AM – Manifesto exige punição de militares pelas mortes de mais de dois mil indígenas durante a ditadura

No mínimo curiosa a total omissão quanto à participação, à mesa, da liderança indígena Ivanildo Tenharim (de camisa vermelha, inclusive, entre Alfredo Wagner e Júlio Araújo). Sequer seu nome foi mencionado na matéria, embora ele tenha inclusive feito um importante pronunciamento (ver AQUI). Pelo visto, as coisas mudam, mas nem tanto. A invisibilidade, pelo menos, continua… (Tania Pacheco)

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Debate realizado na Ufam discutiu as consequências do autoritarismo promovido durante a ditadura militar na Amazônia (Lucas Silva )

Representantes de organizações da sociedade civil, dos Ministérios Públicos Federal (MPF-AM) e do Trabalho (MPT-AM), do Comitê do Direito à Verdade, Memória e Justiça do Amazonas, lideranças indígenas e partidos políticos exigem a responsabilização dos homicídios cometidos pelos militares contra mais de 2 mil índios na Amazônia durante o Golpe Militar de 1964.

Janaína Andrade, A Crítica

No debate “Amazônia contra o autoritarismo: 50 anos depois”, realizado nesta sexta-feira (28) no auditório da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), os representantes das entidades assinaram um manifesto contra o autoritarismo instalado pela ditadura militar. A responsabilização dos mandantes e executores dos crimes cometidos contra os indígenas é um dos cinco itens exigidos pelo manifesto.

Os outros itens são o imediato cumprimento da decisão da Corte Interamericana de Diretos Humanos (CIDH) no caso Araguaia e reinterpretação da Lei da Anistia; a localização e identificação dos corpos dos desaparecidos políticos e esclarecimento das circunstâncias e dos responsáveis por suas mortes; a identificação e punição dos torturadores, estupradores, assassinos, mandantes, financiadores e daqueles que ocultaram cadáveres; e a desmilitarização das polícias e rompimento do ciclo de violência perpetuado pelas corporações.

Herança

O coordenador de pesquisa do comitê estadual, o missionário Egydio Schwade, destacou como exemplo do “patrimônio eternizado” da ditadura, a grilagem de terras. “Muitos empresários e entidades financiaram diretamente as Forças Armadas e ainda hoje estão na elite econômica, e em troca obtiveram a grilagem de terras que vem deixando marcas destrutivas na Amazônia”, disse Schwade.

O manifesto “Autoritarismo nunca mais: Golpe Militar 50 anos depois” será encaminhada no dia 31 de março para a Comissão Nacional da Verdade.

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Procurador Júlio Araújo lembra que papel do MPF é garantir direitos dos povos da floresta

Impunidade

“Muito pouco se discute, como se não tivesse existido ditadura militar na Amazônia”, disse o procurador da República, Júlio Araujo Junior, durante o debate “Amazônia contra o autoritarismo: 50 anos depois”. Ele ressaltou que o papel do Ministério Público Federal (MPF-AM) é garantir os direitos dos povos e comunidades tradicionais, como índios, quilombolas, comunidades extrativistas e ribeirinhas.

“O que nós discutimos aqui tem muito de atual, mesmo pouco se falando de ditadura na Amazônia, como se ela não tivesse existido por aqui. Mas as violações, as motivações e os desafios enfrentados pelo MPF são reais, pois as violações praticadas na ditadura perduraram no tempo com impactos e consequências”, afirmou Júlio.

Para o procurador do MPF, os militares sempre enxergaram a Amazônia como um lugar estratégico, um projeto de soberania nacional e de integração.

“E estudando um pouco a situação da Transamazônica, projetada durante o governo do presidente Emílio Garrastazu Médici, sendo uma das chamadas “obras faraônicas” devido às suas proporções gigantescas, realizadas pelo regime militar, podemos verificar o discurso utilizado por eles, como se a região fosse uma terra sem homens, e que esses povos não eram contemplados e que não havia nenhuma perspectiva de dialogar com eles, e neste momento começam a violação de alguns direitos adquiridos pelos indígenas, como o uso da terra”, lembrou.

“O grande objetivo do nosso encontro é, além de lembrar os 50 anos do Golpe Militar e resistir para que essas violações dos direitos humanos nunca mais aconteçam, também ouvir as comunidades tradicionais da Amazônia, estudantes, pesquisadores, professores, para que possamos discutir os direitos dos cidadãos que, ainda hoje, em pleno período democrático, são desrespeitados como herança do autoritarismo da ditadura militar na Amazônia”, disse.

Para o Procurador do Trabalho, Renan Bernardi Kalil, lembrar da ditadura militar não é sinônimo de não esquecer o que houve nos “anos de chumbo”, e sim de avançar em ações de garantam a execução plena dos direitos do povo. “É importante não voltarmos a passar nem perto de uma situação como a ditadura militar, e não podemos esquecer ou deixar de homenagear a proeminência das ações dos movimentos sindicais na luta pela garantia dos direitos trabalhistas e que influenciaram na redemocratização do país”, destacou Kalil.

O antropólogo e professor da Ufam Alfredo Wagner lembrou que “ano que vem estaremos no 30° ano de uma experiência democrática”. “Isso nos obriga a repensar essa estrutura autoritária que às vezes tem uma continuidade na sociedade brasileira. E essa estrutura não esta só no período ditatorial militar. Está bem presente no período que vivemos, dito como democrático”, falou Wagner.

Mais de 70 mil pessoas foram presas e perseguidas durante a ditadura militar. No encontro de ontem, de forma coletiva, foram lembrados, em especial, os indígenas assassinados pela ditadura, em memória e homenagem às vidas e lutas destes.

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