‘Tempo de reportagem’

Bruno Mateus – Ragga

O escritor Fernando Morais assina o prefácio de Tempo de reportagem e, recorrendo a Gay Talese, diz que Audálio Dantas é “um jornalista do tempo em que se praticava a arte de sujar os sapatos”. Em dias nos quais longas entrevistas são feitas sem que o jornalista veja a cara do entrevistado ou, como diz Morais ainda no prefácio, se ele é gordo ou magro, essa compilação de 13 reportagens é um objeto valioso não só para jornalistas e estudantes de jornalismo, mas também para quem gosta de mergulhar nas histórias.

As trajetórias do eterno repórter Audálio e do jornalismo brasileiro das últimas seis décadas estão intimamente ligadas – foi presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo quando do assassinato covarde de Vladimir Herzog pelas mãos da ditadura e também foi o primeiro presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), além de ter passado por grandes jornais e revistas do país. Em 1981, recebeu um prêmio da ONU em reconhecimento por sua atuação em defesa dos direitos humanos.

O texto de Audálio tem força descritiva sem se distanciar da informação. As reportagens nos levam a distintos lugares e pessoas: um desfile militar no Chile, o triste caso de mortalidade infantil por inanição em Pernambuco e um comprador de peixe do interior de Minas. E ainda nos apresenta Quarto de despejo – a rotina de uma favela paulistana contada pelo diário da moradora Carolina Maria de Jesus, que teve seus escritos publicados no mundo inteiro. Segundo o próprio, essa é sua reportagem mais importante.

Tempo de reportagem traz textos inéditos, nos quais Audálio relata o making of das reportagens. Saber os detalhes da apuração torna o livro ainda mais saboroso e interessante. O jornalista mostra desapego e, num acesso raro de autocrítica no meio jornalístico, descortina inclusive as falhas, na sua opinião, de alguns de seus textos.

Ao folhear o livro, a sensação é a de que as reportagens, algumas escritas há mais de 40 anos, ainda guardam frescor e têm o poder de levar o leitor às cenas que Audálio Dantas, com os sapatos ainda sujos e a alma impregnada de memórias, nunca se esquecerá.

Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.

http://www.divirta-se.uai.com.br/html/sessao_13/2012/08/30/ficha_ragga_noticia/id_sessao=13&id_noticia=57552/ficha_ragga_noticia.shtml

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.