Livro levanta poeira racista na Alemanha

Livro levanta poeira racista na Alemanha
Banqueiro conhecido por posições racistas, Thilo Sarrazin publicou livro atacando judeus, bascos e muçulmanos (Foto: Eigenes Werk/wikipedia)
Por: Flavio Aguiar

Na Europa é moda conservadora ser “cautelosamente” antimuçulmano.

Thilo Sarrazin tem 65 anos, e fez uma carreira burocrática que pode ser chamada de exemplar. Descendente de franceses (daí o nome, Sarrazin, parecido com Sarrasin, “Sarraceno”), Thilo foi alto funcionário da Deutsche Bahn (Empresa Ferroviária), foi Ministro das Finanças (nós diríamos Secretário) da Câmara (aqui Senado) de Berlim, trabalhou para o governo federal, e faz pouco tempo foi indicado para o Conselho Diretor do Bundesbank, Banco da República, o Banco Central alemão. Além disso, há tempos é filiado ao SPD, o Partido Social Democrata alemão, que é descrito na mídia convencional como de “centro-esquerda”.

Faz tempo que Sarrazin é uma figura conhecida por suas declarações bombásticas e conservadoras. Já disse, por exemplo, que um dos “desafios” de Berlim são os membros da “geração de 68”, assim como o “desleixo” dos berlinenses quanto à vestimenta e a aparência.

Entretanto, tornou-se mais conhecido por suas declarações contra a imigração estrangeira, particularmente a dos muçulmanos, e em especial, a dos turcos – e seus descendentes. Freqüentemente acusou-os de “resistirem à integração” e de, por isso, resistirem também à educação. Criticou-os também por não terem iniciativa, por serem importantes economicamente apenas no “setor de frutas e verduras”, de não contribuírem com “mais-valia” (sic) para o Estados alemão, de passarem tempo demais recebendo seguro-desemprego, etc.

Esse comportamento já lhe valeu problemas. Teve de abdicar da pretensão de ser vice-presidente do Banco, teve seu gabinete invadido por estudantes. Tornou-se, enfim, uma figura polêmica, conhecida e reconhecida por opiniões bizarras.

Agora, porém, Sarrazin atravessou o Rubicão, provocando uma chusma de críticas e declarações veladas de apoio, mesmo que parcial, às visões que levanta.

Sarrazin acaba de lançar um livro – Deutschland schafft sich ab – A Alemanha se autodestroi – onde avança teses (que lembram as versões mais conservadoras do malthusianismo sobre a proliferação dos mais pobres) segundo as quais a Alemanha está submergindo diante das altas taxas de natalidade dos imigrantes muçulmanos – novamente os turcos em particular.

Para ele também a mixagem entre essas populações “recém-chegadas” e os “autóctones” está produzindo um crescente “emburrecimento” do país, pelo pouco interesse e fraco desempenho dos imigrantes e seus descendentes em termos escolares.

(Penso que os que se lembrarem do filme “O leitor” – e do romance, que é mais interessante – e  da dificuldade da protagonista em reconhecer seu analfabetismo, terão uma medida da delicadeza do tema nas terras de Goethe, Hegel, Schiller, Thomas Mann etc.)

Até aí poderíamos estar vendo o caso de uma personalidade polêmica, um tanto atraída pela fama, a controvérsia, e a “proteção das classes superiores e dos valores tradicionais”. Como ser antimuçulmano está na moda entre os conservadores na Europa e no mundo, teríamos aí o caso de um autor em busca de polêmica promoção para seu livro, mobilizando temas e opiniòes algo odiosas, é verdade.

Porém, não satisfeito com isso, Sarrazin abriu a metralhadora giratória, e atirou em todas as direções. Em entrevista no fim de semana, confrontado com perguntas sobre um possível teor racista de suas opiniões, ele negou a acusação, dizendo que ele tratava de assuntos “culturais”, e emendou que isso de raças era um assunto, afinal, genético. “Todos os judeus”, disse ele, “têm um gene comum, assim como os bascos”.

Aí o caldeirão ferveu, porque ele pôs o dedo – e fundo – na ferida que paira sobre e sob toda a história da sociedade alemã.

