‘Tenho medo de morrer’, diz menina de 11 anos apedrejada na cabeça após festa de Candomblé

Ana Carolina Torres, Extra

Ainda muito assustada, falando baixo e com a voz por vezes tremida, a menina de 11 anos vítima de uma pedrada na cabeça após deixar uma festa de Candomblé, no domingo, conversou com o EXTRA nesta terça. Insultada por gritos de “macumbeira” e de que deveria “queimar no inferno” quando ia para um ponto de ônibus na Vila da Penha, na Zona Norte do Rio, com as roupas típicas de sua religião – como pano de cabeça e saia de ração branca -, ela disse que a partir de agora quer esconder de todos a fé que abraçou por medo de sofrer novas represálias:

– Continuo na religião, nunca vou deixá-la. É a minha fé. Mas não saio de mais de branco. Nem no portão eu vou. Estou muito, muito assustada. Tenho medo de morrer. Muito, muito medo.

A garota lembrou o momento em que sofreu a agressão.

– Só me recordo de ter colocado a mão na cabeça, sentir o sangue e logo depois vê-lo pingando no chão. Foi uma coisa do nada. Nem vi direito de onde veio. Mas eu poderia ter sofrido algo grave. Atingiu minha cabeça. Mas e se fosse meu olho? – perguntou ela.

A avó da garota, Kátia Marinho, de 53 anos, estava com ela no momento da pedrada e disse que desde então a neta está se mantendo muito reservada. Tanto que nesta quarta ela começará a fazer um acompanhamento psicológico numa ONG.

– Ela também vai fazer exame de corpo de delito (no Instituto Médico-Legal). Espero que a gente, com muita conversa e muito cuidado, consiga fazer com que ela fique mais tranquila. Vamos respeitar o momento dela, é claro – contou a avó.

A garota frequenta rituais de Camdonblé desde muito pequena Foto: Guilherme Pinto / Extra
A garota frequenta rituais de Camdonblé desde muito pequena Foto: Guilherme Pinto / Extra

Segundo ela, a neta, desde muito cedo frequenta os rituais do Candomblé:

– Ela foi criada na religião. Já frequentou a escola, que é municipal, com as roupas usadas nos rituais. Nunca sofreu preconceito algum! E agora acontece isso. Fico assustada com esse mundo em que estamos vivendo. É homofobia, preconceito contra negros, contra religião… Como é que a gente vai continuar vivendo assim?

Kátia contou ainda que há 25 anos mantém o barracão onde aconteceu a festa, na Vila da Penha, e nunca teve problemas com a vizinhança:

– Todo mundo bate à nossa porta, é bem atendido. Já soube de outros barracões que foram depredados, mas com a gente isso nunca aconteceu.

A agressão ocorreu na Avenida Meriti. Segundo testemunhas, pessoas que estavam num ponto de ônibus começaram a xingar os candomblecistas. Pelo menos dois deles foram descritos como jovens morenos, na casa dos 20 anos. Depois do ataque, fugiram de ônibus.

Por meio de nota da assessoria de imprensa da Polícia Civil, a 38ª DP (Irajá), onde o caso foi registrado, informou que tanto parentes quanto a menina prestaram depoimento. O informe diz ainda que “os agentes irão realizar diligências para localizar imagens e testemunhas que possam auxiliar na identificação da autoria do crime. O caso foi registrado como lesão corporal e no artigo 20, da Lei 7716 (“praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional)”.

Imagem: A menina, com o curativo na cabeça – Foto: Guilherme Pinto / Extra

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