Da Página do MST*
Sob forte pressão do Ministério da Agricultura e de setores ligados ao agronegócio, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a liberação de 19 novos agrotóxicos e produtos equivalentes para serem aplicados já no primeiro bimestre deste ano.
Há pelo menos dois anos que o setor reclama de uma suposta morosidade nos processos de liberação desses produtos por parte da Anvisa.
Para aplacar essa insatisfação, o governo já havia autorizado o Ministério da Agricultura, por meio da Medida Provisória 619/2013, a dar o sinal verde, em caráter emergencial, para importação, produção, distribuição, comercialização e uso de agrotóxicos ainda não registrados no país.
A medida teve como objetivo permitir a utilização de defensivos à base de benzoato de emamectina, voltados ao controle da lagarta Helicoverpa armigera, que ataca lavouras de grãos e algodão.
Recentemente, o Conselho Diretor da Fiocruz soltou uma carta aberta à sociedade brasileira criticando veementemente medidas como essa, alertando para os riscos causados pelas modificações na legislação que regula o uso de agrotóxicos no país.
De acordo com a carta, o “processo em curso de desregulação sobre os agrotóxicos que atinge especialmente o setor saúde e ambiental no Brasil, está associado aos constantes ataques diretos do segmento do agronegócio às instituições e seus pesquisadores que atuam em cumprimento as suas atribuições de proteção à saúde e ao meio ambiente.”
Desde o ano passado, há um forte movimento que defendia o esvaziamento da Anvisa e a criação de uma nova agência voltada apenas a avaliações de agrotóxicos.
A intenção era criar a Comissão Técnica Nacional de Agrotóxicos (CTNAgro), subordinada a Casa Civil, mas com 13 membros de setores da sociedade civil e do governo federal.
Especialistas na área denunciavam que essa medida serviria apenas para criar uma comissão de fachada, como ocorre com a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), responsável em aprovar novos transgênicos.
Em entrevista a IHU On-Line na época, Fernando Carneiro, do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB), já se demonstrava temeroso com a proposta de a CTNAGRO ser inspirada na CTNBio, porque desde a sua criação ela “aprovou 100% dos pedidos de liberação de transgênicos”.
Para ele, a criação da CTNAGRO está relacionada com a divulgação de relatórios da ANVISA, os quais demonstram que 36% das frutas, verduras e legumes produzidos no Brasil estão contaminados e são impróprios para o consumo.
“Gostaria de destacar que esse esvaziamento parcial da ANVISA está muito relacionado a esses dados, os quais passam a ser discutidos no país. Esse é um dos poucos resultados de monitoramento público dos impactos dos agrotóxicos, e esse trabalho está ameaçado por essa nova reconfiguração do registro de agrotóxico do Brasil e de qual será o papel dos órgãos a partir da reconfiguração. O relatório da ANVISA é apenas uma parte do que deveria estar sendo monitorado, contabilizado. Mas o que se vê é o movimento contrário, de tirar o papel do Estado destas questões”, ressalta.
Mais agrotóxicos
Independentemente das posições contrárias a essas liberações, novas aprovações continuam a sair.
Na última quinta-feira (14), o Ministério da Agricultura publicou uma portaria (188/2014) que estabeleceu emergência fitossanitária em Minas Gerais, devido ao “baixo” nível de capacidade no combate à broca do café, e amanhã o ministro Antônio Andrade deve anunciar, em evento no Estado, a aprovação emergencial do ciantraniliprole, da DuPont, para combater o inseto. A decisão veio depois de a Anvisa proibir no país, no segundo semestre de 2013, a comercialização do endossulfam, até então o principal produto contra a praga.
Na esteira das autorizações emergenciais, o Ministério da Agricultura também está prestes a liberar o benzovindiflupir, da Syngenta, recomendado para combater a ferrugem asiática da soja. O produto está entre os que foram aprovados neste ano pela Anvisa. O Ministério da Agricultura está avaliando os últimos detalhes para publicar a bula do produto.
Somando-se as liberações emergenciais e as regulares, o Brasil, que já é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, caminha para registrar vendas de 1 milhão de toneladas desses produtos em 2014.
No ano passado, as vendas geraram faturamento superior a US$ 10 bilhões, 8% mais que em 2012 – quando o volume chegou a 823 mil toneladas. Um dossiê feito em 2012 pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) mostrou que, dos 50 produtos mais utilizados nas lavouras brasileiras, 22 são proibidos na União Europeia.
Nessa conta, estão declarados apenas os produtos comercializados de maneira legal. Além deles, ainda existe um mercado informal no Brasil. Segundo dados do Sindiveg, até 2010 os produtos falsificados representavam 5% das apreensões e os contrabandeados, 95%. Em 2013, o percentual de falsificados cresceu para 50%.
Mesmo com a perspectiva de consumo recorde de agrotóxicos no Brasil em 2014, o lobby para a aprovação de mais produtos continua firme e forte. Na quarta-feira passada, deputados da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) se reuniram com o ministro da Agricultura, Antônio Andrade, para pedir agilidade no registro de novos defensivos genéricos para a agricultura.
*Com informações do Valor Econômico