“Ainda existem outras torturas no Brasil”

Dulce Pandolfi em depoimento na Alerj. Foto: Divulgação / Alerj
Dulce Pandolfi em depoimento na Alerj. Foto: Divulgação / Alerj

Camila Nobrega
Do Canal Ibase

Em tempo de denúncias de uma série de violação de direitos humanos no Rio de Janeiro e em todo o Brasil, os depoimentos da ex-diretora do Ibase e historiadora Dulce Pandolfi e da cineasta Lucia Murat à Comissão da Verdade do Rio soam como um alerta. As duas foram ouvidas nesta terça-feira (28/05) pela comissão, que tem como objetivo investigar violações ocorridas no período de 1946 a 1988. As falas foram as primeiras da série Testemunho da Verdade, realizada na Assembleia Legislativa do Rio  (Alerj) e, embora se refiram a um momento histórico específico, trazem luz para acontecimentos em curso no país.

Essa é a opinião de Dulce Pandolfi, que concedeu entrevista pelo telefone nesta quarta-feira, ainda emocionada:

–  No Brasil, naturalizamos muitas violações a nossos direitos. São muitos desrespeitos à cidadania, para além da tortura. Muitas formas de torturas ainda existem no país, como, por exemplo, no sistema carcerário e em comunidades. E a população não se mobiliza, encara como natural.

A historiadora disse esperar que seu depoimento e o de Murat possam ajudar a  sociedade a não só entender o passado e como a refletir sobre o presente. Como o tema infelizmente ainda está muito atual, Dulce comemorou a presença de um número significativo de jovens no auditório da Alerj.

Durante o depoimento, Dulce lembrou a trajetória de luta como militante no DCE de Ciências Sociais, em Pernambuco, e depois na Aliança Nacional Libertadora (ANL), já no Rio de Janeiro, no início dos anos 1970. Foi nesta época que, aos 21 anos, foi presa e levada para o quartel da Barão de Mesquita, na Tijuca, por agentes do Doi-Codi. Lá permaneceu por seis meses, dos 16 que ficou presa, e sofreu todo o tipo de tortura.

– Creio que o papel dos nossos depoimentos é trazer à tona para a sociedade brasileira casos que até então não eram conhecidos com detalhes. É preciso desvendar o que ocorreu durante o regime militar, porque há gente desaparecida até hoje. O que será feito a partir daí depende da mobilização da sociedade

Ao final de seu depoimento, ela parafraseou um conhecido artigo de Émile Zola, “J’acuse”, publicado no jornal L’Aurora em 1898: “Finalmente, eu acuso o regime ditatorial implantado no Brasil em 1964, que fez da tortura uma política de Estado”.

O depoimento de Dulce foi transcrito e disponibilizado pela Alerj. Você pode acessá-lo na íntegra na biblioteca do Ibase no Issuu.

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