Decisão de indígenas de não ir a reunião em Brasília é apontada pelas lideranças dos colonos como um agravante na já tensa situação entre as duas comunidades
por Carlos Wagner, ZH Notícias
A recusa de caciques em participar das negociações de paz previstas para a próxima quinta-feira no Ministério da Justiça (MJ) deve acirrar os ânimos entre índios e agricultores nesta semana. A decisão dos caciques de não ir a Brasília foi comunicada na sexta-feira.
Os líderes dos indígenas afirmam que não irão participar de qualquer negociação até serem libertados o cacique Deoclides de Paula e outros quatro índios presos pela Polícia Federal (PF) suspeitos de terem matado a tiros e pauladas os irmãos Alcemar, 41 anos, e Anderson Souza, 26 anos, ambos agricultores, quando tentaram furar um bloqueio de estrada em Faxinalzinho.
– A prisão dos nossos companheiros foi uma traição. Não adianta irmos a Brasília ouvir conversa fiada. Temos uma pauta de reivindicação (basicamente é a posse para os índios das áreas reivindicadas) que é do conhecimento do governo. Se ela não for atendida, nós não temos porque ir conversar – afirma o vice-cacique, Luis Salvador, do acampamento do Rio dos Índios, uma área de 600 hectares que disputa entre os caingangues e agricultores em Vicente Dutra, cidade nas barrancas do Rio Uruguai.
– Por acreditarmos e apostarmos que a única saída desse conflito é o dialogo, estamos trabalhando no sentido de convencer os líderes indígenas a ir na reunião do dia 22 – comenta o Elton Scapini, titular da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR) do Estado.
A SDR está ajudando o Ministério da Justiça na questão do conflito que já dura mais de uma década e envolve 10 mil indígenas e 20 mil famílias de agricultores em várias cidades agrícolas do Rio Grande do Sul. Scapini soube da decisão os índios no final da sexta-feira. Os técnicos do Ministério ainda não têm conhecimento oficial da decisão indígena e a reunião continua marcada para o dia 22.
– Tudo pode acontecer durante a semana, até mesmo eles voltarem a fechar a estradas – afirma o prefeito de Faxinalzinho, Selson Pelin.
Na opinião do prefeito, a decisão dos índios tanto pode ser um blefe, assim como o anúncio de novos confrontos. Hoje, ele tem uma reunião com os secretários para discutir a situação.
Em outras áreas de conflitos agrários, como na cidade de Sananduva, onde índios caingangues e agricultores disputam a posse do Passo do Forquilha, a decisão dos caciques é descrita como preocupante, explica Sidimar Luiz Lavandoski, Coordenador de Conflitos Agrários da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul (Fetraf-Sul).
– Esperamos que decisão acirre mais os ânimos entre colonos e índios, que já está no seu limite – comenta.
Grito da Terra
Na terça-feira, devem chegar em Porto Alegre 4 mil agricultores, vindos em cem ônibus de vários cantos do Rio Grande do Sul, para participar do Grito da Terra, um evento que acontece simultaneamente, em todo o Brasil. Entre os 51 pedidos que serão entregues ao governador do Estado, Tarso Genro, um deverá ser reforçar a solução para a disputa agrária entre colonos e indígenas.
– Não é a primeira vez que trouxemos a questão agrária entre índios e colonos para o governo. Mas a diferença desta vez é a grande tensão entre as partes – comenta Elton Weber, presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag), uma das organizadoras do Grito da Terra.