Presidente da Funai se reúne com indígenas Tenharim na aldeia Marmelos

O secretário municipal de Povos Indígenas de Humaitá, Ivanildo Tenharim. Foto: Arquivo pessoal
O secretário municipal de Povos Indígenas de Humaitá, Ivanildo Tenharim. Foto: Arquivo pessoal

Por Elaíze Farias, em Amazônia Real

A presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), Maria Augusta Assirati, reuniu-se com índios na aldeia Marmelos,  na Terra Indígena Tenharim-Marmelos na última sexta-feira (07) para discutir sobre projetos de sustentabilidade e de geração de renda. A terra indígena está localizada entre os municípios de Humaitá e Manicoré, no sul do Amazonas.

Maria Augusta Assirati ficou durante sete horas com indígenas tenharim e jahui no centro cultural instalado dentro da aldeia Marmelos. Cerca de 500 indígenas tenharim e jiahui ocuparam o centro cultural durante a reunião.

Foi a primeira vez que a presidente da Funai esteve na Terra Indígena Tenharim-Marmelos desde que os conflitos entre os tenharim e as populações não-indígenas das cidades de Humaitá, Apuí e distrito de Santo Antônio do Matupi explodiram após o desaparecimento de três homens dentro da aldeia Taboca. A população acusava os indígenas de serem os responsáveis pela morte dos homens.

Após investigação, a Polícia Federal concluiu que cinco indígenas mataram Stef Pinheiro, Luciano Freire e Aldeney Salvador em dezembro passado. Os indígenas  Gilvan Tenharim, Gilson Tenharim, Domiceno Tenharim, Valdinar Tenharim e Simeão Tenharim estão presos no Centro de Ressocialização do Vale do Guaporé, em Rondônia, desde o final de janeiro.

Segundo Ivanildo Tenharim, Maria Augusta Assirati chegou na aldeia em um helicóptero do Exército, proveniente de Porto Velho (RO). Ela foi acompanhada de dois militares: o comandante da 17ª Brigada de Infantaria de Selva, general André Luiz Novaes Miranda, e do Tenente-Coronel Márcio de Góis Alvesdo 54º BIS (Batalhão de Infantaria de Selva), com sede em Humaitá.

“Apresentamos nossas propostas porque ficamos sem renda desde que deixamos de cobrar a taxa na estrada”, disse Ivanildo ao Amazônia Real, referindo-se ao pedágio considerado ilegal cobrado pelos índios na BR-230 (Transamazônica). Sem a renda do pedágio, a maioria das famílias está sobrevivendo do benefício do bolsa família.

Um dos projetos apresentados a Maria Augusta Assirati na reunião de sexta-feira foi a retomada da atividade de pesca esportiva praticada por turistas para gerar renda nas aldeias. A pesca esportiva acontecia desde 2005 em uma área do rio Marmelos, nos meses de julho e agosto, mas foi suspensa em 2012. “A empresa responsável pela atividade não queria mais pagar o que havia se comprometido”, disse Ivanildo Tenharim.

A pesca esportiva é um dos tantos projetos propostos pelos tenharim e jiahui como alternativa de renda desde que a terra indígena foi impactada por atividades como retirada ilegal de madeira e, especialmente, como resultado da construção da Transamazônica. Ele fez parte de um relatório elaborado por uma antropóloga a pedido dos tenharim e encaminhado à Funai há alguns anos. A pesca esportiva vinha sendo realizada, mas sem o licenciamento ambiental do Ibama, apesar do pedido feito pelos indígenas.

“A Funai apenas nos dava uma autorização anual, mas nunca tivemos licenciamento. Agora, nesta reunião, a gente pediu à presidente da Funai que ela agilize esse licenciamento junto ao Ibama. Queremos que a atividade ocorra três vezes ao ano e não apenas em julho e agosto”, disse Ivanildo.

Para não depender apenas da pesca esportiva, os indígenas propuseram à Funai a construção de uma pousada nas proximidades de uma corredeira do rio Marmelos que pode ser utilizada por turistas. Os rendimentos seriam geridos pelos próprios indígenas, por meio de sua associação, sem a intermediação de empresas.

