BA – Comunidades tradicionais cobram de governo do estado regularização fundiária durante 6º festival do Umbu

Foto: Irpaa Semiarido
Foto: Irpaa Semiarido

Comunicação Irpaa

“Vim aqui falar do que ninguém falou, que sem terra ninguém beneficia umbu”, rebateu o representante da Articulação Estadual de Fundo e Fechos de Pasto, Cosme Araújo, durante a solenidade de abertura do 6º Festival do Umbu, em Uauá no último dia 21. Esta fala marcou um dos momentos do protesto das comunidades tradicionais durante o Festival com o objetivo de reivindicar diretamente ao representante do governo do estado agilidade nos processos de regularização fundiária do territórios.

Valdivino Rodrigues, da Articulação de Fundo e Fecho de Pasto, explicou que a Articulação aproveitou a oportunidade de ter representante do governo na região, para cobrar a demanda das comunidades, já que o governo não tem garantido agenda com a Articulação para debater e resolver a questão fundiária das comunidades tradicionais.

Cosme acrescentou que a reivindicação vai no sentido de cobrar que o governo cumpra seu papel, como o de garantir condições de realizar a busca ativa das comunidades e a certificação das mesmas no prazo estipulado pela lei 12.910/2013, até 2018. “Nós sabemos que só temos quatro anos para fazer essa busca ativa, porém o governo não tem dado nenhuma importância e nem tem ido fazer o trabalho que seria dele. E nós estamos ajudando o governo nessa busca ativa e ele não tem se comprometido”, afirmou Cosme.

Resposta do Governo

No evento quem estava representando o Governo era Jairo Carneiro, da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Reforma Agrária, Pesca e Aquicultura – Seagri, que passou para Rui Costa, da Casa Civil, o papel de falar em nome do Governo da Bahia. Rui afirmou aos manifestantes que até sexta-feira (28 de março), será realizada uma reunião da Governadoria com representantes da Articulação de Fundo e Fecho de Pasto para tratar da regularização fundiária e publicação do decreto de regulamentação da lei até esta mesma data.

Representações de várias regiões da Bahia estavam presentes no ato: Senhor do Bonfim, Andorinha, Monte Santo, Uauá, Sobradinho, Casa Nova, Santa Maria da Vitória, Correntina, Vitória da Conquita, Oliveira dos Brejinhos, Remanso. Com faixas, as comunidades mostraram com força que estão empenhadas na defesa do seu jeito de viver no Semiárido nos seus territórios.

Exigência de condições de permanência na terra

Durante o evento também foi distribuída uma carta do movimento explicando a real situação das comunidades, repudiando a lei por ela não contemplar os anseios e as necessidades reais das famílias tradicionais. A mesma lei desrespeita a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Os nossos territórios, tradicionalmente ocupados, tem garantia jurídica. No entanto, a lei não vem sendo colocada em prática. Por isso, exigimos o título definitivo dos nossos territórios”, diz trecho da carta.

Valdivino denuncia que as comunidades vivem incertezas diante da situação agrária e que isto precisa ser resolvido. “Os povos tradicionais precisam ser preservados. Sem a garantia de modos de vida tradicionais, do território, isso se acaba, daqui alguns anos não teremos mais Festival do Umbu”, registra. Hoje o Festival é um modelo de bem viver que preserva o meio ambiente e a vida no campo, sendo fruto da existência e do jeito de viver das comunidades tradicionais, explica Valdivino. “Que não é o mesmo tipo desenvolvimento que o Estado apóia”, afirma.

A Lei 12.910/2013

Foi publicada no Diário Oficial da Bahia, em outubro de 2013, a Lei Nº 12.910 que estabelece dezembro de 2018 como prazo limite para “regularização fundiária de terras públicas estaduais, rurais e devolutas, ocupadas tradicionalmente por Comunidades Remanescentes de Quilombos e por Fundos de Pastos ou Fechos de Pasto”.

