Índios reivindicam terras sob disputa em MS desde 1930

Noel Patrocínio, filho de um dos terenas que viajaram ao Rio de Janeiro nos anos 1930
Noel Patrocínio, filho de um dos terenas que viajaram ao Rio de Janeiro nos anos 1930

Fabiano Maisonnave – Folha de S.Paulo

Enviado especial a Sidrolândia (MS)

Uma comitiva de índios terenas da região de Sidrolândia (70 km de Campo Grande) viajou à capital federal para exigir ampliação de terras. A notícia parece de agora, mas apareceu na imprensa carioca em 1930.

Um dos três integrantes da viagem ao Rio de Janeiro foi André Patrocínio, pai do professor aposentado Noel Patrocínio, 81. Ele é morador da aldeia Buriti, a maior comunidade da área indígena de 2.090 hectares demarcada nos anos 1920, hoje com cerca de 5.000 pessoas.

“O cacique disse ao meu pai: ‘O governo mediu uma terra muito pequena, não dá para nós'”, conta Patrocínio.

A aventura não foi bem-sucedida. “Não conseguiram falar com o chefão. A vida política tem hoje seus momentos de turbulência. Imagina naquela época.”

Segundo o coautor da perícia judicial sobre a área em disputa, o antropólogo Jorge de Oliveira, a capital estava em plena Revolução de 1930. “A viagem saiu em um jornal da época, porém em um tom um pouco jocoso.”

Essa perícia, assinada também pelo antropólogo Levi Pereira, foi iniciada em 2003 a pedido da Justiça e concluiu que os 17 mil hectares reivindicados pelos terenas são terra indígena. A decisão em primeira instância foi favorável aos fazendeiros, mas o caso continua na Justiça.

Os terenas têm presença antiga na região e, historicamente, buscaram se aproximar do homem branco. É o grupo com maior população fora de aldeias –9,6 mil, segundo o IBGE. Corresponde à quinta maior etnia do país, com 29 mil integrantes.

Só em Campo Grande, há sete “aldeias urbanas”, áreas com maior concentração da etnia. Ali, é comum vê-los trabalhando em frigoríficos.

“O que diferencia o terena é o intenso contato com o mundo não indígena e a aliança com outros povos. Apesar disso, consegue manter seus elementos culturais mais fortes, como a língua, a dança e a atividade agrícola”, explica o doutor em história Wanderley Cardoso, que hoje ensina na sua aldeia natal, em Aquidauana (MS).

Guerras

O historiador da Guerra do Paraguai (1864-1870) Francisco Doratioto diz que os terenas foram um dos grupos que se aliaram ao Exército brasileiro. Ele cita o escritor Visconde de Taunay (1843-1899), que os descreveu como “índios mansos, amigos, aliados”.

O envolvimento dos terenas com os militares se estendeu até a Segunda Guerra Mundial, quando vários deles lutaram na Europa como pracinhas da Força Expedicionária Brasileira.

Apesar dos vários registros, os fazendeiros da região dizem que os terenas não são do território brasileiro.

“São paraguaios. Uns alegam que lutaram a favor do Brasil, mas eu não acredito”, afirma Marcos Correa, 33, dono de 3.480 hectares dentro da área reivindicada.

Compartilhada por Jorge Eremites de Oliveira.

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