Nota pública da Anaí sobre as agressões sofridas pelos Tupinambá e o processo de regularização do seu território

logo ANAÍA Associação  Nacional de Ação Indigenista (ANAI) vem a público posicionarse sobre o grave conflito que opõe os Índios Tupinambá do Sul da Bahia aos não Índios que,  há  longos  anos,  usurparam  as  suas  terras  e  que,  na  tentativa  de  prosseguir usurpando-as, apelam para distintas e violentas estratégias de intimidação, para o que se têm utilizado de veículos jornalísticos.

Uma larga documentação histórica e etnológica, assim como a forte tradição oral dos  Tupinambá  comprovam  o  seu  estabelecimento  na  região  desde  o  início  da colonização  brasileira, assim como as investidas para desalojá-los, sem sucesso mas às custas de grande mortandade,  no âmbito da chamada “Guerra dos Ilhéus”.    A todas as investidas  eles  resistiram  e,  hoje,  estão  dando  o  basta  ao  esbulho,  intimidações  e processos discriminatórios a que têm sido submetidos. Eles são Índios Tupinambá e não “bandidos que se dizem índios”, “pretensos índios”, como são referidos pelo jornal A Região  em sua edição de 31 de agosto do ano corrente. Quem afirma tratar-se de  Índios Tupinambá  são  eles  próprios,  profundos  conhecedores  de  sua  história,  e  um  conjunto significativo  de  antropólogos,  competentes  e  éticos,  cujas  dissertações  de  mestrado  e teses  de  doutorado  sobre  eles  produzidas  foram  aprovadas  por  respeitadas universidades, nacionais e estrangeiras, após rigorosas arguições.

Um  desses  antropólogos  é  a  Dra.  Susana  Viegas,  ademais  autora,  juntamente com o também antropólogo Jorge Luiz de Paula, do “Relatório Final Circunstanciado de Identificação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença”. Deve ser a  este Relatório  –largamente  documentado,  dos  pontos  de  vista  histórico  e  etnológico,  e  elaborado  de acordo com inquestionáveis, e sistematicamente explicitados, procedimentos teóricos e metodológicos  —  que  o  mesmo  jornal  A  Região  busca,  de  forma  oblíqua,  atingir,  ao aludir a “relatórios que até o governo federal suspeita  que sejam fraudulentos” (31 de agosto de 2013). Trata-se de uma afirmação grave, que atenta contra a honorabilidade, pessoal e profissional, de dois antropólogos,  e,  através deles, contra a comunidade de antropólogos brasileiros,  e  contra, igualmente, o governo federal, através da FUNAI e do Ministério da Justiça.

Afirmação igualmente grave lança, o mesmo veículo, contra os procuradores do Ministério Público Federal  que atuam na região, ao acusá-los de tomar partido contra “os  supostos  índios  tupinambás”,  por  classificarem  como  anti-indígenas  as manifestações contra eles promovidas na região.

Tratam-se,  inquestionavelmente,  de  manifestações  anti-indígenas  os  atosdescritos  pelo  mesmo  veículo  como  “O  “troco”  dos  agricultores  pela  invasão  e destruição  de  fazendas”,  ou  seja,  “Várias  casas  de  “pretensos  índios”  invadidas  e  os móveis  incendiados.  As  casas  só  escaparam  por  medo  de  que  o  incêndio  atingisse  os vizinhos”;  incêndio  de  carros  oficiais;  saques  contra  a  Cesta  do  Povo,  uma  agência bancária  e  uma  loja  (A  Região,  31  de  agosto).   Mas  há  mais,  que  A  Região, convenientemente  para  os  seus  propósitos,  omite:  há  um  cerco  impiedoso  contra  os Tupinambá, que não respeita sequer os limites de uma universidade pública, a exemplo da  respeitada  UESC, em cujas dependências –  um corredor da instituição  —  uma aluna tupinambá foi abordada por uma não índia, que ameaçou dar-lhe um tiro na testa, ao tempo em que bradava que todos os índios devem morrer.

Exemplos  de  sentimentos  e  práticas  anti-indígenas  repetem-se,  na  região  sul  e extremo-sul da Bahia, sob a complacência dos governantes e de parcela ponderável da chamada  sociedade  civil  que,  mediante  o  seu  silêncio  ou  a  sua  ação,  se  acumpliciam com  as  forças  retrógadas  remanescentes  do  coronelismo  e  mandonismo  locais,  e  não querem  admitir  que  os  tempos  mudaram  e  que  os  povos  indígenas,  assim  como  os negros, nos contextos urbano e rural, e os pobres de variada extração sócio-racial, estão reivindicando os seus direitos, o mais fundamental dos quais é o direito à Terra.

A ANAI não tem dúvidas de que os conflitos que vêm ocorrendo no sul da Bahia anunciam um desfecho trágico, que já está em processo, e que só poderá ser alterado mediante  a  assinatura,  pelo  Ministro  da  Justiça,  José  Eduardo  Cardozo,  da  portaria declaratória  da  Terra  Indígena  Tupinambá.  Para  isso  a  ANAI  supõe  fundamental  a intercessão  do  governador  do  estado  da  Bahia,  Jacques  Wagner,  a  quem  se  atribui articulação com vistas à protelação  da referida assinatura, em face da sabida e crescente ingerência,  hoje,  na  política  indigenista  brasileira,  por  parte  dos  governadores  dos estados da federação.

Salvador, 02 de setembro de 2013

Associação Nacional de Ação Indigenista (ANAI)

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