Pedido de Apoio da Associação Espírita e de Cultos Afro-brasileiros de Petrolina/PE

Por Edivania Granja da Silva Oliveira*

Nesses últimos dias a nossa cidade (Petrolina/PE) foi tomada por uma discussão político-partidário sobre a Estátua Mãe D´Água, a qual resultou em agressões às religiões afro-brasileiras e a decisão do artista Lêdo Ivo em retirar a estátua.

Acredito que nós, cidadãos, professores, membros de Grupos de Pesquisa e militantes não podemos deixar de contribuir para a Educação das Relações Étnico-raciais, no combater ao preconceito e a discriminação e no apoio aos segmentos sociais que ainda sofrem com a falta de respeito e do reconhecimento da suas práticas culturais e religiosas, como é o caso dos Povos de Terreiros da nossa região, que produziram a Carta Aberta (abaixo) em protesto sobre a posição de alguns representantes da sociedade petrolinense e no pedido da permanência da estátua.

A Associação Espírita e de Cultos Afro-brasileiros irá solicitar ao Ministério Público as devidas providências com relação ao discurso proferido pelo Vereador Osinaldo Souza, no último dia 27/09, na Plenária da Câmara de Vereadores, apoiado pela Vereadora Ana Télia. Leiam trechos do discurso:

“A Bíblia diz que existe um só Deus e um só senhor. Eu notei que os dias em Petrolina agora estão mais tristes, quando eu passo ali na orla que eu olho para a estátua que fizeram a Iemanjá, eu digo: o que é que está acontecendo em Petrolina? Iemanjá na Umbanda significa a deusa das águas. Isso é uma blasfêmia contra Deus, porque a própria Bíblia Sagrada diz que só existe um Deus”, bradava o vereador Osinaldo Souza agarrado a Bíblia enquanto discursava na tribuna da Câmara Municipal.

Para o edil, que é evangélico, a estátua da Mãe D’água que ele insiste em chamar de Iemanjá, não faz parte da nossa cultura, é uma blasfêmia contra Deus e deve ser retirada da Orla. “Se for para falar de cultura, para que um livro mais cultural do que a Bíblia Sagrada? Vamos falar de cultura e me prove onde Iemanjá é cultura? A figura de Iemanjá nem folclórica é para se falar em cultura. Meu amigo, eu posso dizer, Iemanjá é a profanação do próprio Deus. O primeiro monumento para se chegar a Petrolina é a Iemanjá. Eu venho aqui repudiar a atitude do prefeito Julio Lóssio, eu venho aqui dizer a ele: tire essa estátua ao demônio da orla de Petrolina que nós católicos e evangélicos não vamos aceitar” atestou.

Assim, no dia 01/10 participamos de uma reunião na Biblioteca Municipal de Petrolina (representantes das Casas de Terreiro, Professores da UNEB, UPE, IF SERTÃO PE, UNIVASF, representantes do Conselho de Cultura de Petrolina e o próprio artista Lêdo Ivo) na qual foi deliberado o APOIO PÚBLICO ao Movimento de repúdio das aludidas palavras dos legisladores em questão e, ainda, a solicitação da permanência do símbolo artístico-cultural produzido pelo artista plástico Lêdo Ivo.

Solicitamos, nesse sentido, que tod@s os companheir@s que, em todo o país, entendam importante sua adesão, pessoal e institucional, a esta causa, nos enviem, por email ([email protected]), sua disposição em “assinar” (mesmo que virtualmente) a carta em anexo e, igualmente, o pedido de reparação que a Associação Espírita e de Cultos Afro-brasileira fará junto ao Ministério Público do Estado de Pernambuco.

Leia a Carta Aberta:

A ASSOCIAÇÃO ESPÍRITA E DE CULTOS AFRO-BRASILEIROS FAZ CARTA  ABERTA A COMUNIDADE PETROLINENSE.

Nós, Povos de Terreiro da região de Petrolina (estimados em mais de 400 terreiros de candomblé, umbanda, tendas, sessões, entre outros segmentos religiosos de matriz afro-indígena), representados pela Associação Espírita e de Cultos AfroBrasileiros (AECAB) nos sentimos extremamente ofendidos com os últimos  posicionamentos a respeito da escultura do artista juazeirense Lêdo Ivo, que antes é parte das tradições ribeirinhas do São Francisco, popularmente conhecida como Iara ou
Mãe D´Água.

Nas religiões de matriz africana a força dos rios é cultuada como a Orixá Oxum,  cuja cor é amarela, e a força das águas do Mar, é cultuado como Iemanjá, representada  pela cor azul celeste e branco. Como acontece com muitos símbolos que são colocados em praças públicas e evocam o sentido de outras religiões, a exemplo do monumento  público da Bíblia, colocada em uma praça da nossa Cidade, e que nós respeitamos  porque todas as religiões tem que ser respeitadas, pois o Estado Brasileiro é laico, conforme assegura a Constituição Federal do Brasil.

Assim, se na nossa Cidade for colocado qualquer símbolo que evoque as tradições Afro-religiosas brasileiras temos o direito ao mesmo tratamento e respeito. A bela escultura do grande artista juazeirense, Lêdo Ivo, independente da sua vinculação religiosa deve ser mantida na nossa Cidade.

Nós, povos de terreiro, publicamente, pedimos ao nobre escultor que um dia  possa agraciar nossa região com esculturas de Iemanjá e Oxum, Orixás das Águas, mas  achamos bela a escultura da Mãe D´Água, como também é o Nego D´Água de Juazeiro.

Essa problemática relembra as polêmicas de quando foram colocadas as esculturas dos Orixás no Dique do Tororó, em Salvador, que hoje é parte do Patrimônio Cultural da Bahia.

Imaginem se tivéssemos que acabar com os símbolos que lembrem as religiões brasileiras. O que faríamos com o Cristo Redentor do Rio de Janeiro? O que faríamos com os Orixás do Dique do Tororó em Salvador? O que faríamos com o Nego D´Água de Juazeiro? O que faríamos com a Bíblia Sagrada em Petrolina? O que faríamos com a escultura da Mãe D´Água do Rio São Francisco? O que faríamos com a escultura do Padre Cícero em Juazeiro do Norte? A solução é apagar todos esses símbolos? Ou deixarmos para posterioridade e asseguramos o respeito a todos as religiões e tradições do nosso País?

Jorge Rodrigues Barbosa
Presidente da AECAB


*Edivania Granja da Silva Oliveira é Professora de História.

Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.

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