Consciência Negra

Por CENPAH

D. Demetrio Valentini*

O dia 20 de novembro é dedicado à “consciência negra”, iniciativa que visa estimular e fortalecer a consciência da identidade própria racial e cultural dos negros no Brasil.

A iniciativa já seria válida pelo número de pessoas que se sentem envolvidas nesta questão. Não é fácil ter estatísticas precisas, justamente numa realidade que está em plena mutação, em boa parte, exatamente, pelo processo em andamento, de identificação racial e cultural.

Mas dá para afirmar que aproximadamente a metade da população brasileira se assume como possuindo componentes importantes ligados à negritude.

Comparando com dados recolhidos nos censos anteriores, percebe-se claramente que aumentou muito o contingente de brasileiros que se assumem como negros.

Isto demonstra que a iniciativa de promover a “consciência negra” vem dando bons resultados, em termos sobretudo de superação de preconceitos que a população ainda carrega, seja em referência aos negros, seja também de negros que acabam, de alguma maneira, introjetando o preconceito dentro de si próprios.

O fato é que permanece muito difícil a superação de preconceitos longamente implantados ao longo da história, com o apoio da organização econômica e social, que traduzia o preconceito em medidas de opressão e de exclusão social, econômica e cultural.

A dificuldade em remover a carga de preconceitos que pesam sobre a população negra do Brasil, que ainda carrega as conseqüências do regime de escravidão, justifica as políticas públicas, que visam acelerar o processo de equiparação completa entre todos os cidadãos brasileiros, independente de raça ou de outros critérios.

Entre estas políticas, está o “sistema de cotas”, que visa garantir uma crescente participação de negros nos cursos universitários. Este sistema encontra uma primeira justificativa diante da grande disparidade existente nas universidades, onde a participação de negros é flagrantemente desproporcional.

Alguns ponderam que este sistema, que pretende superar a discriminação, traz em si mesmo um viés discriminatório, na medida em que reforçaria o que se quer superar, isto é, ter a raça como referência para políticas públicas.

Acontece que a conveniência destas iniciativas tem presente a realidade concreta, constatada pelas estatísticas, de uma disparidade que, se continuada, perenizaria a desigualdade ora existente.

Mas também é verdade que, se pretendemos que tais políticas sejam eficazes, precisamos admitir que devem ser provisórias. Pois em perspectiva, se elas conseguem o efeito pretendido, levarão a uma situação em que o ideal será a perfeita igualdade de oportunidades, que todos poderiam ter, sem a ajuda de cotas ou de outras medidas que podem valer agora, mas carregam consigo a marca da caducidade.

Bom seria se o Brasil pudesse, de fato, dar ao mundo o precioso testemunho de uma sociedade igualitária, em perfeita convivência de raças diferentes, que prescindirão sempre mais de regulamentação legal para se relacionarem no respeito mútuo e no diálogo fraterno.

*Bispo da diocese de Jales-SP.

Fonte: Correio da Cidadania

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