Por José Coutinho Júnior, da Página do MST
Jeff Williams é diretor da entidade Christian Aid no País de Gales e amigo do MST há 20 anos. Visitou assentamentos e acampamentos do MST em três viagens ao Brasil.
Em 1992, foi ao acampamento de Cascavel, no Paraná. Em 2000, acompanhou o MST na Bahia, onde produziu um vídeo sobre a história dos Sem Terra, para denunciar para a população de Gales os conflitos no campo brasileiro.
Neste ano, fez uma visita um assentamento modelo do MST em Parana City, na região norte do Paraná, que construiu a Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória (Copavi).
Para ele, o MST tem cumprido o papel na sociedade brasileira de lutar por uma sociedade com igualdade.
Confira a entrevista que Jeff concedeu à página do MST.
Você é amigo do MST há 20 anos. O que mudou no Movimento durante esses anos?
É difícil para mim dizer o que mudou, porque eu me encontrei cara a cara com o MST apenas três vezes nestes vinte anos: Uma em 1992 ao acampamento de Cascavel; a segunda em 2000 na Bahia e agora em 2012 visitei a Copavi. Acompanho o movimento de longe e, vendo quantas pessoas já foram assentadas, é impressionante.
A experiência mais forte que tive com o MST foi, neste ano, ao reencontrar duas pessoas que havia conhecido no acampamento de Cascavel, onde acompanhei por uma semana a luta, que era muito difícil para as pessoas que lá moravam. Era muito frio, chovia bastante, havia lama em todo canto, sem contar as ameaças dos pistoleiros. Reencontrar essas pessoas fazendo parte da Copavi e ver a cooperativa prosperar, com a terra fértil, produzindo e vendendo para a comunidade ao seu redor, me faz pensar que a jornada de Cascavel até a organização da cooperativa deve ter envolvido muita dedicação e trabalho duro das pessoas. Eu sou apenas um amigo distante que veio visitar, mas ver essa jornada de 20 anos, da luta e dor até a comunidade assentada, na qual as pessoas plantam, comem e vivem em paz, é incrível.
Na sua opinião, qual a importância de um movimento como o MST para o Brasil?
Existe algo de profético no trabalho do MST. O movimento questiona as “normas” que as pessoas consideram naturais. Eu vou ao trabalho, dirijo meu carro na hora de voltar para casa… Posso fechar a porta, trancar a casa e esquecer sobre o mundo. O trabalho do MST questiona essa “comodidade”. Os profetas na bíblia são sempre as pessoas que apontam para o que está errado, assim as pessoas não podem dizer “não sabíamos sobre isso. Não sabíamos que existiam pessoas pobres ou sem-terra”. O MST faz o que faz e nós, como amigos, contamos a história do movimento em nossos países. Assim as pessoas não podem ignorá-lo.
Para você, o que torna o movimento tão popular?
O que me impressiona no MST é o seu tamanho. É inimaginável para alguém de um país tão pequeno quanto Gales pensar em como o Movimento consegue unir pessoas por todo o país e inspirá-las com uma causa em comum. As pessoas que encontrei nas visitas ao Movimento, especialmente desta vez, me fizeram perceber como elas se dedicam ao MST, contribuindo de diversas formas. Pessoas que dedicam praticamente sua vida inteira à luta, apesar de já terem conseguido terra e dignidade no Movimento, para que outros possam dividir do que eles tem. Além disso, devem existir gênios da organização no MST. Movimentos sociais estão cheios de idealistas, que acham que o Movimento deve ir por este ou aquele caminho. Manter o foco do Movimento é uma conquista. Além disso, é interessante ver a forma como o MST cria novas formas de comunicação. A Copavi me surpreendeu, pois vende seu leite para a população do Paraná.
Qual a importância de entidades e pessoas religiosas se engajarem na luta popular?
Em Cascavel, um dos principais apoiadores do MST era um padre da igreja local, que visitava e ficava no acampamento. Eu não entendo como um cristão pode ler a bíblia – a história de Jesus, dos profetas, o velho testamento – e não se engajar na luta pela vida, contra a desigualdade. Não consigo explicar a dicotomia da igreja, mas está claro para mim que o propósito de Deus é que todos vivam ao máximo. E por “viver ao máximo”, eu quero dizer ser livre, viver com dignidade, ter seus direitos protegidos, suas necessidades atendidas. É isso que Deus quer dar. E se os movimentos populares lutam pelas conquistas desses direitos e valores, a Igreja e pessoas devem apoiá-los. É uma tristeza que as instituições mais opressivas em qualquer país sejam apoiadas por instituições religiosas – e nisso incluo todas as religiões. Mas eu acredito que a oposição mais forte que se pode ter contra essa opressão é se você está disposto a construir um mundo a favor de uma vida digna para todos, independente de suas crenças. Se você estiver, vamos trabalhar juntos.
http://www.mst.org.br/node/13291