João Valadares, no Correio Braziliense
A Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro vai convocar, ainda este mês, o general da reserva José Antônio Nogueira Belham para depor. A informação foi confirmada, na tarde de ontem, pelo presidente do colegiado, Wadih Damous. Belham, que pode se recusar a comparecer, comandou o DOI-Codi do Rio na época em que o ex-deputado federal Rubens Paiva foi assassinado, em 1971, depois de ter sido preso e levado para o departamento. O corpo nunca apareceu. Documentos em poder da Comissão Nacional da Verdade atestam que o militar da reserva recebeu dois cadernos de anotação que pertenciam a Paiva.
O Correio revelou, na edição de domingo, que o general da reserva é pai do atual número 2 da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Ronaldo Martins Belham, que tem acesso privilegiado a informações sobre o período militar brasileiro. Paulo Vannuchi, ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos no governo Lula, eleito recentemente membro da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), defendeu que a questão precisa ser analisada com extrema cautela. “O importante é a luz que a imprensa jogou nesse caso. O debate gerado após a divulgação do fato é bastante relevante. Eu concordo com a preocupação das entidades”, afirmou.
Vannuchi fez questão de salientar que os filhos não podem ser responsabilizados pelos atos dos pais. “Precisamos também deixar claro que o fato de ser filho de um agente da repressão não o torna um torturador. A cobrança precisa ser feita com muita cautela. Há uma suspeição presumida”, afirmou.
No entanto, a coordenadora da Comissão da Memória, Verdade e Justiça da Câmara, deputada Luiza Erundina (PSB-SP), classificou de “inadmissível” e “incompreensível” a permanência de Ronaldo Martins Belham em uma posição de destaque na Abin. “Pela natureza do cargo que ocupa, não consigo compreender como ele pode exercer essa função, mesmo que não tenha nenhuma relação com os atos cometidos. Não se trata disso. A pessoa precisa ser isenta. É inaceitável e inadmissível, pelo caráter do órgão que ele representa. O simbolismo disso é muito forte”, avaliou. A parlamentar justificou a posição alegando que, mesmo que os documentos da época tenham sido encaminhados ao Arquivo Nacional pela Abin, várias informações ainda não foram descobertas.
“Eu, no lugar dele, me sentiria desautorizada. Existe muita verdade a ser revelada ainda. Há muitas fontes que não chegaram nem ao conhecimento da Abin. Que liberdade esse homem tem se ele receber, pelo cargo que ocupa, informações que ajudem a compreender o caso Rubens Paiva? Ele terá autonomia para avaliar os dados? Não pode. Temos que ser intransigentes em relação a isso”, afirmou Erundina.
O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) afirmou que há uma “perseguição” de militares no Brasil por parte da esquerda petista. “É uma perseguição canalha. Vocês deveriam ir atrás das informações sobre o grupo terrorista que a presidente Dilma Rousseff integrava. Esse grupo matou, roubou e sequestrou. Isso é crime. O problema é que o cara leva um cascudo e dizem que é tortura”, alegou.
Afastamento
No domingo, por meio de nota, Wadih Damous, que além da Comissão Estadual da Verdade do Rio preside a Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), também havia pedido o afastamento do diretor adjunto da Abin. Ontem, ele ratificou a posição. “O general da reserva vai ser convocado, sim, porque ele chefiou o DOI-Codi aqui no Rio de Janeiro. Estamos preparando os depoimentos para este mês e o início de julho. Eu defendo que não podemos estigmatizar o filho dele, mas é evidente que existe uma suspeição nesse caso. Existe, no mínimo, uma inconveniência”, ressaltou.
O Correio tentou falar com o general da reserva Belham, mas uma mulher que atendeu o telefone dele disse que o militar está viajando. O filho, Ronaldo Belham, também foi procurado por meio da assessoria da Abin, mas não atendeu a reportagem.
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Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.