Alex Rodrigues – Repórter da Agência Brasil
No último dia 11, uma denúncia anônima de que um motociclista usando um capacete preto havia acabado de assaltar pessoas no centro de Palmeira dos Índios (AL) levou policiais militares a prenderem José Carlos Araújo Ferreira (foto). Abordado no interior da Terra Indígena Xukuru-Kariri, o suspeito estava em uma moto e portava um revólver com numeração raspada.
O que seria mais uma ocorrência criminal corriqueira logo passou a ser compartilhada pelas redes sociais como um caso de truculência policial e de tentativa de criminalizar os povos indígenas. Conhecido como Carlinhos, o preso é uma das principais lideranças indígenas de sua comunidade. Também é agente da Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde. Além disso, desde o ano passado, está inscrito no Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos (PPDDH), da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, ameaçado de morte.
Parentes de Carlinhos ouvidos pela Agência Brasil e representantes de organizações indigenistas argumentam como alguém com esse perfil poderia estar envolvido com assaltos. Policiais civis da delegacia de Palmeira dos Índios confirmaram que Carlinhos não está preso pela acusação de assalto, mas sim por porte ilegal de armas. Embora esteja detido em caráter temporário há 15 dias, o agente ainda não foi denunciado à Justiça. Até quinta-feira (24), nenhuma vítima de assalto compareceu à delegacia para registrar ocorrência, reconhecer o suposto assaltante ou reclamar pertences roubados.
“O Carlinhos é uma liderança respeitada que luta pela regularização de nossas terras. Por isso, ele vinha sendo ameaçado e está sendo injustamente acusado. É um agente da Sesai que garante assistência à saúde para toda a comunidade. Alguém que não tem e nunca teve nenhum envolvimento fora a luta de seu povo. Para nós, está claro se tratar de pura perseguição”, disse à Agência Brasil Gecinaldo Xukuru-Kariri, liderança indígena na região.
Segundo o advogado contratado pela família de Carlinhos, Isloany Nogueira Brotas, o próprio agente de saúde admitiu, ao depor, que costuma andar armado no interior da terra indígena, mas que o faz para garantir sua própria proteção e a de parentes. “Jamais o Carlinhos se envolveu em qualquer problema na cidade e foi em função das ameaças que recebeu que ele foi incluído no programa de proteção federal e se armou.”
Ainda de acordo com o advogado, não fossem pelas deficiências da Justiça alagoana, Carlinhos já estaria solto. Segundo ele, há tempos, Palmeira dos Índios não dispõe de juiz titular ou promotor de Justiça. Duas vezes por semana, autoridades de cidades próximas cumprem expediente na cidade para tentar solucionar os processos criminais que se acumulam. Havia a expectativa de que Carlinhos fosse solto na terça-feira (22), mas o promotor não compareceu à cidade.
Casado com uma prima de Ferreira, Antônio Graciliano Nicodemos de Lima diz que o líder indígena está respondendo bem à situação, mas que a família teme por sua segurança. “Na medida do possível, ele está bem. Sabe o que está acontecendo e por que ainda não foi solto. Já nós, que conhecemos a índole dele, estamos surpresos. Não entendemos como pessoas preparadas, que deveriam proteger a sociedade, podem prender alguém dessa forma, com base em uma história inventada. Enquanto isso, gente que realmente deve à Justiça está solta porque tem dinheiro ou influência.”
Ciente da prisão, a coordenação do Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos informou estar em contato com os órgãos estaduais competentes, lideranças indígenas e com o advogado de Ferreira para garantir que sejam observadas as diretrizes da política nacional de proteção. Pelo Estatuto do Desarmamento, o porte ilegal de arma é crime punível com penas de dois a quatro anos de prisão, que pode ser agravada quando a arma for adulterada. Carlinhos ainda não foi denunciado por nenhum crime.
Edição: Talita Cavalcante