Cientes de que a viabilização de tais projetos não será a curto prazo, os tenharim e jiahui solicitaram outras formas de geração de renda, como a contratação de mais indígenas nos serviços do PrevFogo, do Ibama, atividade que funciona em operação de combate à queimadas na área, além de aumento nos valores do bolsa família, sobretudo entre as famílias onde não há indígenas que trabalham como professor ou agente de saúde.

Conforme Ivanildo, os indígenas acordaram com a presidente da Funai o seguinte: a cobrança do pedágio continua suspensa por mais quatro meses e, neste ínterim, o órgão deve encaminhar periodicamente informações sobre como os projetos estão sendo encaminhados. Uma comissão formada por quatro indígenas tenharim e dois jiahui, incluindo Ivanildo, vai acompanhar o andamento.

“Sabemos que não será rápido. Por isso vamos acompanhar de perto. Suspendemos o pedágio para termos diálogo. Nesses quatro meses, a partir da visita da presidente da Funai, não vamos cobrar nada. A Funai se responsabilizou de articular com outros órgãos, como o Ibama e o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Do MDA queremos encontrar formas de vender nossas atividades extrativistas, como é o caso da castanha”, afirmou.

Maria Augusta Assirati já havia se reunido com um grupo de indígenas tenharim em Manaus, no dia 10 de fevereiro. A reunião aconteceu na sede do Programa Waimiri-Atroari e não na sede da Funai na capital amazonense.

Amazônia Real entrou em contato na sexta-feira (07) com a assessoria de imprensa da Funai para obter informações sobre a ida da presidente do órgão a TI Tenharim-Marmelos, mas não obteve resposta. Voltou a reiterar o pedido de informações nesta segunda-feira (10), novamente sem retorno.

Rotina

Ivanildo Tenharim deu a entrevista ao Amazônia Real fora da aldeia Marmelos, de celular. O telefone orelhão que funciona na aldeia (o único da terra indígena) continua bloqueado para receber chamadas.

Secretário Municipal de Povos Indígenas de Humaitá, ele saiu da aldeia sozinho, sem escolta, de carona em um veículo da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) que fazia atendimento nas aldeias e que estava atolado na estrada devido a cheia do rio Madeira. Viajou até um determinado trecho da Transamazônica. Devido à alagação da rodovia por causa da cheia, Ivanildo seguiu a viagem em uma voadeira.

Ainda temeroso com a reação dos moradores das cidades vizinhas, ele pediu à reportagem para não revelar sua localização, embora reconheça que o clima hostil contra os indígenas venha diminuindo. “Estive algumas vezes em Humaitá e percebi que a situação está se normalizando. O problema continua em Matupi, onde as pessoas mandam recado, dizem que continuam com raiva da gente”.

Ivanildo contou que a Força Nacional de Segurança, que foi enviada no início de janeiro para impedir aumento do conflito, também já saiu da terra indígena. Atualmente, há apenas duas viaturas da Polícia Rodoviária Federal e “alguns soldados do Exército”, que permanecem nas proximidades da região de Matupi.

A rotina dos indígenas também, aos poucos, começa a ser como antes. Os alunos do ensino fundamental e médio que estudam nas escolas das aldeias vão iniciar as aulas. Os estudantes (10, no total) da Universidade Estadual do Amazonas (UEA) vão iniciar o período letivo em um cronograma especial estabelecido pela instituição. O mesmo não se pode dizer dos três alunos da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). “Eu e mais dois alunos da Ufam ainda não sabemos como será nosso próximo período. A Ufam ainda não informou”, disse Ivanildo, que estuda Pedagogia. Dois primos seus fazem Engenharia Ambiental e Química e Biologia.

Indagado sobre como as aldeias estão acompanhando a situação dos cinco indígenas tenharim presos, Ivanildo afirmou apenas que as famílias deles vão toda semana visitá-los e que aguardam as medidas tomadas pela defensoria pública.

Desde que assumiu a defesa dos cinco índios no início de fevereiro, a Defensoria Pública da União (DPU) prepara o habeas corpus para tentar, na justiça federal, tirar os indígenas da prisão. O Amazônia Realapurou que a DPU deverá tomar a medida nesta semana.

No final de fevereiro, a Justiça Federal seguiu manifestação do Ministério Público Federal e prorrogou por mais 30 dias a prisão temporária dos indígenas. A Polícia Federal havia pedido prisão preventiva.

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