CIMI – Depois dos representantes da Secretaria Geral da Presidência da República se negarem a comparecer ao encontro marcado com lideranças Munduruku na Aldeia Sai Cinza, município de Jacareacanga (PA), no último dia 25, a Associação Indígena Pusuru divulgou carta repudiando a decisão dos integrantes do governo. Os representantes do governo justificaram a decisão ante uma imaginada violência a ser praticada pelos indígenas. Diziam temer violências, sem lembrar que quem matou um indígena Munduruku com um tiro na cabeça foi um delegado da Polícia Federal, comandante da Operação Eldorado, ainda sem punição ou ao menos afastado do cargo.
‘Quem chegou armado na cidade de Jacareacanga foi o governo, com a Polícia Federal e a Força Nacional. Segundo Nilton (representante do governo), o ministro Gilberto Carvalho desautorizou a delegação a vir a nossa aldeia, e tentou impor uma reunião na cidade de Jacareacanga, sob presença militar. E isso nós não aceitamos’, diz a carta que segue na íntegra.
Carta ao governo brasileiro e à sociedade
Nós, lideranças, caciques e guerreiros Munduruku do Alto, Médio e Baixo Tapajós reunidos para reafirmar nossa posição contrária à construção de barragens em nossos rios, e estamos completamente indignados com a falta de respeito do governo brasileiro por não comparecer ao nosso encontro, marcado para hoje, 25 de abril, na aldeia Sai Cinza, município de Jacareacanga, Pará.
Os representantes Tiago Garcia e Nilton Tubino, da Secretaria Geral da Presidência da República, afirmaram aos vereadores Munduruku de Jacareacanga que não viriam à aldeia porque temiam violência da nossa parte, que nós estávamos esperando por eles armados e com gaiolas para prendê-los. O governo está tentando se fazer de vítima, e isso não é verdade. Quem chegou armado na cidade de Jacareacanga foi o governo, com a Polícia Federal e a Força Nacional.
Segundo Nilton, o ministro Gilberto Carvalho desautorizou a delegação a vir a nossa aldeia, e tentou impor uma reunião na cidade de Jacareacanga, sob presença militar. E isso nós não aceitamos. Essa reunião já tinha sido desmarcada uma vez. Ela deveria ter acontecido no dia 10 de abril, mas por causa da Operação Tapajós, nós ficamos com medo de um ataque igual ao que aconteceu na aldeia Teles Pires em novembro do ano passado, quando assassinaram nosso parente Adenilson. Por isso nós não aceitamos que esse encontro acontecesse naquela data.
E agora o governo chega novamente armado com suas tropas para uma reunião com o nosso povo, e inventa todo tipo de mentira, manipulações e distorções sobre nós Munduruku. Nós queremos o diálogo, mas não é possível ter diálogo com armas apontadas nas nossas cabeças. E achamos que talvez o governo não queira dialogar, porque quem quer dialogar não mata indígena, não invade aldeias e nem vem armado com policiais e helicópteros.
Exigimos que o governo pare de tentar nos dividir e manipular, pressionando individualmente nossas lideranças, caciques ou vereadores. Lembramos que quem responde oficialmente pelo nosso povo são as coordenações das associações Munduruku, chamadas Pusuru e Pahyhy, as entidades representativas de todas as comunidades Munduruku. Somos um só povo, todas as nossas decisões são sempre coletivas e nós as expressamos sempre através das associações.
Por fim, reafirmamos que nós povo Munduruku não queremos guerra, queremos paz. E por isso queremos que todas as tropas militares saiam da região. A partir de agora, exigimos que todos encontros e reuniões com governo sejam sempre acompanhados pela procuradoria do Ministério Público Federal do Pará. Queremos que nossa posição sobre a barragem seja respeitada, e que o governo regulamente a consulta prévia aos povos indígenas como manda a Convenção 169 da OIT, tudo isso antes de qualquer decisão, estudo ou construção de barragem.
Também exigimos que nossos direitos constitucionais sejam garantidos, sem que sejam usados como moeda de troca. E reafirmamos: somos contra as barragens e queremos todos os nossos rios livres. E nós vamos lutar por eles.
Aldeia Sai Cinza, 25 de abril de 2013.
Assinam este documento caciques, lideranças, guerreiros e povo Munduruku.