Serra da Canastra: Não há garantia de benefício para as cidades ou previsão do tamanho da cava. Exploração de diamante ainda está no escuro

Cachoeira Casca d'Anta sai de um corte da serra a 144m de altura. FOTO: LEONARDO PALLOTTA/WIKIMEDIA COMMONS/DIVULGAÇÃO

DELFINÓPOLIS. A área do Parque Nacional da Serra da Canastra, berço da nascente do rio São Francisco, em Minas Gerais, que pode se tornar a maior mina de diamante do mundo, não tem ainda, divulgados à comunidade, estudos de impacto ambiental.

O parque deverá ter sua área reduzida de 200 mil para 120 mil hectares, conforme projeto de lei que tramita no Congresso e pode ser votado no ano que vem. O restante da área será usado em atividades econômicas e até mineração.

Apesar das propostas, não há qualquer garantia de benefício para o município de Delfinópolis, a pequena cidade turística cuja principal atração são as dezenas de cachoeiras e cursos d´água que brotam em suas terras. A cerca de dois quilômetros da futura área de exploração, há a nascente do Ribeirão do Claro, que abastece a cidade e dá origem a várias cachoeira e quedas d´águas.

A riqueza dos minérios está no solo e pertence à União. Para extraí-la, é inevitável algum tipo de estrago. No caso da Canastra 8, em Delfinópolis, não foi feito ainda o estudo sobre o tamanho da cava a ser aberta, mas pesquisas indicam que a área onde está presente o kimberlito, rocha que contém os diamantes, é equivalente a 28 campos de futebol. Na área da Canastra 1, onde já foram feitos estudos, sabe-se que o formato da cava é o de cenoura. Ou seja, a retirada do diamante não abre uma cicatriz gigantesca na terra.

Lucro certo. A extração de diamante para exportação é um grande negócio para a mineradora. Ao contrário do petróleo, ela não gera royalties expressivos. A taxa cobrada pela exploração é a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), de apenas 0,2% sobre o faturamento líquido com a venda da pedra preciosa. São pagos ainda outros 12,7% de Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), percentual inferior ao Imposto de Renda cobrado dos assalariados de renda mais alta, cuja alíquota de contribuição do IR é de 27,5%.

Antes de calcular o valor da Cfem, as empresas podem deduzir custos como despesas de transporte. Não é raro que muitas abatam uso de pás-carregadeiras e caminhões fora de estrada, além do transporte entre suas unidades de pré-processamento.

Pelo mundo. Cerca de 80% do mercado mundial de diamantes pertence à empresa De Beers, o que torna a exportação a opção mais lógica. Além disso, se fosse vendido no mercado interno, os impostos seriam mais altos. À Cfem e à alíquota de 12,7% de IR e CSLL, seria acrescido o ICMS – 18% quando a venda é feita no próprio Estado e 12% quando a venda é interestadual.

Para se ter uma base de comparação, o ouro, que vale menos do que o diamante, paga 1% de compensação financeira (Cfem). Na Austrália, o diamante é taxado em 7,5% na mina. Na China, em 4% do valor de venda. Na Indonésia, em 6,5%. Não se tem notícia de que custos operacionais na exploração da mina possam ser deduzidos no processo.

Um estudo feito pela Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados em 2007 expôs a situação não apenas do diamante, mas de todo o setor de mineração, que paga no máximo uma taxa de compensação financeira de 3%, caso do minério de alumínio e do potássio, por exemplo.

“O Brasil arrecada valores irrisórios de compensação financeira pela exploração de recursos minerais. Atualmente, o valor arrecadado no setor mineral é inferior à trigésima parte do que decorre da exploração do petróleo”, diz o estudo.

Compensação pode ser maior

Delfinópolis. Há uma discussão em curso no país para aumentar a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem) do diamante de 0,2% para 0,5%. Para o ouro, a taxa poderia subir até 3% e, no caso de outros minérios, chegaria a até 5%.
“A exportação de minérios é tratada como a de qualquer produto. O valor que a mineradora paga é muito pouco. O Brasil precisa ser inteligente e fazer uma regulamentação”, diz Hecliton Santini, presidente do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos.

Justificativa
Troca. O relator do projeto, senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), diz que as duas áreas retiradas do parque serão compensadas por outras duas de valor ambiental até maior, que incluiriam a cachoeira Casca d’Anta.

