Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas ou Protesto contra a Violência?

Samia Roges Jordy Barbieri*

O dia 7 de fevereiro foi instituido pelo decreto presidencial nº11.696, de 12 de junho de 2008, do Governo Lula, como o dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas. Entretanto, temos, a bem da verdade, o desejo de fazer um MANIFESTO CONTRA A VIOLÊNCIA perpetrada diuturnamente contra os direitos humanos dos povos indígenas. Seria bonita a comemoração e a designação da data se vivêssemos em paz com os habitantes originários da nossa terra. Essa não é a realidade em que vivemos. O que vivemos no Estado do Mato Grosso do Sul é a dizimação da cultura, da língua, dos costumes, do povo, e, principalmente, a falta de demarcação das terras indígenas. O genocídio, etnocídio é alarmante, com morte de lideranças que buscam o reconhecimento do seu direito à terra, consagrado na Constituição Federal de 1988, no Estatuto do Índio, na Declaração dos Povos Indígenas da ONU ratificada por mais de 140 países, sem falar da Carta das Nações Unidas, mais conhecida como Carta de São Francisco, e uma infinidade de Tratados e Pactos
Internacionais ratificados pelo Brasil.

Poderíamos ficar horas falando o nome de mais de 250 líderes indígenas mortos, mas citamos alguns como mártires da sua luta, que foram Marçal de Souza, Marcos Verón e Nísio Gomes, que segundo inquérito, está considerado como desaparecido. A coincidência é a escolha de líderes que são mártires pela escolha do genocídio de sua etnia: a Guarani Kaiowá.

Em vez de mortes, poderíamos falar de protagonismo indígena, de autodeterminação, direito à alteridade e à diferença, educação diferenciada, conhecimentos tradicionais associados à diversidade, medicina tradicional, do etnodesenvolvimento e da etnossustentabilidade, uso e manejo do solo de forma sustentável. Seria este o nível do diálogo, mas que diálogo?

Estamos ainda no obscurantismo e na barbárie, no diálogo do mais forte, nas oligarquias capitalistas. Para esses não existe sequer DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, e o que falar do direito do outro, das minorias e dos excluídos?

A pergunta que fica é, onde está o Estado Democrático de Direito? Por que tanta omissão do Estado Nacional com os povos indígenas? Por que a guerra violenta entre fazendeiros e povos indígenas? Onde isso vai dar?

Estamos praticando o nazismo, o apartheid “social” ou vivemos na Faixa de Gaza? O que nós estamos vivendo? Onde fica o desenvolvimento? Não pode ele ocorrer em conjunto, com a identidade cultural dos habitantes originários, ou falta imaginação para o capitalismo que não conseguiu ainda tirar proveito da “era dos orgânicos” e do capitalismo “verde” tão em moda atualmente?

Tudo isso poderia existir se houvesse por parte do Estado Nacional boa vontade na definição da demarcação de terras indígenas. São apenas 0,2% de uma população em 10% de território. Esses números não podem justificar tanta violência.

De uma forma mais moderna, podemos falar na economia que poderíamos ter com o conhecimento tradicional dos povos indígenas, através da venda de produtos produzidos em terras demarcadas, com a garantia do selo “verde” de procedência de produtos utilizados com conhecimentos tradicionais, utilizando o uso e manejo do solo, de forma sustentável, sem a utilização de agrotóxicos, por exemplo. Temos mais alternativas, como a exportação do artesanato indígena, ou o recebimento de “royalties” pela utilização do saber milenar que é saqueado do Brasil através da biopirataria praticada pela indústria farmacêutica na venda de remédios. Esses são alguns exemplos possíveis para quem quer encontrar uma solução mais pacífica e menos cruel para os povos indígenas, que têm direito humano à existência, à cultura, à autodeterminação, à igualdade.

Tantas perguntas e nenhuma solução, só mortes e mais mortes, não há acordo. Nesse sentido, a criação da Comissão Permanente de Assuntos Indígenas da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Mato Grosso do Sul foi muito útil com este momento tão desalentador de violência, pois defende os direitos humanos dos povos indígenas, de forma singela mas pontual, com todos os seus laboriosos membros.

A COPAI, como é chamada vem tentando pautar a sua atuação baseada no estudo do Direito Indígena, como ramo autônomo do Direito, ramo especial do Direito Público, primando pelo contido no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, de que não existe justiça sem o advogado e mais, como advogados somos defensores da ordem jurídica, do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos, da justiça social e devemos pugnar pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas. Este é o contido nos artigos 2º e 44, respectivamente do citado ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL.

Dessa forma a COPAI atua dentro das normas legais e do seu regimento, trabalhando em conjunto com os que defendem os direitos humanos dos povos indígenas, participando do dia a dia da luta desses povos, ou no exterior, participando do FORUM da ONU sobre os Direitos dos Índios, com participação dos povos do mundo inteiro, ou ainda participando de Conselhos Municipais como o de Campo Grande, de movimentos sociais e do CONDEPI, que tem o foco de defesa dos povos indígenas, e nasceu no seio da OAB. Defendemos a cultura e a alteridade dos povos indígenas na SEMANA DO INDIO na OAB. Mesmo assim, não podemos nem pensar em comemorar o dia de luta dos povos indígenas, porque mesmo trabalhando todos os dias em prol dos direitos indígenas, não podemos ainda descansar para comemorar O DIA DE LUTA DOS POVOS INDÍGENAS, infelizmente.

Quem sabe Andre Baniwa, liderança indígena e vice-prefeito de São Gabriel da Cachoeira possa nos ensinar sobre assuntos palpitantes como: Conhecimentos tradicionais e Patrimônio Cultural, Intercâmbios entre povos e relacionamento com parceiros, Mobilização, aliança e diplomacia entre governos no 1º Encontro de Lideranças em comemoração ao DIA DE LUTA DOS POVOS INDÍGENAS, que começa neste dia 7 de fevereiro.

Dessa forma, poderemos, quem sabe, comemorar o DIA DE LUTA DOS POVOS INDÍGENAS, pensando no dia de um futuro mais justo e solidário, que respeite os direitos humanos e a dignidade dos povos indígenas. A luta continua!!!!

*SAMIA ROGES JORDY BARBIERI É PRESIDENTE DA COPAI/OAB/MS

 

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