Carta Pública – Retomada contra a especulação imobiliária: Zona Costeira realiza grito dos excluídos em Caetanos de Cima (CE)

Foto: Camila Garcia
Fotos: Camila Garcia

Da Redação Portal do Mar

“Como é que estamos em um país sem miséria se nossos filhos não têm onde morar?” foi o que disse um pescador de Caetanos de Cima, no Assentamento Sabiaguaba, em Amontada, para aproximadamente 300 pessoas, ao falar sobre o grave problema de especulação imobiliária que sua comunidade tem vivenciado nos últimos anos. O grupo, formado por moradoras/es, representantes de assentamentos da região, de comunidades da zona costeira  e do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), reuniu-se para realizar ato simbólico de retomada das terras cercadas nas dunas ao redor da lagoa, dentro do Assentamento, em Caetanos de Cima.

“Essas terras pertencem ao assentamento e queremos prepará-las para as gerações futuras, para os jovens e os que ainda nem nasceram. Enquanto os que vêem invadindo, fazem isso só para vender para o povo do sul, das eólicas, para fazer sítio de político, para uma especulação que expõe nossos jovens às drogas e à exploração sexual.” Afirmou outro morador quando expressava sua indignação diante da ineficiência do Estado em garantir o território e a segurança dos assentados.

O imóvel existe desde 1989, foi criado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a partir da mobilização de pessoas que já viviam na região. Legalmente, o órgão é responsável pela retirada e indenização das famílias que não concordam com o assentamento, questão nunca resolvida e que atualmente contribui para o acirramento dos conflitos existentes no assentamento. O Incra também é responsável por articular políticas públicas, assistência técnica e garantir o bem estar e a segurança dos assentados. Mas as/os assentadas/os de Sabiaguaba reclamam que “só há recurso para a cultura; para a terra, pesca e agricultura nada”.

caetanos de cima eolicasAs áreas em questão já foram alvo de conflitos em diferentes momentos, elas estão ao redor de uma grande lagoa entre dunas, paisagem muito cobiçada por empresários do turismo. Nos anos 2000, o assentamento enfrentou conflitos com o hoje falecido, Julio Trindade, empresário que queria construir resorts na região. Em 2009, os moradores denunciaram o início do processo de invasão com a colocação de cercas na área e nada foi feito.

No primeiro semestre desse ano, empresas envolvidas na construção do Parque Eólico de Icaraí foram denunciadas ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais não renováveis (IBAMA) por retirar água da lagoa para a construção das estradas de acesso ao empreendimento. Após ser multada a retirada parou, mas nada foi feito para recuperar a área degradada.

Enquanto as cercas nas terras do assentamento só aumentavam. Diante da inoperância do Estado, a população local decidiu por uma ação de derrubada das cercas de invasores, como forma de protestar e pedir a ação dos órgãos federais. “Estamos cansados de procurar Incra, Ibama, Ministério Público e nada, só queremos a garantia do nosso direito” relatou uma senhora que participou da retomada.

O grito dos excluídos na zona costeira

Partilhando peixe, tapioca, e frutas dos seus quintais, Caetanos de Cima recebeu companheiros e companheiras de todo o Ceará, assentados que enfrentam problemas semelhantes com o Incra e representantes de comunidades na zona costeira que enfrentam conflitos contra o turismo, a carcinicultura e os parques eólicos. O sentimento de solidariedade fortaleceu a caminhada do grupo da sede da associação até a área cercada, cantando e gritando palavras que expressavam denúncia e indignação, mas também a união das populações tradicionais e afirmação de seus modos de vida.

“Hoje muitos estão em luta no Brasil. Nós também”. Disse uma jovem que participava da ação. A presença expressiva da juventude foi uma das marcas da manifestação. De tradição ligada às Comunidades Eclesiais de Base nos anos de 1980, as/os participantes reconheceram que este era o seu grito dos excluídos, que nacionalmente realizou atividades no país com o lema “Juventude que ousa lutar, constrói o projeto popular.”

Após a derrubada das cercas, o grupo dançou uma grande ciranda nas dunas, como forma de agradecer aos presentes e afirmar a cultura e o trabalho das populações tradicionais da zona costeira. À noite, a Polícia Militar esteve com três viaturas no Assentamento. Disse que havia recebido denúncias contra a comunidade. Após ouvir que a área pertence ao assentamento federal, solicitou que fossem procurados os órgãos competentes.

Próximos passos

O ato simbólico ocorreu no dia em que diversos movimentos foram às ruas lutar por direitos em todo o país. Conectados com o momento político no Brasil, as/os manifestantes em Caetanos de Cima afirmaram que se manterão organizados. “Agora vamos ao Incra cobrar uma atuação, pois já recebemos ameaças e não vamos calar.”

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Camila Garcia.

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