Por Elaíze Farias
O Exército acatou recomendação do Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) e aceitou os termos do acordo para a regularização fundiária da comunidade São Francisco do Mainã, na zona rural de Manaus. As condições do acordo foram definidas em reunião realizada nesta quinta-feira (27), na comunidade.
A comunidade fica localizada na área do Centro de Instrução de Guerra na Selva (Cigs). Devido à falta de entendimento entre a comunidade e o Exército, os moradores ficaram vários anos sem direito a políticas públicas, como rede elétrica do Luz para Todos.
Com a decisão, os moradores vão receber da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) um termo de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) coletivo, que oficializará a posse das terras tradicionalmente ocupadas pelos ribeirinhos perante a União. A assinatura e entrega do documento foram marcadas para o próximo dia 20 de julho, na comunidade.
Na presença do procurador-chefe da Advocacia-Geral da União no Amazonas (AGU), Allan Carlos Moreira Magalhães, do procurador da República Julio José Araujo Junior, do superintendente da SPU no Amazonas, Silas Garcia Aquino de Sousa, e dos comunitários, representantes do Exército fizeram a leitura integral do requerimento a ser assinado pelos moradores e detalharam cada uma das regras de convivência estabelecidas em comum acordo entre militares e comunitários, durante as reuniões realizadas.
Entre as principais definições do documento constam a concessão coletiva do direito sobre a área, a dispensa de autorização para pesca no igarapé Mainãzinho pelos comunitários, a proibição de realização de treinamentos do CIGS com munição real na área de São Francisco do Mainã, a previsão da transmissão do direito de ocupação das terras aos descendentes diretos dos atuais moradores tradicionais da comunidade e a formalização de compromisso de não oposição, por parte do Exército, da inclusão da comunidade em políticas públicas, como o Programa Luz Para Todos.
Os termos do acordo final para a regularização fundiária da comunidade foram estabelecidos a partir da mobilização dos comunitários e de processo de negociação mediado pelo pelo MPF/AM, o qual resultou na expedição de recomendação no início da semana, que tomou como base os entendimentos firmados entre os comunitários, o Exército – que exerce o domínio da área onde está situada a comunidade, por meio do CIGS – e a Superintendência da SPU no Amazonas, em reunião realizada em abril deste ano.
Pequenas modificações sugeridas em nova reunião realizada na manhã desta quinta-feira (27), na sede da comunidade, serão acrescentadas ao texto final.
Modelo participativo
O procurador da República Julio Araujo ressaltou o caráter participativo da construção do termo, o que torna este caso singular, pois a comunidade pôde recusar um formulário previamente elaborado e apresentar suas demandas, as quais, após muitas discussões, foram atendidas pelo Exército.
Ele disse ainda que esse modelo de negociação deverá ser adotado para buscar a regularização das comunidades Jatuarana e Santa Luzia do Tiririca, que também estão instaladas em área de domínio do Exército, na região do Puraquequara.
“O MPF no Amazonas está acompanhando todas essas discussões para garantir o respeito às leis e aos direitos das comunidades tradicionais que pretendem ver seus direitos respaldados. É importante que o entendimento seja construído de forma democrática entre as partes”, declarou.
O chefe do Comando Militar da Amazônia (CMA), general de brigada José Luiz Jaborandy Junior, informou que a partir da próxima semana, uma equipe do Exército levará até a comunidade os requerimentos de adesão à CDRU coletiva para assinatura pelos moradores, acompanhados de membros da associação comunitária.
“Até a data da assinatura e entrega do documento oficial, todos os moradores de São Francisco do Mainã deverão ter assinado o requerimento”, completou o superintendente da SPU/AM, Silas Garcia.
Entendimento
Para o presidente da Associação Comunitária do São Francisco do Mainã, a realização de um acordo amplamente discutido com os comunitários e todas as partes interessadas é a concretização de um importante passo rumo ao reconhecimento dos direitos das comunidades tradicionais.
“O que nós sempre buscamos é justamente esse entendimento justo para todas as partes. Não queremos criar empecilhos para ninguém. Há mais de 40 anos esperamos pelo momento de resolver esse problema e agradecemos por essa abertura de diálogo que trouxe a esse entendimento”, disse.
* A partir de release da assessoria de imprensa do MPF/AM.
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Elaíze Farias – Povos Indígenas, Comunidades Tradicionais e Questões Amazônicas.