Justiça proíbe Monsanto de cobrar royalties por venda de soja transgênica

Felipe Amorim

A Justiça do Rio Grande do Sul determinou a suspensão, em caráter liminar, da cobrança de royalties sobre a comercialização da soja transgênica produzida no Brasil. O juiz Giovanni Conti entendeu que a semente produzida pela Monsanto não pode ser enquadrada na Lei de Proteção à Propriedade Intelectual, estabelecendo a imediata interrupção da cobrança de taxas, sob pena de multa diária no valor de R$ 1 milhão.

Em nota divulgada à imprensa, a Monsanto afirma que apresentou embargo da decisão da 15ª Vara Cível de Porto Alegre. Com o recurso, a empresa alega que suspendeu todos os efeitos da sentença e que continua a cobrar pelo uso do seu produto.

Por outro lado, o juiz Giovanni Conti disse ao Última Instância que “não há nenhuma hipótese da possibilidade de suspender a sentença”. Ele explicou que o prazo para que as partes recorram vence hoje (17/4) e que, portanto, ainda não recebeu os autos com os novos procedimentos.

De acordo com o juiz, o mecanismo jurídico do embargo busca esclarecer eventuais pontos de “omissão, obscuridade ou contradição” que não tenham sido compreendidos por alguma das partes na sentença. Caso receba na próxima quarta, amanhã (18/4), em seu gabinete os autos com os eventuais embargos, Conti afirmou que há a possibilidade de reforma de elementos da decisão, sem a alteração do mérito analisado.

Conti advertiu também que, caso haja denúncias e ações judiciais revelando que a Monsanto continua a cobrar os royalties, existe sim a possibilidade de aplicação da multa milionária.

A Fetag-RS (Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul), entretanto, afirmou ao Última Instância que ainda não teve notícias de taxas cobradas aos agricultores desde a publicação da decisão, na última quarta (11/4), até a tarde desta segunda (16/4), ontem. Mas a instituição já orientou os sojicultores a não aceitar a cobrança de taxas no ato de compra das sementes. “Se for cobrado, deve estar especificado na nota fiscal o que está sendo cobrado e por qual motivo”, afirmou Elton Weber, presidente da Fetag-RS.

Propriedade intelectual

A decisão julgou parcialmente procedente a ação coletiva ingressada pela Fetag-RS e pelos Sindicatos Rurais dos municípios gaúchos de Passo Fundo, Sertão, Santiago, Giruá e Arvorezinha. Ficou estipulado que, além de estar sujeita à multa diária, a Monsanto deverá ressarcir os produtores de soja pelos royalties cobrados a partir da safra 2003/2004.

No mérito, a Justiça determinou que os produtores de soja têm o direito de reservar o produto transgênico tanto para o replantio, quanto para a comercialização, sem ter que pagar qualquer tipo de royalty à empresa. O mecanismo posto em prática pela Monsanto até então recolhia uma taxa de 2% sobre toda a soja transgênica comercializada no Brasil e vendida para o exterior.

A análise do mérito estabeleceu que a semente de soja geneticamente modificada não pode ser tratada como um produto inovador, dotado de propriedade intelectual e objeto de registro de patente. Desta maneira, os grãos da chamada soja RR (Roundup Ready) ficam enquadrados na Lei de Proteção de Cultivares (Lei 9.456/1997), à revelia da Lei de Proteção à Propriedade Intelectual (Lei 10.973/2004).

O “RR”, que batiza a semente alterada, tem origem no herbicida de mesmo nome e também produzido pela Monsanto. Isto, pois o agrotóxico — indispensável ao cultivo da semente modificada — torna o grão mais resistente, o que aumenta a produtividade.

“As questões debatidas na presente demanda transcendem os interesses meramente individuais, uma vez que estamos tratando de bem imprescindível para a própria existência humana, ou seja, o alimento, cuja necessidade é urgente e permanente”, finalizou o juiz Giovanni Conti, ao determinar que a decisão produzirá efeitos sobre pequenos, médios e grandes produtores de soja.

Contestação

A Monsanto defendeu-se ao sustentar ser detentora de diversas patentes devidamente registradas no Inpi (Instituto Nacional de Proteção Industrial), o que sustentaria a cobrança dos royalties.

Ressaltou também que a cobrança de taxas é a forma pela qual é remunerada pelos investimentos realizados no desenvolvimento da tecnologia. De acordo com a Monsanto, esse sistema ajuda a fomentar novos investimentos no setor.

Por compreender que a decisão da 15ª Vara Cível vai contra entendimentos anteriores do TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul), a defesa da Monsanto já declarou que, além do embargo, vai recorrer à segunda instância. A empresa afirma que a decisão do juiz Giovanni Conti está em desacordo com a legislação brasileira.

No STJ

Em paralelo, correm no STJ (Superior Tribunal de Justiça) ações específicas que questionam pontos processuais e técnicos sobre a matéria, que, de acordo com a relatora Nancy Andrighi, é “um dos temas de maior relevo hoje para o agronegócio brasileiro”. A rigor, dois aspectos estão sendo discutidos pelos ministros da 3ª Turma no Recurso Especial 1243386.

O primeiro diz respeito ao limite de abrangência da questão. Isto é, a sentença proferida pelo juiz gaúcho tem efeito apenas nas cidades em que têm sede os sindicatos autores? Ou, por se tratar de uma ação coletiva, a decisão afetará o país inteiro?

“O meu voto já foi no sentido de que há abrangência nacional”, afirmou a relatora Andrighi. “Outras comarcas poderiam prover decisões exatamente contrárias, gerando insegurança jurídica”, justificou.

O segundo aspecto questiona se os sindicatos têm legitimidade para ajuizar uma ação coletiva, mesmo que não esteja presente no estatuto interno cláusula que regulamente a questão.

“Basta reconhecer a finalidade do sindicato, que visa a atender as necessidades de seus filiados, para que possamos lhe outorgar a legitimidade ativa”, explicou a ministra, reconhecendo o direito.

Nas duas questões, o ministro Massami Uyeda acompanhou integralmente a relatora. Atualmente, o processo aguarda os votos dos Paulo de Tarso Sanseverino, Villas Boas Cueva e Sidnei Beneti, que havia pedido vista.

http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/55811/justica+proibe+monsanto+de+cobrar+royalties+por+venda+de+soja+transgenica.shtml

Enviada por José Carlos.

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