Raúl Burgoa (AFP)
LA PAZ — Os indígenas amazônicos que caminharam 600 km durante 65 dias para exigir ao governo boliviano que cancele a construção de uma estrada que atravessa uma reserva biológica chegaram nesta quarta-feira a La Paz em meio a um apoio maciço da população, com a esperança de se reunirem com o presidente Evo Morales.
A passeata, integrada por quase 2.000 indígenas, que saiu em agosto da Amazônia e que em dois meses subiu até os 3.600 metros de altura de La Paz, foi engrossada por delegações de trabalhadores, estudantes e moradores na entrada da cidade, onde seus membros foram recebidos como heróis por milhares de pessoas que levavam alimentos, bebidas e roupas.
Várias ambulâncias procederam a manifestação, transportando principalmente mulheres e crianças que sofriam do mal da altura e como medida preventiva, depois que uma gestante perdeu o filho, na véspera, devido ao esforço da caminhada, enquanto outra deu à luz em La Paz, segundo informe de um hospital local.
Após a longa caminhada, que recebeu forte apoio na cidade sede do governo, os indígenas têm a “esperança de manter diálogo com o presidente do Estado Plurinacional com sinceridade, transparência, como deve ser”, afirmou um dos líderes da marcha, Adolfo Chávez.
O ministro da Comunicação, Iván Canelas, declarou que o governo está pronto “para iniciar o diálogo se quiserem de forma imediata, talvez amanhã (quinta-feira)”.
Em nome de Morales, o ministro da Presidência, Carlos Romero, enviou uma nota na noite de terça-feira aos indígenas para “convidá-los a dialogar diretamente” assim que chegarem a La Paz.
Chávez confirmou nesta quarta-feira ter recebido “um convite ao diálogo, ainda não analisado”.
“A análise será feita durante a tarde” desta quarta-feira, completou..
Como demonstração de abertura, o governo ordenou a retirada das barreiras policiais e de um carro antimotins que estava posicionado desde cedo na praça Murillo (sede do Palácio Quemado, sede da Presidência), aonde a marcha pretende ingressar, em defesa do Território Indígena Parque Nacional Isiboro Sécure (TIPNIS).
O governo insiste na construção da estrada, financiada pelo BNDES, que unirá os Andes à Amazônia através do TIPNIS e propôs uma consulta prévia, mas esta possibilidade é rejeitada pelos indígenas.
Eles têm uma plataforma de 16 pontos, à qual adicionaram mais um relativo à investigação da repressão policial brutal lançada contra os indígenas no fim de setembro, em uma tentativa de impedir o avanço da passeata.
Além do cancelamento do projeto rodoviário, os nativos amazônicos pedem, entre outros pontos, “a paralisação de todas as atividades hidrocarboníferas no Parque Aguaragüe” – que gera cerca de 80% da produção de gás natural – e que foi rejeitada de pronto por Morales.
À medida que a marcha se aproximava do centro de La Paz, os moradores levavam comida e bebida aos manifestantes, enquanto bandas escolares tocavam música em um ambiente festivo arrematado pela queima de fogos de artifício.
Dezenas de milhares de pessoas foram às ruas, onde tremulavam bandeiras da Bolívia e outras brancas com a estampa do “patuju”, flor amazônica que é um dos símbolos do país andino.
Os indígenas se dirigirão em seguida à praça Murillo, localização da catedral onde provavelmente será celebrada uma missa.
A prefeitura opositora de La Paz prepara, ainda, uma recepção aos manifestantes na Praça São Francisco, espaço público de tradicional concentração de atos políticos e sociais do centro da cidade.
Durante sua permanência na capital boliviana, os manifestantes ficarão hospedados na Universidade Estatal San Andrés.
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