Toda a documentação histórica já produzida anota que os Piripkura deslocam-se no interior de um território bem definido e os limites da terra indígena atualmente ocupada, correspondem apenas a uma parcela do antigo território tradicional
Procuradoria da República em Mato Grosso
“É absolutamente necessário e urgente que a União e a Fundação Nacional do Índio (Funai) deem início, de imediato, ao procedimento de identificação e demarcação da Terra Indígena Piripkura em razão não somente da presença inconteste dos índios na área referenciada, mas, também, em razão da permanente agressão física e cultural a que estão diretamente subjugados e indiretamente pela destruição dos recursos naturais existentes e que constituem a sua base existencial”. Essa foi a declaração feita pelo Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso em ação civil pública protocolada no último dia 19 de abril, com o objetivo de assegurar a identificação e demarcação da terra dos indígenas da etnia Piripkura.
Na ação proposta perante a Justiça Federal de Mato Grosso, o MPF pediu a concessão de três liminares. A primeira liminar visa determinar à Funai a constituição de um grupo técnico para proceder a identificação e demarcação da Terra Indígena Piripkura, no prazo de 30 dias e o cumprimento dos demais prazos legais até o encaminhamento do processo administrativo ao Ministério da Justiça, sob pena de multa diária.
A segunda liminar requerida pelo MPF busca obrigar o Ministério da Justiça a decidir sobre o caso, em até 30 dias após o recebimento do processo, também sob pena de multa diária.
O terceiro pedido de liminar é para que a Justiça determine à Funai que mantenha uma equipe permanente de fiscalização na terra indígena, para impedir o ingresso e a permanência de não-índios, devendo a autarquia comunicar à Justiça as providências de ordem administrativa e financeiras necessárias ao exercício dessas atividades.
No julgamento do mérito da ação, o MPF quer que seja determinada à Funai e à União que concluam o processo administrativo de demarcação e delimitação das terras dentro dos prazos legais.
Piripkura – Os índios isolados denominados Piripikura fazem parte de um subgrupo Kawahiva, que ocupa os municípios mato-grossenses de Colniza, Rondolândia e Aripuanã. Segundo documentação histórica, esses indígenas se comunicam exclusivamente por meio da língua indígena, mantêm intacto seu universo simbólico e cosmológico e continuam rejeitando o processo de colonização, com a sobrevivência baseada em práticas produtivas tradicionais (caça, pesca, coleta e fabricação de utensílios).
De acordo com a Nota Técnica da Funai nº 285/2010, por ainda não ter sido demarcada, a terra dos Piripkura tem sofrido grandes impactos, com a instalação de pastos e a abertura de estradas que facilitam a movimentação de ocupantes não indígenas e a manutenção de suas atividades econômicas. Essa ocupação acelerada no entorno da terra indígena, propiciada pela abertura das estradas, poderá ocasionar um isolamento geográfico da área, fazendo com que fique circundada por pastagens e suscetíveis a impactos ambientais negativos, como queimadas, impedimento de fluxo de fauna e facilidade de invasão.
Segundo os procuradores da República Mário Lúcio Avelar e Marcia Brandão Zollinger, o Poder Público está sendo omisso ao não finalizar o processo de demarcação da Terra Indígena Piripkura e, assim, permite que os indígenas isolados dessa etnia, que não têm contato com a sociedade nacional, sofram com as ameaças a sua sobrevivência trazidas pelas frentes de expansão econômica.
“Nota-se que a mora, isto é, a omissão da Funai arrasta-se por quase três décadas, trazendo graves implicações à fruição de direitos fundamentais, como a vida e a integridade física e cultural dos Piripkura. Tanto isso é certo que, a despeito de terem, por si, adotado novas estratégias de sobrevivência (como o não estabelecimento de aldeias), relatos oficiais dão conta de possível desaparecimento de parcela do grupo”, ressaltaram.
Os procuradores relatam também que os problemas gerados aos indígenas vão além da questão da perda territorial e apontam a necessidade de intervenção urgente da Justiça. “(…) Sem as suas terras não podem os índios preservar a cultura, o modo de ser, seus hábitos, mitos o modo de produção etc. e estariam irremediavelmente condenados à degradação física, psíquica e moral. (…) Não há maior violência que se possa cometer contra um indígena do que afastá-lo do seu habitat. O caso trazido à análise é de grave omissão, a demandar a presença enérgica e célere do Poder Judiciário”, afirmaram os procuradores.
A ação contra a União e a Funai foi protocolada na última sexta-feira e tramita na 2ª Vara da Justiça Federal, sob o número 5409-02.2013.4.01.3600.