Fabiana Mascarenhas – A Tarde
Quando saiu de casa, na última terça-feira, 15, a jornalista Lília de Souza, 34, só tinha um objetivo: renovar o passaporte. Jamais imaginou que, justamente nesse dia, passaria por um episódio que, segundo ela, lhe causou “um dos maiores constrangimentos” que já vivenciou.
No momento de fazer a foto para o passaporte, o sistema não permitiu o registro. A policial que a atendeu, explicou qual era o problema. “O seu cabelo é black power e o sistema não aceita a imagem. Terá que prendê-lo”, disse.
Lilian ainda insistiu para fazer a foto com o cabelo solto. A policial tentou algumas vezes, mas o sistema não permitiu. “Fiquei muito constrangida. Tive que prender meu cabelo com uma borracha daquelas de escritório, que eles arrumaram e me deram. Saí de lá arrasada”.
O episódio ocorreu na Polícia Federal do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC) do Salvador Shopping. Inconformada com a situação, a jornalista voltou ao local, depois de alguns minutos, para protestar.
“Procurei pelo coordenador, mas ele não estava. Conversei com duas policiais que disseram que isso sempre acontecia com pessoas com o cabelo como o meu”, afirma Lília, que, até então, não havia passado pelo problema.
“Há cinco anos, quando tirei meu passaporte, meu cabelo era bem menor do que hoje. Acredito que tenha sido por isso”, diz.
Lília enviou e-mail para a Ouvidoria da Polícia Federal, registrando o caso, e faz questão de deixar claro que foi bem tratada pelas policiais que a atenderam.
“O problema não foi o atendimento. Elas foram atenciosas e, na verdade, obedecem a regras. O sistema da PF é que é questionável, já que ignora completamente a etnia das pessoas”, afirma.
Sem retorno
A TARDE entrou em contato com a Polícia Federal, em Brasília, mas não obteve retorno até a publicação desta edição. No site do órgão, não há informações sobre os critérios e exigências para as fotos do passaporte.
Casos como de Lília podem ser comunicados ao Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela. A unidade está à disposição do público no edifício Brasilgás, localizado na avenida Sete de Setembro, no centro de Salvador. Denúncias também podem ser feitas pelos telefones 0800 284 0011 ou (71) 3117-7438.
Jornalista protesta em rede social. Leia a íntegra
Sistema da PF não aceitou meu cabelo black power para foto de passaporte
16 de julho de 2014 às 11:40
Quero denunciar o enorme constrangimento que passei ontem na Polícia Federal, no SAC do Salvador Shopping, ao renovar o meu passaporte. Cheguei às 9h da manhã, peguei uma senha extra e só fui atendida quase às 16h. Até aí, tudo bem. O motivo do meu constrangimento não foi a espera.
Quando finalmente fui atendida, na hora de fazer a foto para o passaporte, o sistema não aceitava de jeito nenhum a minha foto. Então a policial me disse que o problema era o meu cabelo. O meu cabelo é black power e o sistema não aceita a imagem. Fiquei muito constrangida. Eu ainda insisti em fazer a foto com o meu cabelo solto, ela tentou algumas vezes e o sistema não permitiu. Tive que prender meu cabelo com uma borracha daquelas de escritório, que eles arrumaram e me deram.
Cansada, depois de um dia em uma fila, saí de lá arrasada. E, assumo, impotente, chorei do lado de fora do SAC. Revoltada, voltei ao local depois de alguns minutos para protestar. O coordenador não estava. Conversei com duas policiais que disseram para mim que isso sempre acontecia com pessoas com o cabelo como o meu (não aconteceu comigo da primeira vez que fiz o passaporte, mas a bem da verdade à época meu cabelo não era black como é hoje).
As policiais falaram que eu não deveria me sentir daquele jeito e que não tinha nada a ver com racismo. Uma delas, entretanto, acabou soltando que o sistema é problemático mesmo, inclusive é complicado na hora de tirar fotos de pessoas muito negras, quando é preciso clarear um pouco a imagem.
Reparei que todas elas, inclusive a policial negra que conversou comigo, tinham cabelos super escovados. Já enviei email para a Ouvidoria da Polícia Federal. Espero que eles mudem esse sistema. Ainda estou meio confusa, não sei o que devo fazer, se devo ir à Justiça para denunciar todo esse constrangimento que passei. Mas aqui denuncio para que todos os meus conhecidos saibam do ocorrido. E se puderem levar a denúncia adiante, ficarei grata. Obrigada.
P.S.: Gostaria de ressaltar que não estou acusando as três policiais que me atenderam no SAC de racistas. Como disse, a policial que me atendeu, inclusive, tentou, mas não conseguiu. E aí me disse qual era o problema: o meu cabelo não era aceito pelo sistema. Estou denunciando que há algo errado nesse sistema por não ter aceito o meu cabelo do jeito que ele é. Só para ficar claro.
–
Enviada para Combate Racismo Ambiental por Ruben Siqueira.
Não tem nada a ver com racismo. Todo mundo sabe que nas fotos para documentos, o rosto precisa aparecer completamente (do topo da testa ao queixo). Normal. Uma pequena tiara resolveria o problema da moça. Um abraço.