POPULAÇÃO: Moradores temem impacto socioambiental e a migração

Delfinópolis. Os moradores estão preocupados com a possibilidade de a extração de diamante causar impacto na região. “O Instituto Chico Mendes já nos apresentou com a exclusão das áreas. Como antes eles tinham dito que o Vão dos Cândidos, para ser liberado, teria de ser estudado por causa do deslocamento de animais, subentendemos que já havia estudos de impacto ambiental”, diz Rinaldo Sebastião de Almeida, presidente da Associação Representativa dos Canastreiros, que defende a regularização das áreas de produtores rurais e proprietários de terras.

O Vão dos Cândidos, pelo projeto, será transformado em monumento natural, que permite propriedade privada. Almeida diz que não viu estudo de impacto da exploração de diamante.

Oscar Ferreira Neto, da ONG Canastrazul, afirma que o mais preocupante é a forma como a mineração pode afetar as águas, uma vez que, a cerca de 2 quilômetros da Canastra 8, onde podem estar os diamantes, nasce o ribeirão do Claro, que abastece a cidade.

Para o professor José Leite Sobrinho, 83, a mineração poderá causar transformação social, pois vai atrair uma população flutuante. “Nossa tranquilidade será totalmente perturbada por causa do valor deste diamante”, diz.

Entenda. A redução da área do parque para 120 mil hectares seria votada até a última quarta-feira na Câmara dos Deputados. O relator da medida provisória 542 havia incluído a emenda, mas acabou retirando. O assunto voltará a ser discutido no Senado, em projeto de lei em andamento.

NASCENTES: Águas escorrem pelas rochas

DELFINÓPOLIS. No município de Delfinópolis, a quantidade de cachoeiras surpreende e dali é possível avistar a imponência da serra da Canastra, reduto de patos-mergulhões, lobos-guará e de uma diversidade de flores, plantas e cursos d´água.

A serra abriga a nascente do rio São Francisco e dezenas de outras, mas a água não brota do chão. É a umidade trazida pelos ventos da Amazônia, no encontro com as rochas, que produz o fenômeno do berçário de águas. Elas escorrem pelas rochas.

Poderia ser um paraíso, mas não tem sido assim. A beleza natural e a riqueza não encontraram um ponto de equilíbrio que dê, a seus cerca de 7.000 moradores, a tranquilidade que o cenário aparenta.

Desde a década de 70, quando o parque foi criado, moradores lutam para permanecer no local e ter direitos de propriedade garantidos. Para sair e entrar em Delfinópolis, o principal acesso é por balsa, cuja espera é de quatro horas nos fins de semana. Uma barragem no rio Grande deu origem à represa Mascarenhas de Morais, que praticamente isolou a cidade.

Ninguém nunca viu. Na serra da Canastra, basta pisar no chão e olhar para as pedras e rochas para saber que elas valem dinheiro. Os moradores sabem há muito tempo que ali tem diamante. Mas quem vive em Delfinópolis diz que as caixas só saíam do local fechadas. Um diamante, ninguém nunca viu. Na região funcionam ainda mineradoras de quartzo e quartzito.

ARRECADAÇÃO: Prefeito quer o aumento da receita

Delfinópolis. O prefeito de Delfinópolis, José Martins, afirma que o município ficará com 65% de uma alíquota de 3% da receita bruta com a exploração de diamante. A avaliação dele é que, se existe minério, o melhor é explorar.

“A partir do momento em que existe minério, que existe petróleo, que existe receita para o município, é melhor para a população. Hoje ficamos submissos ao Estado e ao governo federal, ficamos de pires na mão pedindo migalhas para o município, que tem obrigação de cuidar da saúde, da educação, de estrada, assistência social e até de segurança pública”, diz.

Martins afirma que não viu estudo do impacto ambiental a ser causado pela exploração.

Informalmente, acrescenta, os envolvidos na aprovação do projeto de redução do parque, com exclusão de duas áreas, dizem que não será necessário abrir uma grande cava, apenas um pequeno buraco na superfície.

http://www.otempo.com.br/otempo/noticias/?IdNoticia=189025,OTE&IdCanal=5. Enviada por Ricardo Álvares.

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