Bombas de fragmentação: o Brasil com mãos sujas de sangue inocente

Fonte: http://goo.gl/JGJAd

Por Renato Guimarães, em SustentaNews

As bombas de fragmentação, também conhecidas como “clusters”, que se desfazem no ar em mini-bombas e se espalham por grandes áreas podendo ficar inertes no solo por anos, são uma das armas mais covardes criadas pela humanidade. Foram usadas em 2006, por exemplo, pelo exército israelense na invasão do sul do Líbano e acredita-se que dos 4 milhões de artefatos lançados, cerca de 1 milhão não explodiu. Ficaram ainda no solo libanês, transformado em um campo minado gigante. Quem mais sofre com isso é a população civil e dentre eles, os mais pobres, principalmente agricultores e crianças.

Desde os anos 1990 existe uma campanha global capitaneada pela ONU e ONGs internacionais para banir a fabricação, comércio e uso deste tipo de bomba. A campanha chegou a seu auge em 2008 com a adoção, por 111 países, da Convenção sobre as Munições Cluster (Convention on Cluster Munitions – CCM). O Brasil decidiu se posicionar do lado errado desta luta e não aderiu até hoje a CCM, apesar de tê-lo feito anos antes com a Convenção de Otawa, que baniu a fabricação e comercialização de minas terrestres.

Mas o que levou o Brasil a dotar uma posição tão incoerente?

Em primeiro lugar o Brasil é fabricante e exportador de bombas de fragmentação. Pelo menos três empresas brasileiras de armamentos, com fortes vínculos com o aparato militar, produzem ou produziram recentemente bombas de fragmentação para exportação. Segundo o Landmine and Cluster Munition Monitor, a empresa Avibras Aerospacial, por exemplo, produziu  foguetes terra-terra da família ASTROS equipados com ogivas (ou “cabeças de guerra”) equipadas com bombas de fragmentação. A empresa declarou em 2010 lucros na casa entre 60 e 70 milhões de dólares exportando este tipo de bomba.

Como funcionam as bombas de fragmentação. O nível de falha das mini-bombas varia bastante. E um número significativo permanece no solo, atuando na prática como minas terrestres

Mas oficialmente a desculpa para não aderir ao tratado foi a proteção da “segurança nacional”, uma explicação cínica e que abusa da inteligência das pessoas. Primeiro porque não se conhecem ameaças estrangeiras ao território nacional. Segundo, porque este tipo de bomba dificilmente seria usada internamente já que ela produz na prática enormes extensões de terra minada

Voltamos, então, aos interesses econômicos e políticos, que tornam a decisão do governo brasileiro ainda mais suja e indefensável. Segundo relatório sobre o Brasil do Landmine & Cluster Munition Monitor, países que compraram bombas de fragmentação fabricadas pelo Brasil incluem Irã, o Iraque, Arábia Saudita e Malásia.

Em 2011, a Folha de São Paulo revelou, com base na Lei de Acesso à Informação, que o Brasil havia exportado, em 2001, quase 6 milhões de dólares em bombas de fragmentação e incendiárias para o governo ditatorial do Zimbábue, na época controlado por uma ditadura particularmente cruel com a  oposição.

Existem tentativas no Congresso de impedir a fabricação e comércio de bombas de fragmentação, que não prosperaram até o momento. Um projeto apresentado em 2009 pelo então deputado federal Fernando Gabeira foi arquivado. O relator que rejeitou a proposta foi o notório Deputado Jair Bolsonaro, alegando interesses de segurança nacional. Um novo projeto foi apresentado em 2012 pelo deputado Rubens Bueno, mas avançou pouco até o momento.

Pode-se falar isso sobre qualquer tipo de arma, mas com relação à fabricação, comércio e uso de bombas de fragmentação não tem jeito: quem participa deste “negócio” – em qualquer de suas etapas – tem as mãos sujas de vidas inocentes. Participa de assassinatos, contribui para a perpetuação de ditaduras diversas (maiores compradoras deste tipo  bomba), são cúmplices do mal.

Está na hora de o Brasil sair de sua posição covarde e tomar uma atitude de país sério, posicionando-se do lado das 111 nações que já aderiram à Convenção sobre as Munições Cluster.

Aqui o site da Convenção sobre as Munições Cluster com o texto da Convenção e a lista dos países que já aderiram.

Aqui o website da Cluster Munition Coalition com muita informação sobre o tema, incluindo histórias reais do impacto destas bombas na vida dos civis e campanhas de pressão sobre os governos que ainda não aderiram à CCM.

O website do Landmine and Cluster Munition Monitor é fonte essencial de informação sobre o tema e traz relatórios de todos os países relevantes. O perfil do Brasil pode ser visto aqui.

Aqui, reportagem recente da Deutshe Welle sobre o tema.

Em geral, não gosto de usar imagens fortes para ilustrar meus textos, especialmente quando envolvem crianças. Mas no caso deste tema é impossível não expor as consequências reais e concretas das bombas de fragmentação na vida das pessoas. As fotos abaixo são do website da Cluster Munition Coalition e da Norwegian People’s Aid.

Abdullah Yaqoob – vítima de bomba de fragmentação
Zahra – vítima de bomba de fragmentação
Sra. Chanhthava – Vítima de bomba de fragmentação
Dtar, do Laos. Encontrou uma boma de fragmentação não detonada e sem saber como funcionava explodiu-a em um rio para matar peixes. Teve os dois braços amputados e perdeu parte da visão.
Bombas de fragmentação não detonadas em um bosque de oliveiras no sul do Líbano. O Oriente Médio é fortemente contaminada pelo uso de bombas de fragmentação em conflitos passados. Crédito da foto: Simon Conway
Ogiva com bombas de fragmentação não detonadas.

Enviada por Vanessa Rodrigues para Combate Racismo Ambiental.

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