Art. 10. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 11. Revogam-se o Decreto n° 22, de 04 de fevereiro de 1991, e o Decreto n° 608, de 20 de julho de 1992.
O procedimento de demarcação de terras indígenas tem caráter declaratório, porquanto as terras em que se verifica a ocupação tradicional indígena são desde logo, por dicção constitucional, pertencentes à União e sujeitas ao usufruto exclusivo da comunidade indígena – cabendo ao órgão oficial apenas os estudos antropológicos, a delimitação e demarcação da área.
Nestes termos, somente após a concretização dos estudos de natureza etno-histórica, antropológica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação, serão fornecidos os elementos necessários para descrever com propriedade a existência ou não de ocupação de terras indígenas na área objeto da lide e demais requisitos no marco temporal previsto para a demarcação de terras.
Portanto, imprescindível a continuidade do processo administrativo demarcatório, meio através do qual será possível um juízo acerca da ocupação indígena sobre a área em questão e do conseqüente domínio da União.
E se da realização dos estudos de natureza etno-histórica e antropológica, evidenciar que a área, efetivamente, se situa em terras indígenas, ao particular que for afetado pelo processo de identificação da área a ser demarcada será assegurado o contraditório e a ampla defesa, com a possibilidade de se manifestar, produzindo todas as provas pertinentes em defesa de seu direito.
Por outro lado, por ocasião do julgamento do Pet 3388 / RR – RORAIMA, o Egrégio Supremo Tribunal Federal decidiu acerca do marco temporal de ocupação para fins de demarcação de terras tradicionalmente indígenas, conforme consta dos itens 11.1 e 11.2 da ementa:
11.1. O marco temporal de ocupação. A Constituição Federal trabalhou com data certa — a data da promulgação dela própria (5 de outubro de 1988) — como insubstituível referencial para o dado da ocupação de um determinado espaço geográfico por essa ou aquela etnia aborígene; ou seja, para o reconhecimento, aos índios, dos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam.
11.2. O marco da tradicionalidade da ocupação. É preciso que esse esteja coletivamente situado em certo espaço fundiário também ostente o caráter da perdurabilidade, no sentido anímico e psíquico de continuidade etnográfica. A tradicionalidade da posse nativa, no entanto, não se perde onde, ao tempo da promulgação da Lei Maior de 1988, a reocupação apenas não ocorreu por efeito de renitente esbulho por parte de não-índios. Caso das “fazendas” situadas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, cuja ocupação não arrefeceu nos índios sua capacidade de resistência e de afirmação da sua peculiar presença em todo o complexo geográfico da “Raposa Serra do Sol”.
(PET3388 / RR, Rel. Min. Carlos Britto, j. 19/03/2009, DJ 25.09.2009)
Em face da decisão acima transcrita, não há como deixar de reconhecer que foi fixado limite de tempo de ocupação, no entanto, com ressalvas, devendo-se verificar que a reocupação não ocorreu por atos de expropriação territorial praticados por não índios.
Assim, não há como impedir o prosseguimento do processo administrativo.
Neste sentido, confiram-se os seguintes julgados de nossas Cortes de Justiça:
..EMEN: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. DEVIDO PROCESSO LEGAL. DILAÇÃO PROBATÓRIA. I. O reconhecimento da ocupação de terras por indíos pela União é mera declaração e não cria ou constitui nenhum direito, trata-se somente do reconhecimento de uma situação pré-existente, que independe do próprio reconhecimento do Estado. II. O Decreto n° 1.775/1996 não prevê a interposição de recurso hierárquico e, ainda assim, permite que as razões apresentadas na contestação administrativa sejam apreciadas pelo Ministério da Justiça, não há que se falar em prejuízo para o município impetrante ou desrespeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa. III. Verificar a conformidade da atuação da FUNAI na delimitação da área indígena ou a necessidade de elaboração de estudos complementares demanda a necessidade de instrução probatória, o que é incompatível com o rito do mandado de segurança. IV. Segurança denegada. ..EMEN: (Grifei)
(MS 10225, JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, STJ – PRIMEIRA SEÇÃO, DJ DATA:12/11/2007 PG:00148 ..DTPB:.)