As reações foram imediatas. Embora na maioria dos casos elas esquecessem “os bascos”, e citassem apenas “os judeus”, apontaram que ele estava levantando teses racistas negadas pela ciência. O Conselho Judaico Alemão e o Muçulmano se uniram no repúdio ao livro. O SPD, que já tentara se livrar do polêmico personagem no passado, reabriu o processo de expulsão contra ele – o que na Alemanha é complicado e pode até depender de uma decisão judicial. Até a Chanceler Ângela Merkel veio a público dizer que as declarações de Sarrazin eram inaceitáveis, e que ele deveria deixar o Banco Central ou ser demitido do Conselho.

Entretanto, houve reações mais contemporizadoras, sobretudo na mídia conservadora, dizendo que o tom era equivocado, as teses genéticas também, mas que o controvertido autor levantava problemas “reais”. Ou seja, que há mesmo o temor que a “vaga muçulmana” transforme a Alemanha numa Atlântida moderna.

Pior: em todas as frentes acenderam-se luzes de preocupação com a possibilidade do livro tornar-se um best-seller. Isso, 65 anos depois de Mein Kampf – Minha Luta – de Adolf Hitler, ser proibido na Alemanha, com o fim da Segunda Guerra Mundial.

Não se sabe ainda o que vai acontecer. Estava prometida uma leitura pública (coisa muito do gosto local), junto com o lançamento do livro, que não se realizou, “por razões de segurança”, uma vez houve protestos em frente à livraria. O Banco Central convocou o autor para esclarecimentos junto a uma reunião especial do Conselho Diretor, e reconheceu que as suas declarações “feriam a reputação do Banco”. O SPD – preocupado com a hipótese de perder apoio entre os imigrantes e seus descendentes – vai levar a ferro e fogo a proposta de expulsão. A Chanceler, premida pela impopularidade de seu governo e em busca de apoios e teses populares, certamente vai aumentar a pressão, nos bastidores e fora deles para que Sarrazin seja dispensado do Banco Central.

Mas e se o livro e seu autor se tornarem também populares? Afinal, ele mobiliza preconceitos que, como disse antes, estão na moda, e sem o ranço das manifestações neo-nazis. Para muitos ele parece ser “apenas” um funcionário de carreira meticulosa e cheia de zelos pelo seu país, com idéias ousadas e “algo extravagantes”, mas não destituídas completamente de “alguma razão”.

Mais ou menos como os funcionários que no passado, também zelosamente, trabalharam para e com os nazis.
PS – Esse tema da “inundação muçulmana” não é privilégio da Alemanha. Ele atravessa toda a Europa, os Estados Unidos e até a América Latina, inclusive o Brasil, onde já pululam clipes nos youtubes da vida anunciando o “fim da civilização cristã ocidental”.

http://www.redebrasilatual.com.br/multimidia/blogs/blog-do-velho-mundo/livro-levanta-poeira-racista-na-alemanha

Comments (1)

  1. —> As mais variadas ocorrências… não são uma surpresa… porque, hoje em dia, a Europa é dominada por uma ‘Política à Hitler’:
    1-> Uma desesperada ‘Fuga para a Frente’… para a implosão!…
    {nota: só os Parvos-à-Sérvia é que acreditam que os futuros/novos dominadores demográficos da região… irão preservar a antiga Identidade}
    2-> Teorias (vulgo intolerância) para negar o Direito à Sobrevivência de outros!…

    ANEXO:
    SEPARATISMO-50 NA EUROPA
    —> Sim, quem quiser ficar à mercê do pessoal (africanos, islâmicos, etc) que anda numa corrida demográfica pelo controlo de novos territórios… QUE FAÇA BOM PROVEITO: tchau!….; todavia, pelo legítimo Direito à diferença:
    TODOS DIFERENTES!!! TODOS IGUAIS!!!
    — Isto é, TODOS os Povos Autóctones do Planeta Terra:
    -> Inclusive os de ‘baixo rendimento demográfico’ (reprodutivo)!…
    -> Inclusive os economicamente pouco rentáveis!…
    devem possuir o Direito de ter o SEU espaço no Planeta!!!

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