MG – Vidas e famílias geradas em torno do anel rodoviário

Em Belo Horizonte, mais de 3 mil famílias moram em situação precária e correm o risco de perder suas casas

Os barracos estão ameaçados pela construção do Rodoanel Foto: Maíra Gomes

Maíra Gomes

“Tá tudo caindo, nem durmo de noite. Tô com medo de isso tudo cair em cima de mim. Um sufoco o que vivo aqui”. São nove barracos, casas completas com geladeiras, fogões camas, e o que mais for de direito de um lar. É o que pode cair em cima de Dona Luiza Machado Silva, moradora da Vila da Paz, região Nordeste de Belo Horizonte (MG).

A Vila da Paz é uma das 27 vilas que contornam o Anel Rodoviário, a principal via de acesso às grandes rodovias de Minas Gerais. São mais de 3 mil famílias tendo que lidar diariamente com poluição, barulho, trepidações e diversos problemas. Muitas vezes até com acidentes fatais.

O caso de Dona Luiza e seus vizinhos é o mais urgente. São nove famílias que moram embaixo do viaduto no Km 21 do Anel que têm suas casas com risco iminente de desabamento. Há dois meses, os moradores relatam que a estrutura está cedendo, empurrando as casas umas em cima das outras, e ainda denunciam que há queda de pedras de mais de 15 kg.

Adriana Edvige, integrante da Comunidade dos Moradores do Anel Rodoviário (CMAR), está na luta há mais de cinco anos. Seu foco agora são estas famílias. “Eu busquei todos os órgãos possíveis. Isso aqui é uma tragédia anunciada e eu espero que as autoridades possam vir ajudar estas famílias que estão correndo risco iminente”, desabafa. Adriana conta que a CMAR, entidade representativa das 27 vilas, já entrou em contato diversos setores do poder público e não tem recebido respostas concretas.

Obras no Anel, Copa 2014

O que acontece é que estas famílias estão envolvidas em algo muito grande. Sendo o Anel uma via expressa e de grande utilidade para a mobilidade em BH, estão previstas obras de ampliação que afetarão as mais de 3 mil famílias no entorno. Há muito se fala disso, mas no início de junho, com a visita da presidenta Dilma Rousseff à cidade, a obra foi oficialmente inserida na agenda do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e da Copa do Mundo.

Fábio Garrido, representante da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, tem acompanhado a luta dos moradores e explica: “Essas famílias foram ocupando estes espaços devido ao gigantesco déficit habitacional de BH, mais de 300 mil habitações. Mesmo após 20 anos morando no local, as famílias ainda estavam sendo tratadas como invasoras. Após muita luta das comunidades, a Defensoria Pública agora garante o direito aos terrenos”. Garrido conta que a comunidade tem ficado confusa com a falta de esclarecimento do poder público. Mas garante, quem deve cuidar da habitação é o governo municipal. Através da Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel), a prefeitura é responsável por auxiliar a população neste sentido. Assim, as muitas pessoas que deverão perder suas casas estão agora jogando suas forças nesta instituição. Principalmente para o caso das famílias do viaduto, como Dona Luiza.

As comunidades recebem o apoio do Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD), movimento social que trabalha com questões de moradia. Vinícius Moreno, membro do MTD, conta que, além dos problemas sofridos devido aos deslizamentos, a situação traz riscos à saúde. “O estado ali é calamitoso. Não é espaço de nenhum ser humano, nem mesmo animal, estar nesta situação de moradia. Totalmente precária, envolvendo problemas de saúde, segurança e outros”. Vinícius fala do esgoto a céu aberto, correndo entre as casas; o altíssimo barulho sofrido pelos moradores; a insegurança devido ao grande número de veículos trafegando pelo local; os pequenos animais, como ratos e baratas, que circulam na região; e muitos outros.

A luta imediata dos moradores do Anel é por estas famílias. O membro do MTD afirma que a melhor solução é o reassentamento para prédios próximos ao local onde já moram, para uma habitação de qualidade. “Uma das coisas mais importantes na política de reassentamento é manter as famílias próximas de seu local de origem. Geralmente, o empregador só aceita pagar uma passagem de ônibus, não aceita atrasos devido a trânsito ou acidente. Nas negociações de reassentamento, o trabalho deve ser o primeiro item a ser levado em consideração”, pontua.

Há ainda o fator de sociabilidade. Núbia Ribeiro, moradora da Vila da Aldeia, será uma das muitas atingida pelas obras. Também é membro do CMAR. Ela conta que uma de suas maiores preocupações é com a localidade do reassentamento. “Vivo aqui desde que nasci. Sei quem são as pessoas que estão ao meu redor, conheço cada uma delas. Isso é muito importante para a criação dos meus filhos”. Ela conta que os três filhos estudam próximos a sua casa, inclusive a mais nova que frequenta uma escola especial. Conta ainda com posto de saúde, área comercial e outros serviços públicos na região.

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