..EMEN: ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. ESGOTAMENTO DO LAPSO ASSINALADO NO ART. 67 DO ADCT. PRAZO ASSINALADO EM FAVOR DA DEMARCAÇÃO E DOS INTERESSES DOS INDÍGENAS. INEXISTÊNCIA DE GARANTIA CONSTITUCIONAL AO DUPLO GRAU ADMINISTRATIVO. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. OFENSA ÀS GARANTIAS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. INOCORRÊNCIA. 1. O art. 67 do ADCT não estipula prazo decadencial para a realização da providência ali determinada. Trata-se de prazo destinado a impulsionar o cumprimento pela União do dever constitucionalmente imposto de delimitar e proteger as áreas tradicionalmente ocupadas pelos índios, as quais são “inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis” (art. 231). Não tem o decurso do prazo, assim, evidentemente, o efeito de desincumbir o Poder Público desse encargo. O prazo foi fixado em benefício da demarcação e dos interesses dos indígenas, e não contra eles. 2. Esta Corte, na esteira da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, assentou o entendimento segundo o qual não há, na Constituição de 1988, garantia de duplo grau de jurisdição administrativa. 3. A disciplina específica do procedimento administrativo de demarcação de áreas indígenas consta do Decreto 1.775/96, no qual não há previsão de recurso hierárquico, mas apenas de manifestação de interessados, desde o início do procedimento até 90 dias após a publicação do relatório de identificação e delimitação da terra indígena, mediante apresentação “ao órgão federal de assistência ao índio [de] razões instruídas com todas as provas pertinentes, tais como títulos dominiais, laudos periciais, pareceres, declarações de testemunhas, fotografias e mapas, para o fim de pleitear indenização ou para demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório (…)” (art. 2º, § 8º), as quais serão apreciadas pelo próprio órgão, nos 60 dias subseqüentes ao encerramento do prazo para manifestações (§ 9º), e encaminhadas, juntamente com o restante do procedimento, ao Ministro de Estado da Justiça, para decisão. 4. No caso concreto, foi oportunizada à impetrante a apresentação de razões, tendo sido os argumentos e elementos probatórios por ela trazidos aos autos do processo administrativo tomados em consideração pela FUNAI na formulação de seu parecer, ainda que para serem tidos por irrelevantes à delimitação das terras indígenas, ou mesmo para serem refutados por considerações de ordem técnica. Resta descaracterizada, com isso, a alegada ofensa às garantias do contraditório e da ampla defesa. 5. Mandado de segurança denegado. ..EMEN: (Grifei)
(MS 10269, JOSÉ DELGADO, STJ – PRIMEIRA SEÇÃO, DJ DATA:17/10/2005 PG:00162 ..DTPB:.)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. TERRA INDÍGENA. RESERVA PARABUBURE. DEMARCAÇÃO. LEVANTAMENTO FUNDIÁRIO. POSSE. DESTITUIÇÃO. AÇÃO CAUTELAR. LIMINAR PARA IMPEDIR O REGISTRO DAS TERRAS. DECRETO N. 1.775/1996. 1. Liminar corretamente indeferida, à míngua dos seus requisitos autorizadores, certo que o procedimento administrativo instaurado, para a demarcação das terras em questão, não implica a imediata perda da posse, assegurando, ademais, aos interessados, o exercício da ampla defesa para a apresentação de provas, objetivando indenização ou a demonstração da ocorrência de vícios no referido procedimento administrativo. 2. Agravo desprovido.
(AG 200201000083426, DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, TRF1 – SEXTA TURMA, DJ DATA:12/09/2005 PAGINA:126.)
DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. QUESTÃO INDÍGENA. PROCEDIMENTO DE IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA TERRA “JATAYVARY”. PONTA-PORÃ/MS. PEDIDO DE TUTELA. SUSPENSÃO DO PROCEDIMENTO. ARTIGO 67 DO ADCT. LEI Nº 6.001/73. DECRETO Nº. 1.775/96. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. DECISÃO REFORMADA. 1. Em sede de cognição sumária, é razoável aquilatar e decidir sobre a relevância dos motivos e, in casu, não verifico justificativas plausíveis a ensejar a suspensão do referido processo demarcatório como determinou o Juízo a quo, aliás, a decisão revela-se contrária à proteção dos interesses tutelados constitucionalmente em favor das comunidades indígenas. E, rigorosamente falando, a antecipação da tutela é faculdade do juiz quando, além da existência de prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação, requisitos esses ausentes no presente caso. 2. Não se deve olvidar que o caso em tela envolve interesses sociais relevantes, direitos indígenas e de propriedade, todos tutelados pela Constituição Federal, que, por outro lado, assegura, no artigo 5º, inciso LXXVIII, tanto no âmbito judicial quanto no administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. 3. Frise-se, ademais, que a Constituição da República reconhece os direitos originários dos povos indígenas, direito esse anterior à criação do próprio Estado Brasileiro, sendo reconhecidos aos índios, além da sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, também os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens (art. 231), e, como antes afirmado, a Constituição determinou prazo para a conclusão dos processos demarcatórios, que há muito tempo já esgotou, o que denota notório prejuízo à comunidade indígena. 4. A demarcação das terras indígenas é necessária para a definição e fixação de seus limites e, para que isso ocorra, o prosseguimento do processo administrativo é medida que se impõe, não havendo como se convencer da verossimilhança da alegação por ausência de prova inequívoca, requisito inafastável para a antecipação parcial ou total da tutela, merecendo reforma a decisão que suspendeu o procedimento de identificação e delimitação da área indígena “Jatayvary”, registrado sob o nº. 08620-1.862/00. 5. Anoto, ainda, que a demarcação das terras indígenas, pela União Federal, deverá observar ao disposto na Lei nº. 6.001, de 19 de dezembro de 1973, e no Decreto nº. 1.775, de 8 de janeiro de 1996, legislação de regência da matéria, cuja constitucionalidade já foi proclamada pelo Supremo Tribunal Federal. 6. De outra parte, não se ignora que o direito de propriedade também goza de proteção constitucional, aliás, os direitos tutelados envolvem valores igualmente relevantes, e, neste momento processual, a atuação judicial deve buscar igualmente a sua proteção, porém, não há falar em prejuízo aos agravados com a atuação demarcatória da União, devendo esta deve prosseguir, pois, o prosseguimento não implica, necessariamente, a prática de atos expropriatórios ou ofensivos à posse. Com efeito, vale frisar que o prosseguimento do processo nº. 08620.001862/2000, não implica em providências de eventuais expropriações, o que se dará, se o caso, em momento oportuno, restando, assim, preservado o equilíbrio entre os interesses envolvidos no processo. 7. Não bastasse, outro requisito necessário é o da existência de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Aqui, se afigura o requisito do periculum in mora, comum às medidas cautelares. A possibilidade de prejuízo irreparável decorre da possível demora. No caso dos autos, verifico que o periculum in mora inverso afigura-se de maior gravidade, na medida em que a manutenção da decisão que deferiu a tutela para sobrestar o andamento do processo demarcatório acarretaria lesão aos agravantes (União Federal, FUNAI e MPF), na medida em que a Constituição Federal estipula prazo para a conclusão da demarcação de terras indígenas, aliás, exaurido há muito tempo, bem como tratar-se o caso de medida necessária para a proteção dos índios, sendo de extrema relevância social, cultural e histórica, a preservação de tais populações como habitantes tradicionais das terras brasileiras. 8. Agravo a que se dá provimento e agravo regimental prejudicado. (Grifei)
