Nota da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (AM) elaborada no último dia 19 mas divulgada ontem (23) para a sociedade. A nota faz duras críticas à política indigenista do atual governo federal e reitera a precária e crítica situação de saúde e educação na TI Vale do Javari. Eis:
“A Coordenação Geral da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari – UNIVAJA, organização indígena representativa dos povos Marubo, Mayuruna, Matis, Kanamari e Kulina, vem a público externar o apoio às mobilizações relacionadas à Programação do Abril indígena/2013 que vem ocorrendo na capital do País. Consideramos as mobilizações realizadas no Congresso Nacional e no Palácio do Planalto a expressão de todos os povos indígenas do Brasil, que vêm sendo rechaçados continuamente em suas lutas pela sobrevivência, pelo reconhecimento, pela oportunidade de discutirem e serem ouvidos nos temas que lhes dizem respeito, pela opção de viverem no interior de suas terras conforme seus usos e costumes e, sobretudo, de fazerem com que seus direitos constitucionais sejam respeitados.
É evidente que nos últimos anos, e mais precisamente no Governo da Presidente Dilma Rousseff, os povos indígenas têm presenciado um retrocesso de suas conquistas de décadas, que consolidaram os artigos 231 e 232 na Constituição Federal do Brasil. Há uma mobilização, tanto dos setores econômicos e políticos quanto do próprio Executivo Federal, com o objetivo de aniquilar esses direitos no mais completo desrespeito a carta magna do país, em nome de um desenvolvimento econômico condicionado à exclusão das minorias, à destruição do meio ambiente, à imposição de suas vontades por meio militarista e à eliminação da plurietnicidade.
O País vive um período pelo qual seu Congresso é dominado por ruralistas e evangélicos e que juntos têm direcionado seus interesses escusos e opressores sobre uma pequena parte da sociedade brasileira. Hoje não somos nem 1 milhão de índios no Brasil, quando estudos citam que já fomos quase 6 milhões. Fazemos parte deste País, portanto, integrantes legítimos dessa mesma sociedade. O que queremos é simplesmente viver harmoniosamente num país que se diz pluriétnico, que se diz almejar ser uma potência mundial, que se diz se indignar com as atrocidades cometidas por déspotas mundo a fora, que se diz ser um dos respeitadores dos direitos humanos e protetor de suas florestas.
A atual política de governo nos lembra as atrocidades do período da ditadura militar, que para implementar seus projetos megalomaníacos como a transamazônica tiveram de exterminar índios usando a estrutura das forças armadas contra as minorias, como foi o caso do genocídio cometidos pelo Exército Brasileiro contra o povo Waimiri-Atroari. E, coincidentemente, nos deparamos com a regulamentação e o uso, mais uma vez, das forças armadas contra os povos indígenas, tendo como caso mais evidente dessa postura a Operação Militar na região povo Munduruku no rio Tapajós. Há o silêncio do Executivo Federal e a clara conivência na criação de novos mecanismos legais, que a cada dia são pensados e arquitetados nos bastidores do atual Governo e do Congresso Nacional, como: a Portaria 303 da AGU, PEC 215, PEC 2037, Decreto 7.957 e a Portaria Interministerial 419/11.
O que mais nos surpreende é que se trata de um Governo legitimamente eleito pela grande parte dessas minorias, com um apoio maciço dos povos indígenas, e proveniente de um partido que na década de 80 tinha como bandeira as causas sociais. A própria Presidente do nosso país já sentiu na pele o poder repressor a todo custo, e hoje usa os mesmos métodos contra aqueles que querem ver seus direitos cumpridos.
O sucateamento intencional e sistemático da FUNAI, e o seu enfraquecimento como instituição, demonstra o desprestígio desse órgão por parte do atual governo, bem como a ausência de uma política indigenista de Estado que garanta a proteção dos diretos indígenas no país. Das 3.000 mil vagas disponibilizadas pelo Governo Federal para compor o quadro de pessoal dessa instituição, pouco mais de 600 foram ocupadas, sendo que nos próximos anos a grande parte do seu quadro de funcionários devem se aposentar o que indica a clara intensão de extingui-lo. Dessa forma o Governo Federal não garante o cumprimento das leis indigenistas e a tendência é que estes fiquem a mercê de prefeitos e governadores antiindígenas, que preferem fazer suas próprias leis, geralmente como as que vêm sendo aplicadas em regiões como o sul da Bahia e o Mato Grosso do Sul, onde jagunços a mando de políticos e oligarcas caçam índios e usurpam as terras tradicionais desses.
A Política de Saúde Indígena continua sendo tratada de forma displicente e ineficaz, mesmo depois da criação da SESAI, que ainda não conseguiu deslanchar, apesar dos vultosos investimentos oficializados pelo Governo Federal. A autonomia do DSEIS continua sendo uma utopia, o que contribui com os atuais protestos Brasil a fora sobre uma atuação medíocre.
A Educação Indígena é uma Política de Governo relegada ao esquecimento, o que torna ainda mais os povos indígenas excluídos da opção de poderem se capacitar frente às exigências do mundo moderno. As escolas indígenas continuam sendo “miragens” nas aldeias, contribuindo para o aumento do êxodo de centenas de jovens para as cidades; gerando assim, problemas sociais nos municípios vizinho às Terras Indígenas.
Atalaia do Norte- 19 de abril de 2013
Jader Comapa Franco
Coordenador Executivo do UNIVAJA”
–
Enviada por Elaíze Farias para Combate Racismo Ambiental.