Elaíze Farias, de Novo Airão (AM) – Amazônia Real
À margem esquerda do rio Jaú, afluente do rio Negro, no Amazonas, uma faixa de terra delimitada em 719,8 mil hectares, que fica dentro do Parque Nacional do Jaú, é disputada há sete anos por famílias remanescentes de quilombos e o Ministério do Meio Ambiente.
Na faixa de terra está situada a tradicional Comunidade Quilombola do Tambor, local onde os casais Leopoldina e Jacinto de Almeida, Otília Maurícia e José Maria dos Santos e Severina Nascimento e Isídio Caetano, remanescentes de quilombos do Nordeste brasileiro, migraram entre os anos de 1907 a 1910. No Jaú, eles se estabeleceram na região do igarapé Paunini, área que nos anos seguintes passou a ser conhecida como “rio dos pretos”.
A disputa no âmbito administrativo federal pela regularização fundiária do território tradicional entre os moradores da Comunidade Quilombola do Tambor e o Ministério do Meio Ambiente acontece desde 2006, quando a área foi reconhecida como de remanescentes de quilombolas pela Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultural.
O Ministério do Meio Ambiente, por meio do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), contestou a regularização fundiária da comunidade, procedimento que veio logo após a certificação como quilombola e executado pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). O MMA alega que o Parque Nacional do Jaú (PNJ) é uma unidade de proteção integral da fauna e da floresta, que exclui ocupação de populações humanas.
O Parque Nacional do Jaú foi criado pelo Decreto n.° 85.200, de 24 de setembro de 1980, em uma área de 2.272 milhões de hectares, como parte de uma política ambiental conservacionista. Segundo pesquisadores, a criação do parque provocou a saída compulsória de centenas de famílias ribeirinhas que viviam à margem do rio Jaú. As famílias foram obrigadas a recomeçar a vida nas periferias de zonas urbanas do Amazonas. Apenas um pequeno grupo, incluindo as famílias quilombolas, resistiu no Parque.
Em março de 2014, o governo federal, por meio da Câmara de Conciliação da Advocacia Geral da União (AGU), determinou a remoção dos moradores, sem consultá-los.
A decisão está sendo questionada pelo Ministério Público Federal do Amazonas, que entrou na justiça contra a remoção das famílias do Tambor e exige a titulação territorial da comunidade por parte do Incra.
No Amazonas, são sete comunidades reconhecidas como quilombolas, incluindo o Tambor, no município de Novo Airão (a 180 quilômetros de Manaus). Cinco estão no município de Barreirinha (a 331 quilômetro de Manaus). São elas: Boa Fé, Ituquara, São Pedro, Tereza do Matupiri e Trindade, reconhecidas em outubro de 2013. A mais recente é a comunidade do Barranco, em Manaus. Barranco foi certificada pela Fundação Cultural Palmares no final de setembro deste ano.
Entre os dias 13 e 17 de outubro, a reportagem da agência Amazônia Real viajou durante 24 horas de barco, pelos rios Negro e Jaú, da cidade de Novo Airão à Comunidade Quilombola do Tambor para relatar a história de resistência, os conflitos e incertezas da sobrevivência dos remanescentes dos quilombos no Parque Nacional do Jaú.