(AI 00892519720064030000, JUIZ CONVOCADO VALDECI DOS SANTOS, TRF3 – SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 2 DATA:16/04/2009 PÁGINA: 372 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. AÇÃO DECLARATÓRIA QUE OBJETIVA PRONUNCIAMENTO JUDICIAL NO SENTIDO DE QUE AS TERRAS EM QUESTÃO SÃO PARTICULARES E NÃO TERRAS PÚBLICAS INDÍGENAS. CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA PARA DETERMINAR A SUSPENSÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. COMUNIDADE DE ÍNDIOS GUARANI-NHANDÉVA QUE SEMPRE HABITARAM A REGIÃO, NÃO SENDO A HIPÓTESE DE EXTINTO ALDEAMENTO INDÍGENA. DETERMINAÇÃO CONSTITUCIONAL QUE ASSEGURA AOS ÍNDIOS O DIREITO À DEMARCAÇÃO DE SUAS TERRAS. PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE GOZA DE PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E VERACIDADE. AGRAVO PROVIDO. I – A defesa judicial ou extrajudicial das comunidades indígenas compete à FUNAI, nos termos do que dispõe o art. 35 da Lei nº 6.001/73 (Estatuto do Índio), sendo também no mesmo sentido a determinação prevista no § 6º do art. 11-B, da Lei nº 9.028/95, que dispõe sobre as atribuições da Advocacia-Geral da União. II – A legitimidade processual dos índios, suas comunidades e organizações, lhes confere mera faculdade de ingressar no feito em que se discutem seus interesses, não se tratando de hipótese de litisconsórcio passivo necessário. III – A prova de domínio particular não impede o processo administrativo de demarcação das terras indígenas, devendo tal alegação ser apreciada pela Administração. IV – Em razão do princípio federativo que impõe a separação e a harmonia entre os Poderes, não cabe ao Judiciário antecipar-se na apreciação das provas do alegado domínio sobre as terras indígenas, ainda que preventivamente, através de ação declaratória, sendo o autor carecedor da ação. V – Segundo as disposições contidas no artigo 231, caput, e §§ 2º, 4º e 6º, da Constituição Federal, a posse e o domínio privado não impedem a demarcação das terras indígenas, mas apenas asseguram o direito à indenização das benfeitorias de boa-fé e da propriedade, esta se anterior à Carta Constitucional de 1934. VI – Tutela antecipada que, ademais de concedida por decisão nula, violou o princípio federativo e desconsiderou a absoluta falta de relevância dos fundamentos da ação subjacente. VII – A demarcação das terras indígenas decorre de imperativo constitucional (arts. 231 e 67 do ADCT). VIII – Segundo se deflui dos autos, não se trata de extinto aldeamento indígena, uma vez que os índios Guarani-NHANDÉVA sempre habitaram a região. IX – No cumprimento de tais determinações a FUNAI tem emprendido, através de processos administrativos, o itinerário de identificação e delimitação das terras indígenas, o mesmo ocorrendo com relação à comunidade SOMBRERITO, localizada no Município de Sete Quedas/MS. X – Os atos administrativos gozam da presunção de legalidade e veracidade. XI – Eventual irregularidade na demarcação não está imune ao controle do judiciário. XII – O processo demarcatório suspenso pela decisão agravada não implica a perda imediata da posse. Inexistência de dano irreparável ou de difícil reparação (CPC, art, 273, I) que justificasse a concessão de tutela antecipada. XIII – Agravo provido.(AI 01072307220064030000, DESEMBARGADOR FEDERAL HENRIQUE HERKENHOFF, TRF3 – SEGUNDA TURMA, DJF3 DATA:28/08/2008 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
PROCESSUAL CIVIL. DEMARCAÇÃO TERRAS IINDÍGENAS. FUNAI. PRÉVIA NOTIFICAÇÃO PROPRIETÁRIOS E ENTES FEDERADOS. PORTARIA N. 2.248/2011-MJ. DESNECESSIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPROVIDO. I – A ausência de notificação prévia dos proprietários das terras em que localiza as áreas objeto de estudo para identificação e delimitação de terras indígenas pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI não caracteriza cerceamento da ampla defesa e do contraditório. II – A determinação de notificação prévia pela FUNAI criaria etapa não prevista no procedimento delineado pelo Decreto nº 1.775/96, bem como inviabilizaria a realização dos estudos iniciais imprescindíveis ao início do processo de demarcação do território indígena (Precedente STF: SS 4243, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO (Presidente)). III – Impor à FUNAI a necessidade de notificação prévia como desejam os agravantes compromete severamente o exercício de uma das suas mais importantes funções institucionais, que é a de demarcar terras indígenas, função essa que tem prazo constitucional (Ministro Teori Albino Zavascki na Suspensão de Segurança n. 2.309/STJ, em voto vista, divergindo do Relator). IV – Agravo a que se nega provimento. (Grifei)
(AG 0070236-89.2012.4.01.0000 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, SEXTA TURMA, e-DJF1 p.104 de 10/10/2013)
