Leonardo Sakamoto
Fernando Haddad perdeu uma excelente oportunidade para revogar o aumento nas passagens dos ônibus na capital paulista na manhã desta terça (18). Praticamente todos os membros do Conselho da Cidade que se manifestaram na reunião extraordinária, convocada pelo prefeito para discutir o transporte público, defenderam a revogação imediata. E o estabelecimento de uma ampla discussão pública sobre o financiamento e a qualidade do sistema.
Haddad afirmou que o aumento nos subsídios pagos às empresas de ônibus, decorrente de um congelamento na tarifa, causaria impactos em outros setores, como educação e saúde. Prometeu seguir conversando com o Movimento Passe Livre, que defendeu suas posições contra o aumento na reunião, e afirmou que vai refletir sobre o orçamento.
Traduzindo: o prefeito quer dialogar mantendo a passagem a R$3,20 e os manifestantes que tomaram as ruas na noite desta segunda e os conselheiros querem a discussão, mas com uma tarifa a R$ 3,00.
O prefeito perde uma chance ótima de revogar o aumento, contando com a demanda popular de mais de 100 mil pessoas que foram às ruas e com o apoio do Conselho da Cidade. Ermínia Maricato, Maria Alice Setúbal, Luiz Carlos Bresser Pereira, Raquel Rolnik, Jorge Abrahão, Vagner Freitas, Marcos da Costa, conselheiros dos mais diversos setores sociais defenderam a revogação.
O órgão, de caráter consultivo e não deliberativo, formado por representantes de movimentos sociais, sindicatos e associações empresários, além de intelectuais, artistas, políticos, lideranças religiosas e jornalistas, tem o objetivo de acompanhar o plano de metas da atual gestão, analisar a revisão do plano diretor, entre outros temas a serem escolhidos pelos conselheiros.
Ou seja, Haddad poderia, com o apoio popular e da sociedade civil, aproveitar o momento e ir contra a caixa preta que é o transporte público na cidade. A verdade é que boa parte das contas desse setor é uma incógnita. Conselheiros presentes reivindicaram que as planilhas de custo sejam disponibilizadas ao público – tanto desta quanto das administrações municipais anteriores. E que aproveitemos este momento de renovação dos contratos com essas mesmas empresas para rever valores e contrapartidas, além de fazer audiências públicas com visibilidade. Acrescento aqui que seria salutar publicizar os balanços das empresas em que as planilhas se baseiam. A fim de garantir, por exemplo, que dinheiro público não flua para quem apresenta prejuízo contábil e força subida de tarifas.
Esta não é uma discussão técnica e sim política. É uma decisão sobre onde serão alocadas os recursos pagos pelo contribuinte. Significa tirar de um lado e pôr no outro, claro. Mas também taxar ainda mais o transporte individual motorizado, que polui e engasga a mobilidade urbana, cria problemas para a saúde dos moradores da metrópole e impede, ao ser escolhido na balança de prioridades, o investimento pesado no transporte coletivo.
Recuo não é derrota, ainda mais em democracias. Da mesma forma que eleições não significam carta branca. Programas podem receber melhorias a pedido da população. População que deveria participar mais das decisões sobre o que se faz com o dinheiro da cidade.
Haddad foi instado a reduzir o preço da passagem de ônibus. Alckmin, de trens e metrô. Torcem para que uma decisão tomada no Planalto ou gestada no Congresso Nacional resolva o problema dos dois – afinal, o governo federal deveria se preocupar mais com a pauta, uma vez que distribui bilhões para financiar a compra de automóveis.
É uma jogada de risco.
Até porque, o primeiro dos dois que baixar a tarifa, torna – automaticamente – a vida política do outro um inferno.
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Enviada por José Carlos para Combate Racismo Ambiental.