“Blequitude” se despede após 15 anos de publicação

Daniel Barbosa

Em 1995, Belo Horizonte abrigou a primeira edição do Festival de Arte Negra (FAN) – um evento que, por suas características e foco específico na cultura afro-descendente, se impôs com ares de ineditismo, quebrando barreiras. No ano seguinte, com o lançamento do jornal O TEMPO, veio à luz a página “Blequitude”, dentro deste caderno Magazine, criada pelo jornalista Marco Antônio Lacerda, também com o intuito de quebrar barreiras no que diz respeito à questão racial – no caso, a barreira da invisibilidade do negro na mídia. Naquele mesmo ano de 1996 nascia a revista “Raça Brasil” e, a não ser por umas poucas publicações independentes e de circulação restrita, praticamente não havia veículos de comunicação com foco nas questões relacionadas aos afro-descendentes.

Os anos se passaram, o panorama mudou e, com a edição de hoje, a página “Blequitude” deixa de ser publicada. Os assuntos relacionados, que sempre encontraram espaço aqui, seguem pautando a edição de O TEMPO, só que, agora, sem a limitação de uma página temática, com dia específico para sair. Para encerrar este ciclo, ouvimos colaboradores, parceiros e pessoas que foram notícia na “Blequitude”, para que falassem justamente dessa mudança de panorama ocorrida ao longo da última década e meia.

“Eu não diria que o preconceito racial diminuiu, mas tivemos melhoras. A gente pode citar, concretamente, a Lei 10.639 e a Lei 11.645, que tratam da questão do ensino da cultura e história afro-brasileira e indígena nas escolas. Isso é um marco desse período. As pessoas ficaram mais atentas à questão do preconceito e à valorização da identidade afro-descendente”, diz a bailarina e coreógrafa Júnia Bertolino, da Cia. Baobá. Ela destaca, ainda, a criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), no âmbito do Governo Federal.

O multiartista Maurício Tizumba também destaca, entre as mudanças ocorridas na esfera da questão racial, o surgimento e fortalecimento de órgãos oficiais, como a própria Seppir. “Temos hoje secretarias direcionadas para a população afro-descendente em nível municipal, estadual e federal”, diz, ressalvando, contudo, que ainda há muito por ser feito. “Isso tudo o que temos visto ainda é insignificante, porque a dívida com o povo negro é imensa”.

Ibrahima Gaye, diretor da Casa África e cônsul do Senegal em Belo Horizonte, concorda que houve avanços, mas aquém do esperado. “O governo Lula teve uma participação ativa no sentido da mudança, através da implementação das cotas nas universidades e da Lei 10.639, mas acho que tem muita coisa a ser feita ainda no sentido de se combater o racismo no Brasil. A população negra ainda é muito sofrida. Tem um caminho longo a ser trilhado até a inserção efetiva dos negros na sociedade”, considera.

Faltava um espaço na mídia

Ex-coordenador da Casa África e há muito ligado às manifestações da cultura afro-descendente em Minas Gerais, George Cardoso destaca a importância desse espaço na mídia. “Essa é uma reivindicação que vem desde os anos 30, a abertura de mais espaço para a discussão da questão racial. Eles sempre foram mínimos, mas a partir da Blequitude isso começou a mudar, pelo menos no âmbito local”.

Enviada por Ricardo Álvares.

http://www.otempo.com.br/otempo/noticias/?IdNoticia=196929

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