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TERRAS INDÍGENAS. DECRETO 1.775/1996. CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA E DEVIDO PROCESSO LEGAL. VIOLAÇÃO. INOCORRÊNCIA. DOCUMENTAÇÃO. APRESENTAÇÃO. DESNECESSIDADE. I – Inexiste previsão no Decreto 1.775/96, que trata do procedimento administrativo de demarcação de terra indígena, da obrigatoriedade de publicação, por parte da administração, dos nomes de todos os interessados e de fornecimento de documentos ou informações. II – Os trabalhos de identificação e delimitação são eminentemente técnicos, a serem realizados por grupo técnico especializado composto preferencialmente por servidores do órgão e coordenado por antropólogo, que fará os estudos complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação, inexistindo, nessa fase, previsão de exercício do contraditório ou de ampla defesa, o que somente será possível com a conclusão e publicação do relatório circunstanciado no Diário Oficial da União. III – Agravo de instrumento a que se nega provimento. (Grifei)
(AG 200901000403701, DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, TRF1 – SEXTA TURMA, e-DJF1 DATA:13/04/2012 PAGINA:1041.)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÕES DA FUNAI E DO MPF. PUBLICAÇÃO DE PORTARIA, EXPEDIDA PELO PRESIDENTE DA FUNAI, EM QUE CONSTITUIU GRUPO TÉCNICO PARA REALIZAÇÃO DE ESTUDOS DE REVISÃO DE LIMITES DAS TERRAS INDÍGENAS PILAD REBUÁ E LALIMA. FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL IMPETROU MANDADO DE SEGURANÇA PARA QUE SEUS REPRESENTADOS FOSSEM AVISADOS COM ANTECEDÊNCIA DA DATA DA VISTORIA NOS IMÓVEIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. O DECRETO Nº 1.775/96 NÃO PREVÊ QUE A FUNAI DEVA NOTIFICAR OS PROPRIETÁRIOS RURAIS. AUSÊNCIA DE NORMA LEGAL AUTORIZADORA E INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO, NA ESPÉCIE. REMESSA OFICIAL E APELAÇÕES PROVIDAS PARA AFASTAR A SEGURANÇA CONCEDIDA PELO JUIZ DA CAUSA. I – Rejeitadas as preliminares de irregularidade de representação processual e de ilegitimidade ativa da Federação/recorrida, o mesmo ocorrendo quanto à preliminar de ilegitimidade passiva da autoridade apontada como coatora, e de incompetência funcional e territorial trazidas pelo Ministério Público Federal. II – O Decreto nº 1.775, de 08/01/96, que dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas não prevê que a FUNAI deva notificar os proprietários rurais da data da realização dos estudos de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e fundiária, necessários à revisão de limites das terras indígenas Pilad Rebuá e Lalima, localizadas no Município de Miranda/MS, previstos na Portaria nº 158/2009 expedida pelo Presidente da FUNAI para esse fim. III – Somente por ocasião da demarcação das terras indígenas, momento posterior àquele descrito na noticiada Portaria é que os interessados poderão se manifestar nos autos do procedimento administrativo, conforme consta do art. 2º, § 8º, do Decreto nº 1.775/96. IV – Inexistência de direito líquido e certo da Federação/recorrida, a justificar a impetração do presente mandamus, e com relação aos princípios constitucionais da igualdade, ampla defesa e contraditório, devem ser observados no curso do processo administrativo, que ainda não foi instaurado em razão da sentença de procedência proferida pelo juiz da causa. V – Provimento da remessa oficial e dos recursos de apelação. (Grifei) (AMS 00026381420094036000, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, TRF3 – QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/05/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Por outro lado, a Constituição incumbe o Poder Executivo da realização dos referidos estudos, não podendo o Poder Judiciário avocar para si tal responsabilidade, em ações movidas por particulares, antecipando-se ao pronunciamento dos órgãos legalmente investidos de tais funções. Realizados os estudos, como dito, poderão os particulares questionar os seus resultados, tanto na esfera administrativa quanto na judicial.
Por fim, como bem asseverou o magistrado de primeiro grau (fls. 43/47):
(…)
Ao que consta nos autos, quando o processo administrativo foi suspenso havia despacho do Presidente da FUNAI decidindo pela sua remessa ao Ministro da Justiça (fls. 3316). Porém, não há notícia de que o processo encontra-se com esta autoridade.
Sabe-se, por outro lado, que o registro em cartório imobiliário da comarca onde está localizado o imóvel, ocorre somente após a homologação da demarcação da terra indígena, que não tem prazo estipulado no Decreto e tampouco é evento certo.
Com efeito, após o recebimento dos autos o Ministro poderá determinar sua demarcação, prescrever diligências ou até mesmo desaprovar a identificação e determinar o retorno dos autos ao órgão federal de assistência ao índio.
Subsiste, portanto, a r. decisão agravada.
Destarte, presentes seus pressupostos, admito este recurso, mas indefiro o efeito suspensivo.
Cumprido o disposto no art. 526 do Código de Processo Civil, intimem-se as agravadas para resposta, nos termos do inciso V, do art. 527, do Código de Processo Civil.
Dê-se vista ao Ministério Público Federal e, após, conclusos para julgamento.
São Paulo, 09 de agosto de 2014.
PAULO FONTES
Desembargador Federal