A Lei foi uma reivindicação dos movimentos sociais organizados, porém, da forma como foi aprovada não contemplou os anseios populares, especialmente das comunidades rurais, objeto central da Lei.

6° Festival do Umbu

É um evento coletivo que promove intercâmbios de experiências, articulação entre agricultores/as familiares e organizações, espaço de visibilidade de boas práticas na região, formação, divulgação e fortalecimento da economia solidária e da Agricultura Familiar. Em sua 6ª edição, o Festival vem sendo realizado anualmente pela Coopercuc, organizações e entidades das região, como o Irpaa. Neste ano internacional da Agricultura familiar, o Festival teve como lema “As mãos que alimentam a nação”. O evento aconteceu nos dias 21 e 22 de março , em Uauá, na Bahia.

Leia abaixo a carta distribuída pela Articulação de Fundo e Fecho de Pasto:

QUEREMOS VIVER DIGNAMENTE EM NOSSO TERRITÓRIO!

Na Bahia, milhares de famílias vivem em comunidades Tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto, Geraizeiros, cuja principal característica é o uso comum da terra para o criatório e para a agricultura e extrativismo. Trata-se não apenas de um sistema produtivo, mas de todo um modo de vida orientado por valores comunitários, culturais e ecológicos que se reproduzem há muitas gerações.

Embora sejam os legítimos donos, as famílias camponesas das comunidades de Fundo e Fecho de Pasto, Geraizeiros, não possuem a garantia da posse e propriedade sobre os seus territórios. A ausência de uma política efetiva de regularização fundiária tem levado ao acirramento de conflitos nessas comunidades. Para continuar existindo, as famílias tem enfrentado muitas dificuldades como a indústria da seca, a grilagem de terras por fazendeiros, carvoarias, invasão de empresas do agronegócio, mineradoras e mais recentemente de energia eólica apoiadas pelo Estado.

Hoje, graças a luta de comunidades tradicionais no Brasil e no mundo, temos um conjunto de normativas jurídicas que defendem o modo de vida e os direitos territoriais, garantidos inclusive, pela Constituição Federal e Convenções Internacionais, das quais o Brasil é signatário.

O Estado da Bahia tem agido com descaso junto às comunidades, tanto na questão da regularização fundiária, como na promoção de condições de permanência na terra, garantindo a soberania alimentar, hídrica, cultural e socioambiental.

Os nossos territórios tradicionalmente ocupados tem garantia jurídica. No entanto a lei não vem sendo colocado em prática. Por
isso exigimos o título definitivo dos nossos territórios.

Em 2013 foi aprovado a Lei 12.910/2013, na Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, projeto de iniciativa do poder executivo, que trata da regularização fundiária das comunidades de Fundo e Fecho de Pasto e Remanescentes de Quilombos.

A Articulação Estadual de Comunidades de Fundo e Fecho de Pasto entende que, diante da atual conjuntura, seria necessário que na regulamentação da Lei sejam contemplados minimamente, os anseios das populações que tradicionalmente ocupam esses territórios.

A maior parte da lei não traduz a real situação e necessidades das comunidades. O estabelecimento de um prazo para que fosse protocolado o auto reconhecimento, desrespeitando a Convenção 169 da OIT e emendas que comprometem direitos fundamentais das comunidades tradicionais desrespeitam os nossos direitos históricos. A Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pastos repudia a lei nesses termos. 

Que as políticas públicas sejam voltadas para os interesses das populações das comunidades tradicionais.

Viemos às ruas exigir do Governo Estadual respeito às comunidades tradicionais de Fundos e Fechos de Pasto e garantia de condições para permanência efetiva nos nossos territórios.

“FUNDOS E FECHOS DE PASTO, NOSSO JEITO DE VIVER EM NOSSO TERRITÓRIO”

Articulação Estadual de Fundos e Fechos de Pasto

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.